O PT não se entende
Dilma Rousseff se declara disposta a “encarar” a reforma da Previdência Social, que está ameaçada de entrar em colapso a médio prazo por falta de recursos, mas antes terá de convencer seu próprio partido a apoiar a ideia. Reunida na quinta-feira passada, a bancada do PT na Câmara dos Deputados chegou à conclusão praticamente unânime de que este não é “o momento mais adequado” para tratar do assunto. O déficit da Previdência foi de R$ 56,6 bilhões (1% do PIB) em 2014 e aumentou cerca de 50% no ano passado, para R$ 85,8 bilhões (1,5% do PIB). De acordo com as previsões do próprio governo, este ano o déficit deve crescer no mínimo mais 40%, chegando a R$ 120 bilhões. E a previsão oficial para as próximas décadas é catastrófica: o déficit pode chegar a R$ 7 trilhões (quase 10% do PIB), em 2060. O que significará, na prática, a falência do sistema previdenciário oficial. Cabe, então, perguntar aos parlamentares petistas: se não é este, qual será o “momento oportuno” para que parem de empurrar o assunto com a barriga e levem a sério a necessidade de uma reforma da Previdência Social?
A postura irresponsável da bancada petista na Câmara tem tudo a ver com a enorme decadência da credibilidade e, consequentemente, do potencial eleitoral do PT. Envolvidos até o pescoço em denúncias de corrupção que já levaram à condenação pela Justiça de dois ex-presidentes e dois ex-tesoureiros nacionais do partido – sem falar do cerco policial que se aperta em torno de Lula –, os petistas já se deram conta de que a fantasia de defensores intransigentes da moral e dos bons costumes não lhes serve mais. Só lhes resta continuar vendendo a imagem de defensores intransigentes dos fracos e oprimidos, o que implica não admitir que os “direitos dos trabalhadores” sejam ameaçados, por exemplo, por uma política previdenciária que substitua o paternalismo irresponsável, que condena o sistema à bancarrota, por uma nova regulamentação que adapte a Previdência à realidade nacional e lhe garanta sustentabilidade.
O populismo do PT – que encontra eco em bancadas aliadas – se revela imune ao bom senso e tem o instinto de sobrevivência aguçado pela proximidade das eleições municipais, que suscitam prognósticos devastadores sobre o desempenho do partido nas urnas. É natural, portanto, que os deputados petistas, que sabem da importância do apoio das bases municipais para sua sobrevivência política, prefiram subir nos palanques de outubro com o velho e fácil discurso populista da “defesa dos direitos dos trabalhadores”, em vez de ter de explicar a necessidade da adoção de medidas impopulares destinadas a evitar um mal maior no longo prazo.
“O problema é o tempo, a agenda. Não achamos que é o momento mais adequado e vamos dialogar com o governo para que não seja a prioridade agora”, argumentou após a reunião da bancada o deputado Vicente Cândido (PT-SP). Outro petista paulista, Carlos Zarattini, disse a mesma coisa: “A posição majoritária da bancada, quase 100%, é de que essa não é a melhor hora para discutir isso. Agora, não vamos nos recusar a debater o assunto se o governo quiser propor a reforma”.
Para informação do deputado Zarattini, a presidente Dilma Rousseff já declarou que proporá a reforma no prazo de 60 dias. Ela não tem perdido oportunidade para insistir na necessidade de rever o sistema previdenciário, inclusive a idade mínima para a aposentadoria. E por iniciativa do Planalto foi criado, em maio do ano passado, o “Fórum de Debates sobre Política de Emprego, Trabalho e Renda e de Previdência Social”, reunindo representantes do governo, de entidades patronais, das centrais sindicais de trabalhadores e de aposentados, para debater e apresentar sugestões a partir de uma detalhada pauta de temas específicos oferecida pelo próprio governo. Participa do fórum, obviamente, o ministro do Trabalho e da Previdência, Miguel Rossetto, que não pode ser definido como um entusiasta da reforma previdenciária. O fórum reuniu-se na quarta-feira passada, em Brasília. Provavelmente assustados com o andar da carruagem, no dia seguinte a bancada petista deixou clara sua posição sobre o assunto.