E as delações, não valem nada? - ISTOÉ
Nos últimos dias, em eventos convertidos em comícios no Palácio do Planalto, a presidente Dilma Rousseff repetiu o mantra da vitimização ecoado desde a abertura do processo de impeachment. Ao questionar a legitimidade das ações contra ela no Congresso Nacional, a petista voltou a negar que tenha cometido crimes, a despeito dos fortes indícios de que tenha incorrido em pelo menos sete. O pedido de impeachment contemplou um deles: as “pedaladas fiscais”, manobras ilegais empreendidas nas contas do governo passíveis de enquadramento no crime de responsabilidade.
Na segunda-feira 11, a comissão especial encarregada de analisar o documento concluiu, por 38 votos a 27, pela sua admissibilidade por entender que a presidente transgrediu a Lei de Responsabilidade Fiscal. A decisão enfraqueceu a tese daqueles que tentam blindar a presidente de toda e qualquer responsabilidade. Algo que a Operação Lava-Jato também o faz, a cada novo acordo de delação premiada firmado com os investigados.
O senador Delcídio do Amaral (MS), por exemplo, implicou Dilma na tentativa de barrar a Lava Jato, o que caracteriza tentativa de obstruir a Justiça. De acordo com o ex-líder do governo no Senado, Dilma teria nomeado o ministro Marcelo Navarro para o Superior Tribunal de Justiça (STJ) em troca do compromisso de liberar empreiteiros presos pela Polícia Federal. O senador acusou ainda o ministro da Educação, Aloizio Mercadante, de tentar comprar o seu silêncio, em nome da presidente Dilma. Obstrução de Justiça é crime previsto na Constituição. Constitui crime de responsabilidade, se cometido pela mandatária do País, o que pode levar à perda do mandato. Mas Dilma insiste na sua pureza. O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, já sinalizou que não comunga do mesmo entendimento da presidente. Há duas semanas, ao emitir parecer contrário à posse de Lula na Casa Civil, Janot indicou a possibilidade de pedir a investigação de Dilma por obstrução de Justiça. Com base nas gravações de telefonemas autorizadas e divulgadas pelo juiz Sérgio Moro e na sucessão de fatos ocorridos em torno da nomeação de Lula, Janot entendeu que houve “uma atuação fortemente inusual” no procedimento da presidente Dilma. “O momento da nomeação, a inesperada antecipação da posse e a circunstância muito incomun da remessa de um termo de posse não havida à sua residência reforçam a percepção de desvio de finalidade”, disse Janot em seu despacho ao STF. Trata-se de uma referência do procurador-geral ao diálogo mantido entre a presidente e Lula na véspera da posse. Na conversa, Dilma que comunica que está encaminhando a Lula um termo de posse para “ser usado em caso de necessidade”.
Na mesma delação de Delcídio, Dilma aparece envolvida no rumoroso episódio da compra da Refinaria de Pasadena, no Texas (EUA). O senador disse que a presidente sabia de tudo e que ela o cobrava diretamente. “Fiz várias reuniões”, afirmou. A compra de Pasadena é considerada um dos negócios mais desastrosos da Petrobras e foi firmado em 2006, quando Dilma presidia o Conselho de Administração da estatal. Em sua colaboração, o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa já havia responsabilizado o colegiado comandado por Dilma pela compra de Pasadena. O pedido de impeachment em tramitação na Câmara associa o negócio de Pasadena ao crime de responsabilidade. “A máscara da competência fora primeiramente arranhada no episódio envolvendo a compra da Refinaria em Pasadena pela Petrobras. Por todos os ângulos pelos quais se analisa, impossível deixar de reconhecer que o negócio, mesmo à época, se revelava extremamente prejudicial ao Brasil”, apontam os advogados Hélio Bicudo, Miguel Reale Jr. e Janaína Paschoal, autores do documento.
Delcídio do Amaral, ex-líder no Senado: segundo o parlamentar, dilma tentou
barrar a lava jato e sabia de irregularidades na refinaria de pasadena
O doleiro Alberto Youssef foi além. Aos integrantes da Lava Jato, o doleiro disse que tanto o ex-¬presidente Luiz Inácio Lula da Silva como a presidente Dilma tinham pleno conhecimento do esquema de corrupção na Petrobras. “No meu entendimento, quando o Paulo Roberto Costa, nas discussões e nas brigas do partido (PP), ele pedia um sinal do Palácio do Planalto... No meu entendimento, (o Palácio do Planalto) tinha conhecimento”, disse o doleiro, ao ser questionado na CPI da Petrobras sobre o conteúdo de sua delação premiada. Perguntado a quem se referia ao dizer que o Palácio do Planalto tinha conhecimento, Yousseff elencou, entre outros nomes, Dilma e Lula.
EMPREITEIROS-DELATORES
Ricardo Pessoa (acima a esq.), da UTC, foi o primeiro a delatar a propina
via caixa um. Otávio Azevedo, da Andrade, endossou a história
No TSE, a campanha de Dilma é acusada de ter incorrido em crime eleitoral. O primeiro depoimento a lançar luz sobre as irregularidades na campanha de Dilma foi dado por Ricardo Pessoa, da UTC. Pessoa disse que a propina era repassada via caixa oficial. Outras delações corroboraram o testemunho. Executivos da Andrade Gutierrez afirmaram que havia um acordo para repassar R$ 150 milhões em propina, dividido em partes iguais entre PT e PMDB. Os recursos estariam relacionados a contratos da usina de Belo Monte (Eletrobras). Segundo Otávio Azevedo, ele foi procurado pelo ex-tesoureiro da campanha de Dilma, Edinho Silva, e por Giles Azevedo, que o “intimaram” a doar dinheiro. A expectativa entre os investigadores da Lava Jato é de que novas delações vão reforçar as suspeitas sobre o uso do Petrolão para reconduzir Dilma ao Planalto em 2014. Neste caso, estaria configurado mais um crime passível de perda de mandato.