Economia brasileira está como a de um país em guerra civil', diz professor do MIT
O Brasil não está em guerra civil, mas o estado atual de sua economia é como o de um país conflagrado, de acordo com Roberto Rigobon, professor de economia aplicada do Massachusetts Institute of Technology (MIT). "Em uma guerra civil é assim: há muita inflação e a economia se estanca", diz. "Na economia, o governo Dilma foi catastrófico."
Rigobon, que é venezuelano, define como "patética" a política externa adotada pelo Brasil nos últimos anos. O país, avalia, se omite em momentos em que ele deveria assumir um papel que lhe seria natural, o de líder da América Latina. "Parece que o Brasil tem medo de se comprometer e tomar decisões e ações duras, que cabem a um líder", afirma. Em vez disso, argumenta Rigobon, o Brasil gosta de se cercar "do pior do mundo" - e ele põe na lista Argentina, Rússia e sua Venezuela natal. "Só falta firmar um acordo de intercâmbio com a Coreia do Norte", ironiza.
Confira trechos da entrevista do professor ao site de VEJA.
O Brasil acaba de mudar seu governo. O senhor acredita que isso pode favorecer a economia do país? Depende de como essa mudança acontecerá em termos concretos. Acredito que uma gestão que suceda um impeachment é diferente da eleita pelo povo. Por enquanto, parece haver um otimismo exagerado. Em geral, na história mundial, observamos uma quantidade pequena de presidentes efetivamente culpados por corrupção. Antes de se tornar pública, quando se faz uma investigação, como a da Petrobras, por exemplo, a polícia pode investir todo o tempo na apuração do caso. Nesse contexto, é mais fácil chegar às provas dos crimes cometidos. Depois de vir à tona na mídia, os desafios aumentam, e isso se torna mais difícil. Já imaginou o que aconteceria se o Congresso resolvesse que não há evidências claras de que Dilma esteja envolvida em crime de responsabilidade? A lei prevê que ela volte ao poder, não é? Ainda que o mercado atribua "chance zero", acredito que existe o risco de o Congresso brasileiro não encontrar evidências suficientes para depor a presidente ou obrigá-la a renunciar. O fato de ter havido uma votação para abrir o processo não significa, necessariamente, que houve crimes. Isso complica o cenário.
Como o senhor avalia o papel do Estado na economia brasileira no governo Dilma? Foi catastrófico. Tão ruim quanto ter uma guerra civil, período em que os países não crescem e, ao mesmo tempo, têm inflação, em um quadro típico de "estagflação". Esse quadro é piorado, em grande parte, por medidas tomadas do lado da oferta, como a intervenção brutal do Estado, expropriações, em um cenário em que o setor privado tem medo de investir. Em uma guerra civil é assim: há muita inflação e a economia se estanca.
Qual o peso da crise externa para esse cenário? Nenhum. Esta inflação, por exemplo, tem raízes totalmente internas. Foi, portanto, causada pela incompetência do governo brasileiro. Em 2009, o mundo todo estava em crise, mas o Brasil não foi afetado. Esta é uma evidência clara de que os problemas que começaram a aparecer no país foram provocados pela acumulação de ineficiência e ideologia do governo anterior.
Como o senhor avalia a premissa de que o Brasil só pode negociar acordos comerciais junto com o Mercosul? Quando o Mercosul foi criado, há mais de vinte anos, ele trouxe muitos benefícios a Brasil, Argentina e Uruguai. Esses países adotaram diversas medidas pró-mercado, fazendo com que suas empresas buscassem atingir o mesmo nível, de uma maneira justa. Mas, como em todos os acordos, as partes têm que evoluir. Depois de ter desenvolvido bastante sobretudo a indústria, os países do bloco deveriam procurar outros parceiros, que fossem melhores que eles. A única forma de melhorar é incluir no clube nações mais desenvolvidas que as que já estão. Falo de Estados Unidos e países europeus. Isso forçaria o Mercosul a seguir evoluindo.
Mas o bloco optou por tomar outro rumo, certo? Sim. Há muito o que melhorar em termos de política externa. No caso do Brasil, a política externa foi patética nos últimos anos. Parece que o país gosta de se cercar do pior do mundo - Venezuela, Argentina, Rússia. Só falta afirmar um acordo de intercâmbio com a Coreia do Norte. O Brasil é muito covarde para investir em acordos internacionais, considerando o tamanho e a importância que tem.
Qual seria o passo natural para a evolução do bloco? Depois de incluir os países desenvolvidos, como EUA, Inglaterra, Alemanha, Espanha, União Europeia, o passo seguinte é: os países que não estiverem de acordo com essa ideia, devem ficar com suas ideologias - e deixar o grupo.
O Brasil, como grande potência do bloco, deveria assumir uma liderança nesse processo? Sim, mas o Brasil falhou nessa missão. Ele deveria ser o líder da região, posto que é compartilhado por Chile e Colômbia. Quando olham para a vanguarda da modernização, social política, econômica, da América do Sul, as pessoas não veem o Brasil. O país nunca quis, por razões que desconheço, assumir esse papel de líder. As empresas brasileiras não têm a visibilidade e a liderança que deveriam ter, dado o tamanho e a importância do Brasil. É muito triste. Parece que o Brasil tem medo de se comprometer e tomar decisões e ações duras, que cabem a um líder. Mas nunca é tarde. É importante que o Brasil seja líder da América Latina. Tem todas as condições. Só mencionam o Brasil para fazer a seguinte comparação: o Brasil, geograficamente, equivale a todos os outros países somados. Os países líderes da região deveriam ser Argentina e Brasil.
E os BRICS (grupo formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul)? Isso durou muito pouco. As razões, novamente, se relacionam com a falta de decisão e vontade do Brasil de ser líder neste espaço.
Como a comunidade externa percebe o momento das crises política e econômica do Brasil? Os desdobramentos dos escândalos de corrupção têm um aspecto positivo, de mostrar que as instituições estão funcionando e estão punindo corruptos. Nesse sentido, é muito positivo. Por outro lado, há ainda muita incerteza sobre quem será o próximo presidente, o que preocupa. Mas, em geral, o saldo é positivo.
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O senhor é venezuelano e se mostra bastante crítico dos caminhos tomados por seu país. Que saída econômica o senhor vê para a Venezuela? Acredito que a Venezuela vai enfrentar uma hiperinflação ainda maior do que a atual. Se isso acontecer, a parte econômica é mais fácil de resolver. Há que considerar que ela é muito ruim, pois produzem muita pobreza e dor. O aspecto positivo é que ela elimina todas as distorções do mercado, incluindo os preços de diversos contatos. Depois que isso acontecer, terá de haver uma mudança radical de governo. A atual gestão é muito ideológica, o que torna os desafios mais difíceis de ser superados. O governo venezuelano tem a maturidade de uma criança de 3 anos, especialmente no quesito teimosia. Por isso, em vez de se chamar "Maduro", deveria se chamar "Imaduro" (risos).
O que um novo governo teria de fazer? Se há uma hiperinflação, em novas eleições outro governo deveria ser eleito - e um que considere, em suas políticas, todos os venezuelanos. Um governo que reconheça que o chavistas são um grupo grande da população, que, de alguma forma, devem ser considerados e respeitados. Algo que se aprendeu com o governo Chavista - e que é uma lição para todos os países da América Latina - é que os programas sociais têm de ser mais ambiciosos.
Em que sentido? Há 50 anos, pensava-se que fazer algo pelos pobres já era suficiente. Hoje em dia, está claro que não temos que fazer algo, mas muito. O fenômeno de Chávez, na Venezuela, de Lula, no Brasil, dos Kirchner, na Argentina, de Morales, na Bolívia, tem em comum ideologias muito esquerdistas, antiquadas, algumas da Idade Média. Elas são resultado de uma frustração muito grande na sociedade, que reflete a falha dos sistemas democráticos na hora de suprir os cidadãos mais pobres. Espero que os últimos 15 anos de desastre na região sejam usados como aprendizado, para entender que o modelo de desenvolvimento futuro tem de incluir programas sociais muito mais ambiciosos que os do passado - que atendam os pobres e lhes deem oportunidades. Os próximos governos, tanto na Venezuela quanto no Brasil, não podem esquecer dos erros cometidos no passado. VEJA