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Votar em 'a' ou 'b'?

Dom Odilo Pedro Scherer, O Estado de S.Paulo

13 de agosto de 2022 | 03h00

As eleições de outubro aproximam-se a passos largos. Em destaque, no interesse geral, está a campanha presidencial, e até parece que as eleições para os Executivos estaduais e a renovação do Parlamento nos níveis federal e estadual são secundárias. A disputa vai se acirrando e a aposta, na prática, acabou sendo plebiscitária, envolvendo duas candidaturas com posições ideológicas opostas. Os principais focos são os nomes de candidato a e candidato b. É votar à direita ou à esquerda. Em torno desses polos acabam se abrigando as agremiações partidárias menores, jogando com time a ou com time b, apostando na condição de vencedores ou arriscando-se a ficar na posição dos opositores.

No entanto, é mal que se pergunte, quais são, de fato, as propostas e os programas de cada um desses lados para o Brasil? Votaremos no candidato por simpatia ou aversão, ou por propostas e promessas convincentes que, depois, possam ser efetivamente implementadas e cobradas?

A eleição dos deputados e senadores é, certamente, subestimada e a composição do Congresso Nacional e das Assembleias Legislativas dos Estados mereceria maior atenção, pois o presidente e o governador não governarão sozinhos – assim se espera! A menos de dois meses das eleições, quem conhece os candidatos já definidos para as Casas legislativas?

Enquanto isso, aumentam os preços do leite, da carne, do feijão, do arroz, do transporte, do remédio e de tanto mais que se faz necessário para viver e fica cada vez mais fora do alcance da população pobre. O desemprego mantém-se na população mais carente, que sobrevive graças a programas assistenciais e emergenciais. Triste é constatar que a fome voltou a bater à porta de mais de 30 milhões de brasileiros, que precisam fazer uma ginástica sofrida para sossegar o estômago a cada dia. Aumentam os números de moradores de rua e dos que precisam optar entre pagar aluguel, água e luz ou comer, realidade sempre mais constrangedora também na poderosa economia de São Paulo.

Crescem a violência, a insegurança, a crise ambiental e a falta de confiança nas instituições. Tudo culpa da pandemia de covid-19? Da guerra na Ucrânia? Não se desconhece nem se subestima a influência de tais fatores circunstanciais, mas nosso problema não é novo e a atual crise social brasileira é mais velha que esses fatores. As eleições seriam um momento privilegiado de exercício da cidadania e para implementar a convivência democrática. Que pena, estamos desperdiçando energias na reafirmação da confiabilidade das urnas eletrônicas, em vez de empenhá-las, bem melhor, na discussão daquilo que realmente importa para melhorar o Brasil e para abrir horizontes de esperança para os descartados e sofridos, que precisam lutar pela sobrevivência de cada dia.

O que ganha a população pobre com a atual disputa eleitoral? Que perspectivas melhores terá o desempregado, quem faz bico nas calçadas e esquinas movimentadas de nossa cidade? Pode o morador de rua, aquele que vive nas extensas e carentes periferias de nossas metrópoles, ou no profundo interior do Nordeste e da Amazônia, esperar que sua situação mude para melhor com a vitória de time a ou de time b?

O atual clima de polarização ideológica vivido no Brasil não traz boas perspectivas de futuro. Seria tempo de olharmos as eleições como ocasião para mudar o foco para os problemas reais do povo brasileiro no presente e do futuro. Lembro, aqui, palavras do papa Francisco na encíclica Fratelli tutti, sobre a fraternidade e a amizade social (2020). Os problemas atuais, entre os quais a pandemia de covid-19, deveriam ajudar-nos na busca solidária e fraterna de solução, superando agressividades destrutivas e a afirmação individualista. Sem exceção, dependemos uns dos outros e ninguém se salva sozinho. Em vez de construir mundos fechados e levantar muros, é preciso construir pontes e acreditar na colaboração. Populismos messiânicos, de qualquer matiz, já se mostraram danosos e ineficazes para resolver os problemas dos povos. É perigoso acirrar a polarização ideológica, jogando cidadãos contra cidadãos. Que se debatam propostas e projetos.

Há dois modos de enxergar o embate eleitoral que se aproxima: pelo lado dos concorrentes, que envidam suas energias para ganhar o preito. E o olhar do eleitor, que espera mudanças e melhoras em sua vida. É justo que o eleitor se pergunte: que ganho eu com a eleição? Minha situação vai melhorar? A situação do Brasil vai melhorar? Não me refiro à vantagem miúda de um benefício ocasional, eventualmente fruto de corrupção eleitoral. O que importa é perguntar: quem deveria sair mais beneficiado nas próximas eleições? Grupo a ou o grupo b?

Quem, finalmente, deveria ganhar com o resultado das eleições é o Brasil, saindo-se mais apaziguado e esperançoso. Sobretudo o Brasil descartado, pobre, faminto, doente, sem casa, sem trabalho, sem escola, sem esperança. O Brasil de todos os brasileiros, solidário e fraterno, sem derrota nem exclusão. Isso é esperar demais?

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CARDEAL-ARCEBISPO DE SÃO PAULO

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