A escolha - ISTOÉ
É chegada a hora da travessia do Rubicão dos brasileiros. Aquele momento em que, ultrapassada a eleição desse domingo, 28 — talvez a mais sangrenta, radical e imprevisível dos últimos tempos —, uma nova folha da história democrática será aberta. A referência ao Rubicão, que levou o imperador Júlio César à decisão mais arriscada de sua trajetória, quando cruzou o rio do mesmo nome para desbravar novos territórios, não é gratuita. Tomada por empréstimo, a expressão cabe na atual circunstância nativa por restar, também aos eleitores, uma das mais difíceis, senão inesperada, escolha sobre o seu futuro e desígnios. Será uma opção irrevogável e consequente.
A sorte está lançada, diria o lendário imperador. Lá, como aqui, é bem isso. O País está prestes a restaurar, 33 anos depois, os ditames militares que, em outra época e em outras condições, curvaram de morte as liberdades individuais através de uma ditadura tão infame como covarde. Guardada as proporções, a realidade é outra, a proposta também, em que pese o viés extremista e conservador. No mesmo movimento de faxina, a corrida presidencial está varrendo do mapa a agremiação que mais trouxe problemas à Nação no campo econômico, político, social e, por que não dizer, moral.
O PT sairá bem menor, encolhido, relegado a um papel de coadjuvante do processo. Já se sabe desde já. Uma obliteração de status e relevância arquitetada por anos. Desde que a agremiação resolveu servir de guarida à corrupção e ao terrorismo de rua, incitando o quebra-quebra, como armas de campanha. Errou feio e pagará o preço. Eleitores darão nas urnas uma resposta eloquente sobre o que querem e o que não querem daqui para frente. À bem da verdade, há quem diga que eles estão escolhendo uma coisa e levando outra. Mas não há como negar, no clima inquisidor e de acusações instaurado no Brasil, movido por mentiras cavalares e separado por duas candidaturas beligerantes, o resultado não poderia ser diferente: um voto pelo novo, rompendo as amarras com a política ultrapassada e corrosiva.
Na prática, a conclusão inescapável sobre o fator que rachou o País e produziu o quadro doentio, de quase guerra, entre dois lados é a de que o Partido dos Trabalhadores, com suas rivalidades imaginárias, fabricadas para atrair aliados, criou Jair Bolsonaro, como um reflexo oposto, um contraponto a sua imagem e semelhança, com as mesmas imperfeições, cacoetes e tentações totalitárias.
O anticristo do lulopetismo, talvez menos venal, certamente mais antenado com o conservadorismo em ascensão. O capitão reformado, não pelo que fez, mas pelo que representa, trás um favoritismo fruto do meio, curtido no ódio visceral que a legenda dos vermelhos semeou. Surgiu na base da alternativa à balbúrdia administrativa, ao aparelhamento do Estado, ao compadrio congressual e ao roubo em escala gerados pelo PT e chegou aonde chegou com poucos méritos e um senso de oportunismo afiado.
É sabido, na raiz do mal que enviesou a eleição para uma trilha jamais explorada até então está a tática desesperada, ofensiva e cínica do partido para o qual vale a regra do “Nós podemos tudo, ninguém pode mais”. Senão, vejamos: há poucos dias uma declaração, de resto indevida do filho do candidato Jair Bolsonaro, atentando contra a soberania do STF, gerou uma fuzarca, especialmente nas hostes do PT. O presidenciável Fernando Haddad, evidentemente, omitiu em meio ao deslize da esquadra adversária, que gente de seus próprios quadros, como o deputado Wadih Damous, havia proposto nada menos que o fechamento sumário do Supremo, no que foi seguido pelo quadrilheiro José Dirceu, que sugeriu retirar poderes da Justiça. Mesmo o demiurgo Lula já havia partido prá cima daquela casa reclamando que “O STF está totalmente acovardado”. Mas nada disso importa.
O PT se acostumou a não reconhecer seus erros. Não pede desculpas e é mestre em apontar os pecados dos demais. No plano da emissão de mensagens em massa, por exemplo. Ele criou anos atrás esse esquema de fake news, catequizando seguidores na base da mentira. É provável que o senhor Haddad deliberadamente não tenha parado para verificar a quantidade absurda de impulsionamentos que o próprio partido veio realizando ao logo do tempo em redes digitais. É mais certo ainda que ele não enxergue ai nenhum mal ou dano a terceiros.
Afinal, a agremiação da qual participa, no seu entender e no de seus pares, pode tudo, como já foi dito, restando aos demais o dedo inquisidor e acusador dos raivosos petistas. Esses convertem qualquer coisa em uma prova de golpe insidioso às suas pretensões de poder. Na base da malandragem e do cinismo, aplicando seguidas rasteiras, o PT tem alimentado a irritação que o País inteiro passou a ter contra o partido. Não toma jeito. Não aceita de maneira alguma jogar limpo, de igual para igual, e perder legitimamente, conforme a preferência nacional. O problema, é óbvio, será dele. O processo eleitoral segue o curso.
Não vai, nem poderia, se curvar às idiossincrasias e muxoxos de uma agremiação cujo único intuito é impor na marra aos brasileiros a doutrina espoliadora, de assalto aos cofres públicos. O Brasil é maior que isso. E fará a escolha que lhe cabe como melhor.