Para o alto e avante
BALNEÁRIO CAMBORIÚ - O horizonte tomado por espigões, alguns com mais de 40 andares, lembra São Paulo, mas é em Balneário Camboriú, cidade à beira-mar com apenas 124 mil pessoas — população equivalente à de Araruama, na Região dos Lagos — que se constrói o futuro maior edifício exclusivamente residencial do país, segundo dados da ONG Council on Tall Buildings and Urban Habitat (CTBUH). O arranha-céu que promete deixar os outros prédios à sombra tem 280 metros de altura. A concorrência é acirrada: ali foram construídos os três maiores empreendimentos residenciais do Brasil, com 160 metros — patamar do prédio comercial do shopping Rio Sul, o mais alto do Rio. Quem chega a Balneário Camboriú, em Santa Catarina, vê que a praia não é mais a protagonista. Os arranha-céus se multiplicam pela cidade e roubam o sol da faixa de areia: a partir de 14h, a sombra começa a se espalhar sobre a Avenida Atlântica — via de mesmo nome da do bairro de Copacabana, com quase sete quilômetros de extensão —, onde estão localizados os maiores edifícios.
Mas a preferência por prédios descomunais, para os quais o céu não é mais o limite — como o One Tower, que tem 280m, segundo a ONG CTBUH, mas que a construtora FG Empreendimentos só informa que tem 70 pavimentos — está longe de ser unanimidade. Balneário Camboriú ostenta o quarto maior índice de Desenvolvimento Humano (IDH) entre as cidades brasileiras — atrás apenas de São Caetano do Sul (SP), Águas de São Pedro (SP) e Florianópolis (SC) — e há mais de dois anos discute um novo plano diretor para definir o que pode e o que não pode ser feito. Durante as negociações, chegou-se a suspender a autorização para novos prédios, mas essa restrição acabou suspensa há alguns meses.
— Os próprios edifícios fazem sombra no maior potencial turístico da cidade, a praia — afirma o professor de Arquitetura da Universidade do Vale do Itajaí (Univali) Evandro Gaspar.
DISPUTA PELO PRÉDIO MAIS ALTO
Para acabar com a sombra e criar vagas de estacionamento, existe até um projeto de alargamento da faixa de areia da praia em cem metros — com aterro do mar — que aguarda a aprovação dos órgãos de licenciamento ambiental. Após um movimento de verticalização iniciado nos anos 1980, o movimento ganhou força nos anos 2000. E restam apenas três casas na Avenida Atlântica.
As duas maiores construtoras da cidade — Embraed e FG Empreendimentos — travam uma disputa velada para definir quem constrói o edifício mais alto. O “embate” agita o mercado local da construção civil, alicerce fundamental da economia de Balneário Camboriú.
— Temos terrenos grandes para construções e pretendemos continuar a crescer, atentos à demanda. Camboriú se destaca pela beleza da arquitetura. E há prédios mais antigos, com arquitetura obsoleta, que podem ser repaginados — diz o diretor comercial da FG Empreendimentos, Altevir Baron, que avalia haver estrutura para projetos de grande porte na cidade.
Nesse mercado, a disputa é metro a metro. É da FG o Millenium Palace, prédio com 164 metros de altura e 44 pavimentos, pouco mais alto que as duas torres do Villa Serena, da Embraed, com 160 metros e 46 pavimentos. Em construção, o Yachthouse Residence Club tinha previsão inicial de 227 metros. Numa segunda versão, ganhou mais musculatura e galgou até os 254 metros e 74 andares, segundo a construtora Pasqualotto.
Diretor financeiro do Grupo Embraed, Marcos José da Silva afirma que não faria sentido restringir a construção em Balneário Camboriú e compara a situação com a de metrópoles como Nova York:
— Se não gostassem de prédios altos, não receberíamos tantas pessoas na alta temporada em Balneário Camboriú. Existem pessoas que gostam de natureza intocável, outros gostam de gente.
Muitos proprietários só ocupam os imóveis no verão, enquanto investidores apostam na temporada. A população da cidade pula de pouco mais de cem mil para um milhão nessa época do ano. No Sea’s Palace, com 40 andares, apenas oito ou nove apartamentos são ocupados fora do verão, segundo uma moradora. As garagens vazias dos prédios comprovam a tendência.
CARRO DE LUXO PARA QUEM VENDE MAIS
Para o presidente do Núcleo do Instituto de Arquitetos do Brasil Departamento Santa Catarina IAB-Litoral Norte Camboriú, Juliano Marini de Oliveira, é preciso pensar formas de equilibrar a construção civil com a preservação da qualidade de vida da cidade.
— Balneário Camboriú tem que tomar cuidado para não virar Guarujá. É preciso criar infraestrutura para evitar problemas, como de trânsito, falta d’água e energia — alerta Oliveira.
Secretário de Planejamento e Gestão Orçamentária do município, Fábio Flôr diz que a proposta da prefeitura é reduzir o número de unidades nos terrenos e ampliar a área de recuo:
— É preciso reduzir o adensamento e planejar a cidade. Não pode é prédio de cem andares em terreno de mil metros.
Flôr diz que a cidade tem ampliado sua infraestrutura. Um dos exemplos é a criação da ciclovia na Avenida Atlântica, que eliminou o estacionamento no local. Problemas no abastecimento de água, por exemplo, são restritos à época da alta temporada, diz ele. O debate sobre o plano diretor, porém, ainda está em aberto.
Para além da altura dos prédios, a cidade vive fase de apreensão diante da crise no mercado imobiliário. As construtoras negam queda de preços, mas corretores avaliam que o cenário mudou. Henrique Mariano, da Webbimóveis, tenta vender há dez meses uma unidade num dos espigões, no qual a construtora ainda tem apartamentos à venda. Sérgio Pandolfo, da imobiliária Infinity, diz que sempre houve oferta grande de apartamentos, mas que o estoque cresceu.
Ele não vê bolha imobiliária, mas admite que alguns imóveis são vendidos a preço menor que o de tabela, principalmente após devoluções. As construtoras reforçaram o relacionamento com corretores. Além do percentual de 5%, premiam quem vende mais, tal qual um programa de milhagem. Cada R$ 100 mil em vendas equivalem a um ponto. Com 30 pontos, o prêmio é um carro econômico. Quem consegue chegar aos 120 mil pontos, leva um Jaguar.