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Orçamento sequestrado, País sem rumo

Por Notas & Informações / O ESTADÃO DE SP

 

A Presidência da República pode se tornar um simples cargo honorífico, com poder de ação bastante limitado, se nada for feito desde já para conter o avanço do Congresso sobre os recursos discricionários do Orçamento da União. Hoje, as emendas parlamentares – orçadas em R$ 50,4 bilhões para 2025 – representam cerca de 25% das despesas não obrigatórias. De acordo com as projeções do governo contidas no Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) 2026, apresentado no dia 15 passado, as emendas chegarão a quase 50% dos gastos livres em 2027 e a quase 100% no ano seguinte. Em 2029, a ser mantido esse ritmo, tamanho será o volume de recursos livres à disposição de deputados e senadores que o Poder Executivo ficará “no vermelho”, incapaz de investir um mísero real em políticas públicas.

 

Essa aberração institucional corrompe a essência do regime presidencialista, é uma afronta à Constituição de 1988. Como se isso não fosse gravíssimo o bastante, sabe-se que o Congresso não tem responsabilidade alguma no manejo das emendas parlamentares. Caso tivesse, por óbvio, não seria tão recalcitrante em criar mecanismos que garantam a transparência na disposição dos recursos públicos e a aferição dos resultados das políticas públicas em tese custeadas por essa dinheirama. Na prática, o que vigora no Brasil é um caso sui generis de parlamentarismo: oportunista, personalista e inimputável. Não tem como este modelo bastardo de governança dar certo, aliás, como não tem dado lá se vão cerca de dez anos.

 

Como mostrou o Estadão, as emendas parlamentares receberam tratamento privilegiado na formulação do PLDO, com um crescimento garantido de volume sem paralelo com nenhuma outra despesa pública. Em 2026, as emendas vão somar R$ 53 bilhões. No ano seguinte, R$ 56,5 bilhões. Já em 2028 serão R$ 58 bilhões à disposição dos parlamentares, quantia que sobe para inacreditáveis R$ 61,7 bilhões em 2029. As emendas individuais e de bancada terão um aumento real de até 2,5% ao ano, de acordo com as regras aprovadas pelo Congresso no ano passado em retaliação à nova rodada de decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) para acabar com o orçamento secreto. Já as emendas de comissão, substitutas das emendas de relator como base do esquema, serão reajustadas pela inflação.

 

Emendas parlamentares são legítimas. Porém, em democracias presidencialistas normais, elas têm uma natureza mais limitada, destinando-se a ajustes pontuais para custeio de políticas muito bem definidas.

 

Não custa lembrar que o Orçamento público é a materialização da democracia representativa. Tão mais forte e vibrante ela será quanto mais eficiente, probo e transparente for o manejo dos recursos dos contribuintes. Do jeito que está, engessado e carcomido pelos cupins da República, que tomam como seus os recursos públicos pela mera conquista de um mandato eletivo, o Orçamento da União é o retrato mais bem acabado dos desafios que a jovem democracia brasileira ainda tem de superar para se consolidar e garantir a todos os cidadãos os bônus políticos, sociais e econômicos que só o regime das liberdades é capaz de oferecer.

 

Se o Congresso, por razões óbvias, não moverá um dedo para mudar este estado de coisas que só o beneficia, esperava-se que ao menos o Poder Executivo estivesse mais engajado na solução de um problema que só o degrada. Mas não há sinais desse engajamento no horizonte próximo. A apresentação do PLDO coube ao secretário de Orçamento Federal, Clayton Luiz Montes, um técnico que se limitou a diagnosticar que, “a partir de 2027, há um comprometimento que precisa ser endereçado e, neste momento, com as projeções apresentadas, ainda não foi endereçado”. É urgente que alguém com poder de mando no governo Lula da Silva venha a público e estimule a sociedade a discutir um plano para reverter o crescimento das emendas como proporção das despesas discricionárias. Disso depende não o futuro do atual governo, mas o do próprio País.

 

O Orçamento público é o reflexo de um projeto de nação. E a imagem que o PLDO 2026 projeta é de uma nação condenada à mediocridade.

 

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