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Pontes em colapso e obras abandonadas: falhas na infraestrutura prejudicam o país

RIO - Vai demorar no mínimo sete meses para que alguém possa cruzar novamente a ponte sobre o Rio Moju, no Pará. Uma das quatro pontes que ligam a Região Metropolitana de Belém ao resto do país, ela desabou depois que uma balsa bateu em um dos pilares, há pouco mais de uma semana. A queda de parte da via mostrou que faltavam defensas (blocos de concreto que protegem os pilares) e que havia estacas comprometidas. Mais um retrato da deterioração da infraestrutura no Brasil, que, sob risco de colapso, cobra um preço alto da economia.

 

Em novembro, já havia ocorrido a ruptura do Viaduto do Jaguaré, na marginal Pinheiros, em São Paulo. O trecho que cedeu só foi liberado para o tráfego no mês passado. E, em fevereiro de 2018, havia desabado parte do Eixão Sul, em Brasília. Para Renato Sucupira, sócio da consultoria BF Capital, essa situação põe vidas em risco:

 

— Deixar o ativo se deteriorar a ponto de colapsar é irresponsabilidade. É risco de vida. A queda do viaduto na Marginal Pinheiros poderia ter feito muitas vítimas.

 

Segundo estudo da Associação Brasileira de Infraestrutura e Indústria de Base (Abdib), apenas para cobrir a depreciação da infraestrutura que já existe — de transporte, logística, energia, telecomunicações e saneamento —, o Brasil tem de investir 1,9% do PIB. No ano passado, o aporte foi de 1,69%. Para manter e fazer a expansão necessária, o país deveria investir 4,5% em infraestrutura anualmente ao longo da próxima década.

 

— Não investimos nem o necessário para cobrir a depreciação dos ativos de infraestrutura — diz Igor Rocha, diretor de Planejamento da Abdib. — É importante que o Brasil defina o modelo de investimento que quer seguir.

Sem investimento, o que já existe se perde. Estudo da Inter.B, do economista Claudio Frischtak, aponta que o estoque de infraestrutura vem caindo sistematicamente. Já foi de 58,2% do PIB em 1986. Agora está em 35,9%.

— O ideal é ter 60% do PIB de estoque — diz Frischtak. — As pessoas pensam que obra de infraestrutura tem vida útil eterna. Parte significativa da nossa infraestrutura tem entre 30 e 40 anos, sem manutenção e investimento.

No Pará, além do custo estimado de R$ 113 milhões para reconstruir a ponte que caiu, há outras três com os mesmos problemas: faltam defensas e manutenção.

— As batidas das balsas aconteciam com a maré baixa, atingindo o coroamento do pilar. Dessa vez, foi na maré alta, colidindo diretamente no pilar. Vamos construir as defensas e dois vãos de 124 metros, para melhorar a navegação no canal — diz o secretário de Transportes do Pará, Pádua de Andrade, que acredita que o tráfego de barcos seja retomado em 15 dias.

Usinas no fim da vida útil

Na área de geração de energia, o cenário se repete. A CTG Brasil, da China Three Gorges Corporation, maior geradora de energia hidrelétrica no mundo, ganhou no ano passado o leilão das usinas de Jupiá e Ilha Solteira, cujas concessões foram devolvidas à União. Evandro Vasconcelos, vice-presidente de geração da CTG Brasil, conta que encontrou unidades que precisam de “grandes investimentos em reforma e modernização”: R$ 3 bilhões em até dez anos.

— Havia quatro máquinas em situação insustentável. A primeira etapa do nosso projeto foi reformar os geradores. Poderia haver uma falha, uma perturbação no sistema interligado. Todos as usinas são muito antigas, com medidores analógicos, com nível de precisão muito baixo — conta o executivo. — Mais de 65% das usinas estão no fim de vida útil, ou já passaram dela, com cerca de 40 anos. O sistema elétrico brasileiro é referência no mundo, mas houve grande indefinição quanto à renovação das concessões. Todos os concessionários pararam de investir na modernização do parque.

O abandono do Arco Metropolitano: postes de energia solar caídos e com sinais de furto. Foto: Brenno Carvalho / Agência O Globo
O abandono do Arco Metropolitano: postes de energia solar caídos e com sinais de furto. Foto: Brenno Carvalho / Agência O Globo

A falta de investimento também corrói equipamentos urbanos novos, como o BRT carioca, que começou a ser entregue à população em 2012. Sob intervenção da prefeitura desde o fim de janeiro, apenas três dos quatro corredores de transporte rodoviário estão em operação. Para viabilizar investimentos no sistema, que roda com cem ônibus a menos que o estimado, o município quer conceder o BRT à iniciativa privada.

Mais de 20 estações estão fechadas no trecho da Transoeste entre Santa Cruz e Campo Grande por causa do vandalismo. O corredor precisa ser reconstruído por causa de erros de projeto. O edital para a obra sai em uma semana, segundo a prefeitura.

Estradas precárias

O BRT Transbrasil, por sua vez, sequer foi concluído. Após sucessivas interrupções, as obras foram retomadas em meados de 2018, com término previsto no fim do ano. A comissão de intervenção do BRT diz que “o corredor atravessa uma região complexa, cuja segurança pública é atribuição das polícias”, referindo-se à Avenida Brasil. Esta, aliás, é outra falha grave na infraestrutura fluminense, diz Mauricio Lima, sócio do Instituto de Logística e Supply Chain (Ilos):

— O principal corredor viário do Rio é o pior exemplo que temos. Tem elevado número de acidentes, roubo de carga e de passageiros, cracolândia, pistas de largura irregular, falta de sinalização, sobretudo nos trechos em obras, e estrutura deficiente para as famílias que moram no entorno da via.

Pelos cálculos da Confederação Nacional do Transporte (CNT), há 16 mil quilômetros de estradas precárias no país. Para recuperá-los, seriam necessários R$ 53 milhões. A previsão orçamentária para este ano, no setor de transporte, é de apenas R$ 6,6 bilhões. Até abril, foram gastos R$ 1,5 bilhão. Em 2018, mais de seis mil pessoas morreram nas rodovias federais. De 1,7 milhão de quilômetros de rodovias, só 213 mil quilômetros são pavimentados, ou 12% do total.

Apesar da falta de recursos, sobra desperdício. Uma obra estratégica de quase R$ 2 bilhões, o Arco Metropolitano — corredor logístico que liga Itaboraí ao Porto de Itaguaí — prometia impulsionar o transporte e atrair empresas para o seu entorno, mas está subutilizado. Motoristas evitam passar ali por causa de assaltos. O moderno sistema de iluminação com placas de energia solar é alvo de roubos frequentes. No início do mês, o governo federal informou que um trecho da via será concedido à iniciativa privada.

Em busca de concessões

O abandono da infraestrutura não prejudica apenas quem usa diariamente uma via ou meio de transporte, mas todo o país. O gargalo é um fator que limita o crescimento econômico. O déficit em infraestrutura empurra o Brasil para a 108ª posição, entre 137 países, no ranking de Competitividade Global elaborado Banco Mundial de 2017-2018.

— Logística é preço. Influencia na composição do custo dos produtos. Com infraestrutura de transportes e logística deficientes, o país produz menos, vende menos e com preço mais alto, enquanto emprega menos — diz Renato Sucupira, sócio da consultoria BF Capital.

Sem recursos para investimentos públicos, a saída do governo é o plano de concessões à iniciativa privada. O orçamento do Ministério da Infraestrutura para este ano é de R$ 8,9 bilhões, dos quais R$ 4,3 bilhões foram contingenciados. A pasta quer aprofundar a concessão de rodovias, ferrovias, portos e aeroportos para, em paralelo, aplicar os recursos disponíveis em projetos sem atratividade.

Este ano, foram realizados leilões de 23 de ativos do setor, entre portos, aeroportos e ferrovia. Esse interesse, contudo, tem limite. O governo, dizem os especialistas, precisa investir nas áreas mais desafiadoras e deficitárias.

No setor de saneamento, por exemplo, o Brasil chama a atenção pelo atraso. Pouco mais da metade dos lares são ligados à rede de esgoto, enquanto 17% das casas não têm água encanada. O economista Claudio Frischtak destaca que outros países de renda média estão bem melhores:

— O Equador está melhor que o Brasil. A cobertura no tratamento de esgoto na Cidade do México é de fazer inveja. No Chile, mais de 90% do esgoto são coletados e tratados.

 

 
 
 
 

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