O que cabe ao prefeito
Por Notas & Informações / O ESTADÃO DE SP
O Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) impôs uma derrota ao prefeito Ricardo Nunes (MDB) ao decidir que o seu decreto que proíbe o serviço de mototáxi na capital é inconstitucional. Cúpula do Judiciário paulista, o colegiado composto por 25 desembargadores ordenou, por unanimidade, que a Prefeitura regulamente em até 90 dias essa modalidade de transporte oferecida por aplicativos. Os magistrados afirmaram ainda que compete à União, e não aos municípios, legislar sobre a matéria, além de considerarem o veto a esse serviço uma afronta aos princípios constitucionais da livre iniciativa e da livre concorrência. Em bom português, o recado foi para que Nunes pare de gastar energia com uma causa perdida e passe a se ocupar do que de fato é de sua competência.
Nunes ganhou, assim, um tempo razoável para respeitar a legislação federal e a Constituição, cumprir a ordem judicial e, sobretudo, trabalhar no que importa para os paulistanos, a começar por desistir de interpor recursos contra a decisão do TJ-SP e, enfim, liberar o serviço de mototáxi na cidade. Já é sabido que há demanda da população por esse tipo de serviço, principalmente na periferia, onde a falta de segurança e a precariedade do transporte coletivo estimulam esse modelo de negócio. Prova da insatisfação dos passageiros com o transporte coletivo é a mais recente Pesquisa Origem e Destino, do Metrô, que mostrou que os deslocamentos individuais, com 51,2% do total, voltaram a superar, após duas décadas, os feitos por transporte público (48,8%).
Logo, além de se dedicar para melhorar o sistema de ônibus da capital paulista, com a oferta de um serviço confortável, pontual, seguro e eficiente, o prefeito tem a tarefa de estabelecer uma regulamentação dos mototáxis com regras bem definidas, boas condições de atendimento à população, exigência de documentação, equipamentos básicos de segurança e fiscalização. Mas, para isso, Nunes terá de deixar para trás o discurso populista de combate à “indústria da multa” ao qual recorreu durante a eleição e passar a punir, com mais autuações, os maus motociclistas que, ao cometerem tantos abusos pelas ruas da metrópole, colocam sua vida e a de terceiros em risco.
Desde quando baixou o decreto, no começo de 2023, Nunes argumenta que esse serviço oferecido pelos aplicativos é perigoso para passageiros e condutores. Em entrevista recente à TV Globo, o prefeito deu a entender que houve “despreocupação” dos desembargadores “com os acidentes, com as mortes, com os óbitos”, sem citar que, mesmo com a proibição das mototáxis, o número de mortes de motociclistas na cidade cresceu nos últimos anos. De acordo com dados da ferramenta Infosiga, que compila dados do trânsito no Estado de São Paulo, foram 401 óbitos em 2023 e 483 em 2024. A proibição por si só não parece ter sido capaz de conter o avanço da letalidade do trânsito. Se o prefeito está mesmo preocupado com esse quadro – e não há razão para duvidar disso –, é hora, então, de tomar providências concretas, melhorando o transporte coletivo, para desestimular o uso de transporte individual, e apertando a fiscalização sobre motociclistas irresponsáveis.