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O susto da inflação - O ESTADO DE SP

O pior passou, o churrasco está menos caro e os preços se acomodam, mas o susto de 2019 será registrado como mais um destaque na história da inflação. Com alta de 4,31%, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), principal indicador oficial, superou a meta fixada para o ano, de 4,25%. Não foi um desastre, até porque ficou intacto o limite de tolerância, de 5,75%. Mas ficam pelo menos duas lições. Primeira: preços podem sempre surpreender, como nos dois meses finais de 2019. Até outubro ou novembro, poucos apostariam num estouro do chamado centro da meta. Segunda: se ainda se praticasse a indexação ampla e rotineira, como nos tempos da orgia inflacionária, 2020 começaria em condições muito preocupantes. Seria complicado desfazer o impacto de um desajuste – ocasional, é bom acentuar – originado no mercado das carnes. Preços indexados funcionam como cremalheira. A subida é segura e um sistema de travas dificulta o recuo.

Os novos dados do IPCA foram divulgados na sexta-feira pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A variação do IPCA em dezembro, 1,15%, superou a mediana das expectativas (1,08%) coletadas no mercado pelo Broadcast, serviço da Agência Estado.

A disparada final dos preços ocorreu no mercado de carnes, com o aumento das vendas ao mercado chinês, afetado pela peste suína. Criadores e exportadores foram beneficiados e a balança comercial melhorou, mas sobrou uma conta mais pesada para o consumidor nacional. Da carne de boi para outras proteínas o contágio foi rápido e facilitado pela maior demanda típica de fim de ano.

Com alta de 6,37%, os preços do grupo Alimentação e Bebidas foram o principal componente do cenário final da inflação em 2019. Seu impacto, de 1,57 ponto porcentual no conjunto, explica pouco mais de um terço da alta geral de 4,31%.

Durante a maior parte do ano a inflação havia sido puxada pelos preços dependentes direta ou indiretamente da ação oficial, como as tarifas de energia elétrica e do transporte público. O aumento do consumo, ainda contido pelo desemprego, pela renda limitada e pela insegurança das famílias, pouco havia pressionado os preços do varejo. Nos meses finais de 2019, as vendas ao mercado chinês convulsionaram esse quadro.

Como sempre, a aceleração dos preços atormentou principalmente os consumidores de renda mais baixa. O IPCA é baseado no orçamento médio das famílias com renda mensal de até 40 salários mínimos. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) tem como referência o poder de compra das famílias com ganho mensal de 1 a 5 mínimos.

No ano, esse indicador subiu 4,48%, superando o IPCA (4,31%). O grupo mais pobre foi especialmente prejudicado. Sua inflação foi mais alta e, além disso, o custo dos alimentos (com elevação de 6,84%) tem peso maior na composição de seus gastos. Isso torna particularmente difícil e penoso o remanejamento de gastos.

Passado o impacto inicial, os preços começaram a acomodar-se. A tendência é mostrada no Índice de Preços ao Consumidor Semanal (IPC-S) calculado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Na semana encerrada em 7 de janeiro, esse indicador subiu 0,57%. No pior momento, na semana terminada em 15 de dezembro, havia aumentado 0,87%. A partir daí, foi perdendo impulso.

A tendência de recuo da inflação havia sido apontada pelo Banco Central (BC). Novas pressões inflacionárias, por enquanto fora do radar, poderão justificar um aumento de juros básicos nos próximos meses, mas até agora as expectativas são de estabilidade: até o fim de 2020 a taxa básica, a Selic, permanecerá em 4,50%, segundo avaliação do mercado. Também de acordo com o mercado, o IPCA deverá subir 3,60% neste ano, voltando a situar-se abaixo da meta (4%).

Se o crescimento da economia ganhar impulso e propiciar um aumento significativo do emprego, a demanda poderá pressionar mais fortemente os preços. Será uma boa notícia. O BC terá como conter a inflação, se for o caso, mas a inflação associada à prosperidade é ainda um risco distante.

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