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Lula sofre 'nova leva' de desencanto na esquerda com delações da Odebrecht

 

  Nelson Antoine/Agif/Folhapress  
Intelectuais afirmam que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) dividiu a esquerda no país
Intelectuais afirmam que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) dividiu a esquerda no país

Com as acusações de delatores da Odebrecht tornadas públicas na semana passada, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sofre uma nova leva de desencanto entre intelectuais e jornalistas da esquerda. Acadêmicos ouvidos pela reportagem relataram receber enxurradas de textos responsabilizando o ex-presidente pela fragmentação da esquerda no país.

 

Alguns mantêm seus comentários em grupos reservados. Admitem que a defesa de Lula entre intelectuais arrefeceu, embora opinem que ele ainda tem um caminho a percorrer na defesa de direitos do povo. Outros manifestam publicamente a frustração com alguém que tinham em alta conta. "Lula foi o melhor presidente que esse país já teve, sem dúvida, e isso não muda", disse a psicanalista Maria Rita Kehl, simpatizante do PT, que então reconheceu: "É claro que é muito decepcionante que ele tenha sido delatado na Lava Jato".

 

Para ela, a frustração é com "a pessoa" do Lula –"ele não era uma pessoa tão bacana e tão íntegra". Mas não com o governante –"não muda que ele tenha feito um governo espetacular, o primeiro principalmente", afirmou. "A decepção é muito maior com alguém de quem você esperou tanto, que prometeu tanto. Aí não adianta ele invocar 'mas eu fiz tanto por esse país'. Justamente porque fez tanto por esse país, não era para ter nada contra ele."

 

Outro lulista, o jornalista Paulo Henrique Amorim, em seu site, "Conversa Afiada", afirmou que o conteúdo das delações "macula de forma profunda a imagem de um líder popular digno de ser eleito presidente em 2018". "Os Odebrecht revelaram que o presidente Lula mantinha com a empreiteira, notória subornadora, uma relação promíscua, que tinha por objetivo obter vantagens indevidas de um ex-presidente da República com a responsabilidade histórica de Lula", afirmou Amorim.

 

Ele disse, ainda assim, que a Lava Jato é formada por "justiceiros" que perseguem o petista politicamente.

 

DELAÇÕES

Os delatores afirmaram que a Odebrecht pagou mesadas ao irmão do ex-presidente, ajudou o seu filho a impulsionar a carreira e reformou um sítio como presente ao ex-presidente, entre outras menções, em troca do apoio do petista em questões de interesse da empresa no governo e fora do país.

 

Em uma das passagens de sua delação, o patriarca do grupo, Emílio Odebrecht, relatou ter dito a Lula que o "pessoal dele estava com a 'goela muito grande'". "Estavam passando de 'jacaré para crocodilo'", afirmou. Emílio disse que parte dos recursos era repassada via caixa dois.

 

A assessoria do ex-presidente rebate, uma a uma, as acusações. Afirma que os depoimentos "estão sendo manipulados para falsificar a história do governo Lula". "Insistem em tratar como crime, ou favorecimento, políticas públicas de governo voltadas para o desenvolvimento do país e aprovadas pela população em quatro eleições presidenciais."

 

A assessoria do petista afirmou que o ex-presidente nunca pediu valor indevido à Odebrecht.

 

PRECEDENTES

Não é a primeira vez que intelectuais e militantes de esquerda expressam desencanto com o ex-presidente. No mensalão, alianças com empresários e concessões políticas em troca de governabilidade fizeram fundadores do PT deixarem o partido e defensores de Lula abandonarem seus postos.

 

Desta vez, a alegada contradição entre discurso e prática foi a gota d'água.

 

"A classe produtiva faz parte da sociedade e é preciso sempre saber lidar com ela. Mas é duro de engolir, para um cidadão de esquerda, a aproximação excessiva de Lula com a Odebrecht e seu dono. O mesmo Lula que denuncia, com tanta propriedade, o egoísmo e a ganância de nossas elites. Por acaso a Odebrecht não faz parte da elite?", questionou a jornalista Cynara Menezes, em seu blog "Socialista Morena".

 

Como ela, o economista Luiz Gonzaga Belluzzo diz que Lula não se beneficiou pessoalmente. "Eu conheço o Lula, nunca vi ele levar vantagem pessoal. Mas é claro que se envolveu nos negócios do Estado e das empresas, porque elas têm uma relação muito próxima do Estado, como FHC, como todos, porque é uma coisa complicada."

 

Para ele, as delações revelam "um processo agudo, amplo e inadequado: as empresas invadiram o Estado".

 

Como relatou o colunista da Folha Clóvis Rossi, o linguista americano Noam Chomsky fez críticas à esquerda latinoamericana e especificamente a brasileira. "É simplesmente doloroso ver que o Partido dos Trabalhadores no Brasil ""que implantou medidas significativas"" simplesmente não pôde manter as mãos fora da caixa registradora. Juntaram-se à elite extremamente corrupta", afirmou, ao programa "Democracy Now".

 

Chomsky defendeu "forças que sejam honestas o suficiente para desenvolver programas decentes sem roubar o público ao mesmo tempo". (THAIS BILENKY)  FOLHA DE SP

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