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Cármen Lúcia e os presídios

A presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ministra Cármen Lúcia Rocha, passou a inspecionar, sem anunciar previamente, as unidades mais problemáticas do sistema prisional brasileiro. A primeira visita-surpresa foi em três estabelecimentos penais do Estado do Rio Grande do Norte.

A inspeção deu-se dias após a eclosão de duas rebeliões nas penitenciárias de Rondônia e de Roraima, com um saldo de 18 mortos, e da fuga de 55 presos do Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico de Franco da Rocha. Enquanto a presidente do STF e do CNJ dialogava com juízes das varas de execuções penais do Rio Grande do Norte, em Porto Alegre a Brigada Militar, devido à superlotação nos presídios do Rio Grande do Sul, mantinha cinco suspeitos presos dentro de quatro viaturas estacionadas em frente a uma delegacia de polícia. Em Aracaju, um preso foi agredido e, depois, queimado, dentro de um complexo penitenciário.

Tanto nos estabelecimentos penais visitados pela ministra quanto nas rebeliões de Porto Velho, Boa Vista e Franco da Rocha e nas carceragens do Rio Grande do Sul e de Sergipe, a realidade é a mesma. As celas estão abarrotadas, os equipamentos de segurança estão sucateados e as instalações estão degradadas, não oferecendo condições mínimas para o cumprimento de pena com dignidade e com programas de ressocialização. Além disso, alguns desses estabelecimentos sofreram danos causados por motins, no ano passado, e os governos estaduais até hoje não investiram na sua recuperação. Isso significa que os direitos mais elementares dos presos não estão sendo respeitados.

Esse cenário trágico é, infelizmente, conhecido há décadas. Entre 2000 e 2014, o número de presos passou de 90 mil para mais de 607 mil, segundo as estatísticas do Ministério da Justiça. No mesmo período o número de mulheres presas aumentou 567%, por causa do tráfico de drogas. Na atual década, o número de novos presos tem registrado um crescimento médio de 7%. E como os Estados e a União não têm investido o suficiente, as 1,3 mil unidades que compõem o sistema prisional têm, atualmente, um déficit de mais de 240 mil vagas. Em média, os estabelecimentos penais têm 1,6 preso por vaga. Mas, em 25% deles, há mais de 2 presos por vaga. Na Penitenciária Estadual de Parnamirim, uma das três inspecionadas pela presidente do STF e do CNJ, a ala masculina foi projetada para 290 presos e abriga mais de 540.

Pelas estimativas do Ministério da Justiça, se o ritmo de prisões e condenações for mantido, o Brasil – que tem a quarta maior população encarcerada do mundo, ficando atrás somente dos Estados Unidos, da Rússia e da China – terá cerca de 1 milhão de presos em 2022. Atualmente, há 500 mil mandados de prisão expedidos e não cumpridos. De cada 10 presos, 4 são provisórios, aguardando o julgamento de seus processos. Em 84% dos presídios, os presos provisórios convivem com presos condenados, o que é um dos fatores responsáveis pelo aumento da violência. A taxa de reincidência é de 70%. Cerca de 56% dos presos são jovens, com 18 a 29 anos. Em relação aos crimes, 14% cometeram homicídio; 21%, roubo; e 27% envolveram-se com o narcotráfico.

Nas visitas-surpresa que pretende realizar aos presídios de todos os Estados, a ministra Cármen Lúcia já conhece de antemão as casas de horrores em que eles se converteram. Sua presença em cada uma delas, contudo, tem o efeito simbólico de chamar a atenção da sociedade e das autoridades públicas para a necessidade de melhoria dos padrões de gestão do sistema prisional, de desenvolvimento de formas mais eficazes de reinserção de ex-presidiários na vida social e de mudanças nos meios forenses, para aumentar a aplicação de penas alternativas. O maior problema do desafio da superação do caos carcerário é a falta de determinação política dos governantes. A visita da presidente do STF e do CNJ a cada estabelecimento penal é uma forma de lembrá-los disso. O ESTADO DE SP

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