Em revés para o governo, PL se fortalece no Congresso após acordos com Hugo Motta e Alcolumbre
Por Lauriberto Pompeu— Brasília / O GLOBO
Fora de cargos-chavAlcole na cúpula do Congresso, o PL, partido do ex-presidente Jair Bolsonaro, mudou de estratégia e fechou acordos para ampliar sua influência a partir do ano que vem. A legenda de oposição condicionou o apoio aos dois favoritos para comandar as casas legislativas — o senador Davi Alcolumbre (União-AP) e o deputado Hugo Motta (Republicanos-PB) — a ter o posto de vice-presidente, o segundo mais importante na hierarquia. Além disso, a sigla negocia assumir a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, principal colegiado da Casa. A intenção é usar os espaços para avançar com pautas caras ao bolsonarismo.
A preocupação de líderes do PL é não repetir o que ocorreu há dois anos, quando o partido ficou de fora dos principais postos. Na ocasião, a sigla lançou Rogério Marinho (RN) como candidato de oposição a Rodrigo Pacheco (PSD-MG) no Senado e foi excluída dos acordos para ocupação de cargos. Já na Câmara, a estratégia foi ceder espaços a aliados do Centrão para também não acabar isolado do bloco que reelegeu Arthur Lira (PP-AL).
Em entrevista ao GLOBO (leia mais na página 6), Bolsonaro disse que as negociações vão permitir à sigla a ocupação de “dois postos-chave importantíssimos”, em referência à CCJ do Senado e a vice da mesma Casa. — Quando se perde uma eleição (como no caso de Marinho), não tem espaço na Mesa (Diretora) nem em comissões. Se o meu partido quiser convocar um ministro, hoje, não pode convocar porque não tem ninguém presidindo comissão — disse o ex-presidente.
Sem ‘zumbis’
Desta vez, a legenda agiu rápido para evitar ser preterida. No Senado, o PL ignorou a intenção do senador Marcos Pontes (PL-SP) de concorrer e se antecipou ao PT para declarar apoio a Alcolumbre na semana passada. A decisão ocorreu após reunião da bancada com Bolsonaro, que reclamou de o partido ter se tornado uma espécie de “zumbi”, sem participar das decisões.
Com a primeira vice das duas Casas, o partido de Bolsonaro tem o poder de pautar projetos de seu interesse na ausência dos presidentes. No caso da Câmara, o ocupante do posto também é o vice do Congresso e poderá eventualmente conduzir sessões que analisam vetos presidenciais. Caso a negociação avance, o favorito no partido para assumir o cargo de vice no Senado é Eduardo Gomes (PL-TO), que foi líder do governo Bolsonaro no Congresso, mas tem boa interlocução com a base do governo petista e é próximo de Alcolumbre.
Por outro lado, o PL também mira o comando da CCJ no Senado. O partido de Bolsonaro tem a segunda maior bancada, com 14 parlamentares, atrás do PSD, que tem 15.
Alcolumbre sinalizou que o comando da comissão deverá ser entregue ao PSD a partir do ano que vem, mas o PL tenta filiar mais senadores até fevereiro para reivindicar o posto. Tradicionalmente, o partido que tem a maior bancada tem a preferência na escolha das comissões.
— Negociamos com ele (Alcolumbre) que valha o critério da proporcionalidade. Partidos grandes precisam ter maior representatividade na presidência das comissões, o que nos permitirá encaminhar as nossas pautas, dentre outras funções legislativas importantes — disse o líder do PL no Senado, Carlos Portinho (RJ).
A CCJ é importante porque é por onde passam quase todas as propostas analisadas na Casa. Também é a comissão a responsável por sabatinar indicados ao Supremo Tribunal Federal (STF). Hoje, o colegiado é comandado pelo próprio Alcolumbre.
Na Câmara, um dos nomes cotados para vice da Mesa Diretora é o do atual líder do PL, Altineu Côrtes (RJ), da ala mais alinhada ao Centrão e menos ligada ideologicamente ao bolsonarismo. O parlamentar tem mais proximidade com o presidente do partido, Valdemar Costa Neto.
Em 2023, quando Lira foi reeleito no comando da Câmara, o PL cedeu a primeira-vice ao presidente do Republicanos, o deputado Marcos Pereira (SP), ficando com com a segunda vice-presidência. Além disso, apesar de ter a maior bancada da Casa, com 99 deputados, aceitou revezar o comando da CCJ com o PT e outros partidos do Centrão, em um acordo que valeria até 2026, último ano da atual legislatura.
A estratégia da sigla na Câmara também passa pela troca na liderança. Caso o acordo da vice seja confirmado, o PL deverá fazer uma eleição em fevereiro para substituir Altineu no posto. Segundo integrantes da bancada, a ideia é encontrar um nome com perfil mais combativo. A avaliação é que Altineu tem por estilo atuar nos bastidores. O deputado Sóstenes Cavalcante (RJ) é um dos cotados para substituí-lo.
Um dos principais focos dos parlamentares bolsonaristas é aprovar o projeto que concede a anistia os envolvidos nos atos golpistas do 8 de Janeiro. O projeto está em uma comissão especial da Câmara e foi colocado na mesa de negociações por apoio tanto na Câmara quanto no Senado.
Aliados do presidente Luiz Inácio Lula da Silva admitem que a maior influência do PL na Câmara e no Senado preocupa. Para integrantes da base governista, apesar de o cenário ser ruim para o Palácio do Planalto, não há muito o que fazer, uma vez que o partido de oposição conseguiu eleger mais parlamentares em 2022, pleito em que Bolsonaro foi derrotado na tentativa de se reeleger.
Diante disso, a estratégia do PT no Senado e na Câmara também foi a de compor com os candidatos mais fortes nas duas Casas e tentar garantir cargos relevantes para a legenda. Ainda que sejam menores que os do PL, a avaliação é que patrocinar candidaturas rivais traria o risco de deixar os petistas totalmente escanteados dos cargos do Congresso.
— É um problema (o PL ter os principais espaços do Congresso), mas não acho grave. Como o PL tem 90 deputados, não tem outra solução, faz parte. A vida é dura — disse o deputado Zeca Dirceu (PT-PR).
Acomodação dos partidos
O PT negocia com Motta a indicação da primeira-secretaria da Mesa Diretora, cargo que lida com questões administrativas da Casa e funciona como uma espécie de prefeitura da Câmara. Também há conversas para indicar um ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) e a relatoria da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), que define as bases de como o dinheiro público é gasto no ano seguinte.
Já o relator da Lei Orçamentária Anual (LOA), em que todos os gastos do governo são detalhados, deve caber ao MDB, que é da base de Lula. O União Brasil também quer a LOA, mas em vez disso a legenda deve indicar o comando da CCJ da Câmara. Em outra disputa, o PSD quer ter a primeira-vice da Câmara, mas Motta descarta desfazer o acordo com o PL de Bolsonaro.
O líder do PT na Câmara, Odair Cunha (MG), disse que, independentemente do cargo que o partido de Bolsonaro tiver, o governo conseguirá aprovar propostas de seu interesse porque construiu base com outros partidos. — O governo tem base. A gente não tem que ficar preocupado com a opinião da oposição. A oposição está no papel dela, a oposição fala e a base vota, estabelece maioria e pronto — afirmou.
Na atual configuração da Câmara, integrantes do PL puderam atestar a importância de estar bem posicionados. No comando da CCJ, por exemplo, a deputada Caroline de Toni (PL-SC) conseguiu emplacar boa parte da chamada “pauta anti-STF”. Com anuência de parte do Centrão, ela avançou na tramitação de propostas como a que limita sentenças de ministros da Corte e outra que permite a derrubada de decisões da mais alta esfera do Poder Judiciário. No Senado, o partido tem o desejo de avançar com o impeachment de ministros do STF, mas até apoiadores de Bolsonaro admitem que é improvável ir adiante com o assunto no panorama atual.