‘Político não é uma criação de última hora’
Mônica Scaramuzzo, Renata Agostini, O Estado de S. Paulo
03 Dezembro 2017 | 04h00
À frente da Vale desde maio deste ano, o executivo Fabio Schvartsman vê o ano de 2018 mais volátil para o mercado financeiro por causa das eleições, mas acredita que o governo Michel Temer criou, nos últimos meses, uma composição sustentável para a melhora do ambiente econômico. Em sua primeira entrevista desde que assumiu a mineradora, Schvartsman abre a série que o Estado está fazendo com grandes empresários e executivos para discutir o País. A seguir, os principais trechos da conversa.
Qual deve ser a prioridade do presidente Michel Temer no seu último ano de governo?
O ano de 2018 é um ano muito volátil por definição por causa das eleições. Então, o que o governo pode ou não pode fazer tem bastante a ver com as circunstâncias que nós estamos vivendo. Como pano de fundo, temos uma situação que, pela primeira vez que me recordo na história recente do País, temos taxas de juros muito baixas, com inflação em queda, em uma composição sustentável. Isso é uma excelente notícia e incentiva muito os investimentos em geral. É um momento muito interessante, mas que infelizmente combina com a volatilidade que vem do ano politicamente sensível.
Em um ano marcado pela eleição, é possível pensar no prosseguimento da agenda de reformas do governo?
O governo está fazendo uma força muito grande para viabilizar de alguma maneira a reforma da Previdência, que é da maior importância e tem a ver com a sustentabilidade das condições econômicas para o futuro. Talvez não tenha a ver especificamente com o ano de 2018, que acho que está dado, que é a redução de taxas de juros e a recuperação da recessão forte que tivemos. Em 2019 em diante, passa a depender das demais variáveis macroeconômicas e, para isso, a percepção de que o governo terá condições de pagar as suas contas, ou seja o equilíbrio fiscal e, consequentemente, a reforma da previdência é fundamental.
Uma reforma da Previdência é bem-vinda mesmo sendo mínima?
Coisas radicais têm maior dificuldade de passar qualquer que seja o governo. Uma reforma menor, mas que enderece as questões-chave, é um benefício que fica.
A Vale, ao lado da Petrobrás, lidera os investimentos para os próximos anos. O que falta para outras empresas retomarem os investimentos?
Confiança na estabilidade do cenário político e econômico. Se as reformas não forem feitas, o desequilíbrio fiscal vai acabar levando em algum momento à inflação, vai levar novamente à desvalorização da moeda, consequentemente vai levar ao aumento de juros, provocando a redução dos investimentos feitos pelas empresas. Então, a única maneira de fazer as empresas investirem é apresentar um cenário que tenha um grau de estabilidade.
Então 2018 vai ser um ano morto diante das incertezas em relação às eleições?
Não morto, mas morno. Alguns investimentos vão se realizar sim, por causa da redução das taxas de juros. É inevitável que o mercado imobiliário se reaqueça o ano que vem. Algumas coisas vão acontecer naturalmente, o consumo vai aumentar. Com o aumento do emprego e da renda, você tem como resultado a economia funcionando um pouco melhor. Então, é um ano que está dado.
Estamos em 2018 diante de uma eleição histórica? O sr. vê assim?
Todas são. O País é muito presidencialista. Toda vez que se elege um presidente ,se interfere muito no desenvolvimento, no futuro do País.
O sr. vê de uma maneira negativa o País ser muito presidencialista?
Essa discussão foi feito durante a reforma da Constituição. Mas é fato que a maneira como o processo eleitoral é conduzido hoje em dia não permite ligação direta entre o eleitor e o candidato e isso é um problema. A maioria das pessoas sequer se lembra em quem votou. Agora se fossem pessoas do seu bairro, da sua vizinhança, isso permitiria que eles tivessem uma melhor avaliação se aquele camarada está fazendo aquilo que esperava que ele produzisse. Essa cobrança é muito saudável, produziria algo de qualidade no nosso processo político.
O sr. fala de voto distrital?
Exatamente. Mas de verdade. Está comprovado que o nosso sistema está funcionando mal por tudo que nós passamos nos últimos anos. Algum tipo de ajuste tem de ser feito para a gente ter uma chance de ter um tipo de processo político de qualidade. A reforma política é essencial.
O sr. acredita que é preciso alguém de fora da política para conduzir as mudanças que o senhor espera?
Ainda muito cedo para falar como está o processo político. As pesquisas como se apresentam como hoje em dia não significam nada. Estamos muito distantes das eleições. Gostando ou não, os programas eleitorais da televisão têm impacto muito grande para onde os eleitores se inclinarão.
É preciso apostar em políticos profissionais ou alguém de fora da política?
Como tudo na vida, profissionalismo é importante. Um político tem de saber o que está fazendo. Não pode ser uma criação de última hora. Acredito em carreira, que as pessoas aprendem ao longo de sua vida e, consequentemente, que não leve a uma eleição de outsiders. Agora, é importante que haja renovação na base do sistema. É preciso que haja pessoas novas entrando continuamente na política e oxigenando, trazendo outras ideias e outros valores para política brasileira.
O sr. acredita que as lideranças empresariais têm de ser vocais no período de eleição por exemplo?
Gostaria muito que as lideranças brasileiras se expusessem e falassem mais a respeito dessas questões. Especialmente porque é essa ausência de manifestação que inclusive tem ajudado para que o quadro econômico e político tenha sido tão ruim nos últimos anos. Pega, por exemplo, o pré-sal. Foi discutido num momento de euforia em que estava se descobrindo petróleo. No Brasil, não houve debate. Simplesmente foi feito por uma vontade da liderança da ocasião. Cada uma dessas coisas tem importância fundamental, tem de haver debate público e os empresários tem obrigação de participar. Quanto mais gente fizer isso, melhor será para o País.
O mercado financeiro diz que um populista não fará bem à economia. O sr. partilha dessa visão?
Um governo populista nunca faz bem para nenhuma economia. Não é agora, não é nesse momento particular. Populismo é sempre fogo de palha: produz um beneficio num primeiro momento e a conta vem depois. Sempre vem uma conta muito grande. O problema é que, geralmente, as pessoas, que deram o benefícios não são as mesmas que sofrem as consequências no fim dele. Acho que passamos por um duríssimo aprendizado nos últimos anos a respeito dos desmandos todos que causaram a situação econômica e política que estamos agora. Tenho a impressão de que agora é hora de o povo mostrar que aprendeu e vai ter a melhor maneira que existe que é votando.
Considerando a influência do governo na Vale, inegável nos últimos anos, como o sr, acha que a eleição pode influenciar os rumos da empresa?
É uma página virada pelo que compreendo na Vale. Tivemos a alegria de, nos últimos meses, participar de um processo de transformação da Vale numa corporação, aonde houve a extinção da figura do controlador. Consequentemente a influência direta do governo na gestão da companhia é obviamente menor do que jamais foi. Não existe mais aquela organização que dava ao controle da companhia para poucas pessoas jurídicas onde o governo estava muito representado.