Ciro fez de tudo na Globo para ser notado, mas tudo não quer nada com ele.
O Jornal Nacional revelou-se um extraordinário sedativo. Um dia depois de exibir aos espectadores um Bolsonaro estalando de serenidade, o telejornal da Globo levou ao ar um Ciro Gomes prenhe de humildade. O candidato do PDT deixou a prepotência e o coldre em casa. Foi à entrevista armado apenas do seu programa de governo. Durante 40 minutos, Ciro fez de tudo para ser notado pelo eleitor. Não se saiu mal. O problema é que a essa altura, faltando 40 dias para a eleição, tudo parece não querer nada com Ciro. Numa campanha em que os favoritos oferecem ideias rasas, que podem ser atravessadas por uma formiga com água pelas canelas, um azarão que esgrime diante das câmeras o livro que eque editou para expor sua plataforma merecia melhor sorte. Mas, embora Ciro declare sua "vassalagem" pelo povo brasileiro e se comporte como se estivesse disposto a dar a vida pelo país, a maioria do eleitorado dá um bocejo para Ciro. O candidato manuseia propostas boas e ruins. Podendo concordar ou discordar dele, o eleitor optou por ignorá-lo.
Bem equipado, Ciro caprichou nos diagnósticos. Ao prescrever as terapias, exagerou nos números e no otimismo. Tratou grandes tumores como pequenos furúnculos. Eleito, não disputará a reeleição. Projetará 30 anos em quatro. Sem aliados, empinará reformas essenciais no Congresso nos primeiros seis meses. Avesso às coalizões dos mensalões, petrolões e orçamentos secretos, dissolverá impasses políticos por meio de plebiscitos.
No Brasil de Ciro, o sol será mais amarelo e as enchentes secarão. Fauna, flora e índios serão protegidos desde o primeiro dia. Algoritmos passarão a prever a hora e o local dos crimes antes que eles aconteçam. Haverá emprego, saúde, educação e chope gelado. O Auxílio Brasil vai virar uma renda mínima de R$ 1 mil. No minuto final, Ciro informou em primeira mão que haverá também uma 'lei antiganância', com um teto para a cobrança de dívidas.
É improvável que o Jornal Nacional transforme Ciro Gomes num foguete capaz de disparar dos 7% no Datafolha para o segundo turno da corrida presidencial. Mas, no reino das redes sociais, a entrevista fez de Ciro o candidato favorito a virar meme —ou imperador de um País das Maravilhas. Sem Alice, que é muito chata..