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Virar a página e olhar para o futuro

*CARLOS ALBERTO DI FRANCO, O Estado de S.Paulo

09 Abril 2018 | 03h00

Depois de várias semanas de tensão, discussões pouco edificantes transmitidas ao vivo e declarações impróprias de alguns dos seus integrantes, o STF fez o que se esperava: confirmou que ninguém está acima da lei e que o combate à corrupção não admite acordões. A decisão do plenário não poderia ter sido outra. Caso contrário a Corte assinaria um atestado de leniência com o crime e estaria na contramão dos valores éticos de uma sociedade cansada e decepcionada. Criaria instabilidade, acirraria o clima de radicalização, abriria de par em par as portas da impunidade para os criminosos de colarinho branco e pavimentaria uma avenida para os aventureiros que transitam nas sombras da desesperança. Além disso, o STF confrontaria o próprio Judiciário. Vamos pensar, com serenidade e racionalidade, para ver se dá para entender o que aconteceu na frente de todo mundo.

Lula foi condenado a nove anos e meio, num primeiro julgamento, pelo juiz Sergio Moro, uma sentença de 218 páginas. Foram ouvidas 91 testemunhas, 73 apresentadas pela defesa. Tudo dentro da lei e das garantias devidas ao réu. A defesa de Lula apelou da sentença ao TRF-4, em Porto Alegre. Ali foi julgado em 24 de janeiro por três desembargadores, condenado por 3 a 0 e sua pena foi aumentada para 12 anos. Recorreu em seguida à instância superior, o STJ, em Brasília, onde seu pedido foi julgado por cinco ministros. Outra derrota, agora por 5 a 0. Voltou, enfim, ao mesmo TFR-4. Perdeu mais uma. Resumo da ópera: três instâncias e nove juízes se manifestaram num mesmo sentido em relação a Lula. (Escrevi este artigo antes da prisão do ex-presidente decretada pelo juiz Sergio Moro.)

Dizer que seria preciso respeitar a “presunção de inocência” até “prova em contrário”, como frisaram alguns ministros, é fazer piada com a inteligência dos brasileiros. Feita a prova, o réu deixa de ser inocente. Passa a ser culpado. No caso de Lula, a prova foi feita quando a segunda instância decidiu que sua condenação estava fundamentada em fatos. 

O tribunal que tem como missão uniformizar os entendimentos judiciais não poderia ignorar suas próprias decisões e as das demais instâncias. Não obstante o claro empenho de alguns ministros em favor do ex-presidente, como bem lembrou editorial do Estado, a Corte não permitiu que vingasse um casuísmo: a mudança de jurisprudência quanto à possibilidade de prisão após condenação em segunda instância tendo por base um pedido que não poderia ir além da pessoa do condenado Lula da Silva. 

Venceu o bom senso. O momento, no entanto, é preocupante. Políticos, à esquerda e à direita, estão unidos num denominador comum: salvar a própria pele. O infortúnio do cárcere e a perspectiva do ostracismo uniram adversários históricos para combater os inimigos comuns: a Operação Lava Jato e o aparato da Justiça. Tentaram ganhar na 25.ª hora. Queriam que o Supremo Tribunal arrombasse a porteira. Conhecedores da morosidade do Judiciário, que é a causa essencial da perpetuação da injustiça, apostam na loteria viciada dos crimes prescritos. Ladrões do dinheiro público querem sair por cima. Numa boa. Enquanto isso, Lula continuaria percorrendo o Brasil ostentando a máscara de perseguido político.

Participo, amigo leitor, da sua indignação. E também da sua satisfação com a decisão do STF. O Brasil venceu. Sou otimista. Apesar de tudo. Precisamos virar a página e olhar estrategicamente para o futuro. 

Hoje, teoricamente, as eleições são livres, embora o resultado seja bastante previsível. Não se elegem os melhores, mas os que têm mais recursos. Investe-se nos candidatos sem nenhum idealismo. É negócio. Espera-se retorno do investimento. A máquina de fazer dinheiro para perpetuar o poder tem engrenagens bem conhecidas no mundo político: emendas parlamentares, convênios fajutos e licitações com cartas marcadas. E é isso que precisa mudar. O câncer que fustiga o País está no modelo político em vigor desde a Constituição de 1988. Serviu-se Lula de uma estrutura propícia ao aparelhamento do Estado. Armado de seu pragmatismo, foi certeiro na sua política anticidadã. “Se Jesus Cristo viesse cá e Judas tivesse a votação num partido qualquer, Jesus teria de chamar Judas para fazer coalizão” - eis uma pérola do pensamento lulista. O ex-presidente não fez nada para mudar esse quadro. Ao contrário, aprofundou-o e radicalizou. Seu estilo de governança, transmitido com primorosa pedagogia à sua sucessora, fortaleceu o que de pior existia na vida pública brasileira.

Podemos e devemos mudar o quadro. Como? Votando bem, com voto comprometido. Teremos eleições gerais. Executivo e Legislativo serão renovados. Você, leitor e eleitor, não pode encarar a próxima eleição como ordinária administração. Não é. Pode ser decisiva. Transformadora. É uma grande oportunidade. O seu candidato, ao Executivo e ao Legislativo, deve estar claramente comprometido com reformas constitucionais que sejam capazes de devolver o Brasil aos brasileiros. Prisão após condenação em segunda instância é medida indispensável na luta contra a impunidade. Seu candidato deve estar comprometido com projeto de reforma constitucional que faça da medida saneadora princípio intocável. Reforma da Previdência. Reforma tributária. Revisão do tamanho do Estado e do seu papel. 

Chegou a hora de a sociedade civil mostrar a sua cara e a sua força. É preciso, finalmente, cobrar a reforma política. Todos sabem disso. Há décadas. O atual modelo de governança, a perversa fórmula da coalizão, é a principal causa da corrupção. Quanto falta transparência, sobram sombras. O Brasil pode sair deste pântano para um patamar civilizado. Mas para que isso seja feito com a urgência que se impõe é preciso votar bem. O Brasil depende de cada um de nós.

*JORNALISTA. E-MAIL:  O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.

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