Adequação ao cargo é vital para presidente recuperar confiança
A popularidade do presidente da República, Jair Bolsonaro (PSL), segue o roteiro dos ocupantes do cargo ao fim dos simbólicos cem primeiros dias de mandato.
Desde a redemocratização, apenas Itamar Franco, em dezembro de 1992, após o impeachment de Fernando Collor, conseguiu superar a expectativa —muito baixa— que existia em relação ao seu governo.
Todos os outros (não há dado equivalente apenas para o segundo mandato de Lula) apresentam diferenças importantes entre a euforia pós-eleitoral e a avaliação positiva em pouco mais de três meses de gestão.
E no índice de popularidade, calculado pelo Datafolha, o pesselista é o que tem pior desempenho entre os presidentes em um primeiro mandato. Segundo essa métrica, que vai de 0 a 200, Bolsonaro alcança 103 pontos contra 131 de Collor, 151 de Itamar Franco, 142 de Fernando Henrique Cardoso, 162 de Lula e 174 de Dilma Rousseff. Todos em período equivalente.
O atual presidente bate apenas os baixos escores de FHC e Dilma nos cem dias de seus segundos mandatos (74 e 69 pontos, respectivamente).
Pelo histórico, esse período, no geral, marca o fim da “lua de mel” entre parte da opinião pública e os candidatos ungidos pelas urnas. É o tempo em que eleitores passam por uma espécie de desintoxicação de estratégias e mensagens da campanha e se deparam com a política real, por meio de ações concretas do novo governo.
E no caso de Bolsonaro, não faltaram, nos seus cem primeiros dias de mandato, episódios de grande repercussão nas diferentes esferas de composição da opinião púbica —desde aspectos ideológicos, crises políticas, polêmicas na economia e confusão na educação até o questionamento de valores e comportamentos.
Numa primeira leitura, a avaliação reproduz tendências cristalizadas no período eleitoral. É o caso, por exemplo, dos índices de impopularidade do presidente entre as mulheres, especialmente as mais escolarizadas, e entre os moradores do Nordeste, principalmente os mais pobres, onde a taxa dos que consideram o pesselista um presidente ruim ou péssimo supera a média em pelo menos 10 pontos percentuais.
Da mesma forma, constitui herança eleitoral o apoio expressivo dos homens mais escolarizados e mais ricos, segmento em que a aprovação a Bolsonaro alcança percentuais próximos a 50%.
No entanto, chama a atenção o dado de que quase metade de seus eleitores não o considera um presidente ótimo ou bom.
Para entender o fenômeno, o Datafolha aplicou uma análise multivariada sobre as principais perguntas do questionário e por meio de um modelo estatístico de decisão chegou aos aspectos de maior peso sobre o resultado obtido por Bolsonaro em sua primeira avaliação junto aos brasileiros.
A variável que mais explica o quadro não é demográfica, socioeconômica ou geográfica. Tampouco tem correlação direta com a economia, política ou educação. Refere-se, antes de qualquer coisa, à imagem pessoal que o pesselista transmitiu em pouco mais de três meses de governo.
E não se trata de qualidades ou defeitos majoritariamente associados à figura do ex-deputado, como sinceridade ou autoritarismo. O item de maior peso, na verdade, reflete o quanto Bolsonaro se mostrou preparado ou não para o cargo nesse espaço de tempo.
Entrevistados que percebem o pesselista despreparado, indeciso e que concordam com a afirmação de que ele “em nenhuma situação, se comporta como um presidente da República” compõem o nicho que mais o reprova. É um estrato que alcança quase 20% da população.
No extremo oposto, o subconjunto que mais o aprova, também com percentual próximo a 20%, reúne parcela de seus eleitores que, além de julgá-lo preparado para o cargo (e, diferentemente da maioria dos brasileiros, o classificam como defensor dos pobres), baseiam sua opinião na percepção de que Bolsonaro tem feito pelo país ao menos aquilo que esperavam dele.
Essa expectativa —atendida ou não— é a variável que mais divide o segmento dos que votaram no presidente em 2018 e explica o fato de praticamente metade deles não aprovar sua atuação. Nesse estrato, 42% sentem-se frustrados com o que o pesselista apresentou até aqui.
Para conseguir maior apoio da opinião pública e consolidar suas propostas de governo, Bolsonaro deve necessariamente adequar-se ao cargo e mostrar serviço —metade dos brasileiros acha que o pesselista trabalha pouco e é antiquado, imagem muito pior do que a de seus antecessores petistas em período similar.
Paulino é diretor-geral do Datafolha; Janoni é diretor de pesquisas do instituto