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Abstenções têm efeito incerto, mas podem impedir definição da eleição no 1º turno

Ricardo Balthazar / FOLHA DE SP

 

SÃO PAULO

De todos os fatores que podem contribuir para uma definição da eleição presidencial deste ano no primeiro turno, no domingo (2), o que mais tem desafiado os especialistas é o declínio dos índices de participação do eleitorado, que vêm diminuindo desde 2010.

Segundo o Tribunal Superior Eleitoral, 20% dos eleitores aptos a votar não compareceram às urnas nas eleições de 2018, quando o presidente Jair Bolsonaro (PL) foi eleito. Em 2006, quando o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi reeleito, 17% não votaram.

Vários motivos podem explicar o aumento da taxa de abstenção, incluindo dificuldades com transporte no dia da votação, falhas nos cadastros da Justiça e até o desinteresse das pessoas pela política, mas não há estudos que permitam saber qual razão tem prevalecido.

Nas eleições municipais de 2020, as abstenções atingiram 23%, mas o pleito desse ano foi atípico, por ter ocorrido no auge da pandemia de Covid-19. Pesquisas feitas pelo Datafolha na época indicaram que muitos eleitores ficaram em casa porque tinham medo de se contaminar.

Uma dificuldade para análise das abstenções é a desatualização das informações de muitos eleitores. Dos 156 milhões considerados aptos a votar neste ano, 24% ainda não fizeram o recadastramento biométrico, em que o TSE coleta assinaturas, fotos e digitais de todos.

Neste ano, analistas apontam as abstenções como um fator que pode reduzir as chances de uma vitória de Lula no primeiro turno. Para liquidar a fatura no domingo, o petista precisará obter mais de 50% dos votos válidos, excluídos da contagem votos em branco e nulos.

Segundo o levantamento mais recente do Datafolha, divulgado nesta quinta (29), Lula tem 50% dos votos válidos. Como a margem de erro da pesquisa é de dois pontos para mais ou para menos, o candidato petista estaria com algo entre 48% e 52% dos votos válidos.

Estudiosos que analisaram dados das últimas disputas presidenciais notam que a abstenção foi maior em alguns dos segmentos do eleitorado em que Lula tem mais força, mas acham muito difícil prever o impacto que uma repetição desse fenômeno poderia ter agora.

Segundo o TSE, as taxas de comparecimento de eleitores com poucos anos de estudo foram menores em 2018 do que as de eleitores com maior escolaridade. É um indício de que Lula pode ter problemas com eleitores de baixa renda, que lhe dão grande vantagem nas pesquisas.

Em 2018, compareceram às urnas 79% dos eleitores que só tinham o ensino fundamental completo ao se registrar, e 88% dos que tinham ensino superior. A diferença é ainda maior entre os analfabetos: somente 49% dos que estavam aptos a votar participaram da eleição.

Por outro lado, o engajamento das mulheres tem sido maior que o dos homens, e as pesquisas também indicam vantagem para Lula nesse segmento, que representa a maioria do eleitorado. No Datafolha, o petista tinha 49% das intenções de voto entre elas há uma semana.

Segundo as estatísticas do TSE, votaram na última eleição presidencial 80% das mulheres inscritas e 79% dos homens. Nas eleições de 2014, quando a então presidente Dilma Rousseff (PT) foi reeleita, 82% das mulheres aptas e 80% dos homens participaram da votação.

"Muitos acham que a abstenção reflete insatisfação dos eleitores com a política, mas não temos elementos para saber isso", diz o cientista político Jairo Nicolau, da FGV (Fundação Getúlio Vargas). "Uma eleição mais disputada como a deste ano pode levar mais gente às urnas."

Os números do TSE mostram que, em 2018, o comparecimento às urnas aumentou no Nordeste. A região representa 27% do eleitorado e é uma das fontes principais da força eleitoral de Lula. Segundo o Datafolha, ele tinha 62% das intenções de voto no Nordeste há uma semana.

A abstenção foi maior no Sudeste, região que reúne 43% do eleitorado e onde a vantagem de Lula sobre Bolsonaro nas pesquisas é mais estreita. De acordo com as estatísticas oficiais, 22% dos eleitores aptos a votar no Sudeste não compareceram nas eleições de 2018.

Alguns segmentos em que a abstenção foi muito grande em pleitos anteriores têm pouco peso relativo no conjunto do eleitorado, como é o caso de analfabetos e idosos com mais de 70 anos, que não são obrigados a votar. Isso tende a reduzir o impacto no resultado final.

Fernando Meireles, pesquisador do Cebrap (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento), calcula que uma repetição dos baixos índices de comparecimento dos idosos causaria uma perda de 0,34% dos votos para Lula, cuja vantagem sobre Bolsonaro é menor nessa faixa etária.

Parece irrelevante, mas pode fazer diferença se a margem para vitória no primeiro turno se estreitar mais até a hora da votação. "Acho difícil que as abstenções alterem drasticamente o quadro", diz Meireles. "O voto útil e definições de última hora tendem a ser mais importantes."

Um fator que não esteve presente em outras eleições poderá contribuir desta vez para aumentar a abstenção, a preocupação do eleitorado com a violência política. Há duas semanas, 9% disseram ao Datafolha que podem não sair de casa por temer atos violentos no domingo.

Na semana passada, quando o instituto quis saber se os eleitores estão com vontade de votar, somente 3% disseram aos pesquisadores que não pretendem comparecer e 16% afirmaram que irão votar mesmo sem nenhuma vontade. Entre as mulheres, 21% se expressaram assim.

"As pessoas parecem mais convictas de suas escolhas nesta eleição e isso poderá levar mais gente a votar", diz Luciana Chong, diretora do Datafolha. As pesquisas mostram que a maioria dos eleitores de Lula e Bolsonaro se definiram há meses e não pretendem mudar o voto.

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