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'Redes sociais não têm o poder de eleger ninguém'

O diretor de Comunicação e Marketing da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Marcos Facó, especializado em marketing digital pela Universidade de Harvard, tem uma má notícia para quem enxerga nas redes sociais o caminho para uma vitória eleitoral: “As agências de marketing e consultorias querem criar um novo mercado e ficam alimentando um mito em torno do poder das redes sociais em uma eleição. Elas são só mais uma ferramenta. Não têm o poder de eleger ninguém”.

Para ele, o grande problema de quem aposta no poder das redes é achar que o eleitor brasileiro é aquele que vive nos grandes centros. “A TV e o rádio ainda são os melhores meios de penetração nos rincões do País.” Leia, a seguir, sua entrevista.

Qual será o peso das redes sociais nas próximas eleições?

Sou defensor das redes sociais, mas elas não serão as responsáveis pela vitória de um candidato. A nossa tendência é imaginar que todo mundo usa Waze, Uber, tem smartphone, 4G... Mas o Brasil é muito grande. Fora da bolha de quem mora em grandes centros ou é formador de opinião, o alcance dos meios digitais é muito menor. As agências de marketing e consultorias querem criar um novo mercado e ficam alimentando um mito em torno do poder das redes sociais em uma eleição. Elas são só mais uma ferramenta. Não têm o poder de eleger ninguém.

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Então, faz sentido os partidos brigarem tanto pelo tempo de TV?

Quando a gente fala do poder de influência das redes sociais estamos falando dos eleitores dos centros urbanos, de universitários, de gente esclarecida e que consome notícias nessas plataformas. Os especialistas ignoram esse recorte e tratam como se todo o Brasil fosse igual. A TV e o rádio ainda são os melhores meios de penetração nos rincões do País. A comunicação é mais palatável e direta. A pessoa que não tem um grau de formação adequado também tem dificuldade em absorver informações escritas. Até os chamados memes precisam de um background cultural para serem traduzidos. 

A impressão é de que nos meios digitais as eleições já começaram.

Sim. Por enquanto, a eleição só começou para uma faixa muito pequena de eleitores. Para os formadores de opinião, o jogo já começou. Portanto, a eleição já é pauta nas redes sociais, mas sua penetração na vida real das pessoas é limitada. A maioria está preocupada, no máximo, com a contusão do Neymar e sua participação na Copa do Mundo. Para fora da bolha do político, do jornalista ou do formador de opinião, as conversas são outras. A eleição não faz parte do conteúdo discutido por outras bolhas. É quase outra língua para elas.

Quem faz política nas redes sociais está falando para quem?

Se você não prestar atenção, você só vai falar para quem gosta de você. Para os políticos alcançarem um retorno real nas redes sociais, eles vão precisar de investimento. Não existe horário eleitoral gratuito nas redes sociais. Para falar com quem não é convertido, os políticos e partidos terão que investir em posts pagos, por exemplo.

Mesmo se o candidato tiver milhões de seguidores?

Milhões de seguidores não quer dizer nada. Os maiores usuários de Twitter, por exemplo, são os jornalistas e pessoas ligadas ao mundo da comunicação. E ainda tem quem diga que o Brasil usa o Twitter... Nem o jovem usa tanto como se imagina. Esses posts que se espalham pelo WhatsApp, Facebook e Twitter são resultantes do trabalho de convertidos. Quem acessa esse material já é o eleitor desse candidato. O impacto em termos de conquista de voto é muito baixo. Não acredito no poder de transformar esse engajamento em voto. 

O eleitor mais jovem, aquele que quase não assiste a TV aberta, não pode ser influenciado por esses meios?

Sim, totalmente. Agora, o profissional de marketing não consegue falar, entrar na mesma conversa, não consegue debater com esse jovem. Eles são mais críticos ao status quo e, naturalmente, estão nos extremos do debate político.

Políticos sabem usar a rede?

Políticos não usam bem as redes sociais. O marketing político atinge uma classe pequena, mas acha que está atingindo todo mundo. É difícil pautar as redes sociais quando você não está nos extremos. Tudo parte do amor ou do ódio. Quem está no meio, quem se manifesta num nível mais profundo de discussão, pouco participa desse debate. O barulho é de quem ama e odeia, quem defende ou ataca. O político recebe likes e só ouve elogios. Os críticos são reduzidos. O marketing político é incipiente no digital. Na TV, é mais simples e funciona. 

A tecnologia não pode ao menos melhorar a qualidade do voto?

Olha, pessoas que não são tão esclarecidas tornam difícil identificar a razão do voto. Claro, existe o coronelismo, o voto de cabresto, a troca de favores e a venda do voto. A tecnologia não matou o coronelismo. Não matou nada disso. E não matou em razão do baixo nível educacional da população. As pessoas se vendem porque não têm dimensão do que estão fazendo. Existem os “Brasis” que a gente esquece. São as deficiências desses “Brasis” que fazem as coisas serem como são.

As fake news espalhadas pela rede vão inundar a discussão política nos próximos meses?

Tem o mito da fake news... Isso sempre existiu. Mas o que é fake news? Quando um candidato faz uma promessa que todo mundo sabe que não será cumprida, isso é fake news. Até que ponto a plataforma dos candidatos é verdadeira? Vai ser difícil fazer uma curadoria do que é fake ou não. A lógica é: se a fake news me é favorável, minha tendência é replicar; se é desfavorável, vou denunciar. Não vejo as pessoas querendo excluir as fake news. Elas querem excluir as fake news que serão desfavoráveis. Se você fala mal de mim é fake news. É o que o Donald Trump faz. Acredito que será uma campanha tão fake (falsa) quanto as fake news. 

Gilberto Amendola, O Estado de S.Paulo

12 Março 2018 | 03h00

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