Ajuda do 'CV', compra de votos e ameaças: Justiça cassa mandato de Braguinha em Santa Quitéria (CE)
O prefeito Braguinha (PSB) e o vice-prefeito Gardel Padeiro (PP), de Santa Quitéria, no Ceará, tiveram seus diplomas cassados pela 54ª Zona Eleitoral do Ceará nessa quarta-feira (7) por abuso de poder político e econômico. Devem ser realizadas eleições suplementares para as funções, após trânsito em julgado. Eles são acusados de receber ajuda da facção criminosa Comando Vermelho (CV) para as práticas de compra de votos, inclusive, com a doação de entorpecentes a potenciais eleitores e de ameaças a adversários políticos e seus apoiadores, segundo as investigações. Há indícios de que o método também tenha sido adotado nas eleições de 2020.
Ao longo de 90 páginas, o juiz Magno Gomes de Oliveira fundamentou sua decisão. Por meio de nota, a defesa de Braguinha disse ver o desdobramento "com tranquilidade". Ressaltou, ainda, que recorrerá da sentença em instâncias superiores da Justiça Eleitoral.
"A defesa mantém plena confiança na Justiça Eleitoral e acredita, com firmeza, na improcedência das acusações que motivaram o pedido de cassação. Por fim, destacamos que todas as medidas cabíveis já estão sendo adotadas para a salvaguarda dos direitos políticos do prefeito reeleito, na certeza de que a verdade e a justiça prevalecerão", completou.
A dupla ainda foi declarada inelegível por oito anos, pena também aplicada à suplente de vereadora Kylvia de Lima (PP) e aos ex-servidores da Prefeitura Francisco Leandro Farias de Mesquita e Francisco Edineudo de Lima Ferreira, que teriam ajudado no esquema. A defesa dos citados não foi localizada pela reportagem.
Além das repercussões políticas, em abril, o Tribunal Regional Eleitoral do Ceará (TRE-CE) aceitou uma ação penal com o mesmo assunto e com mais dois réus. A Corte também afastou o prefeito e o vice dos seus cargos, que sequer chegaram a assumir em 1º de janeiro deste ano devido a mandado judicial.
Na ocasião, Braguinha foi preso prestes a assumir a Prefeitura, que passou a ser ocupada pelo seu filho, Joel Barroso (PSB), presidente da Câmara Municipal. Na linha de sucessão, em caso de vacância, é o chefe do Legislativo quem assume o Executivo.
Apesar disso, naquele julgamento, a Justiça Eleitoral validou o pedido de revogação da prisão domiciliar de Braguinha, que havia sido deliberado em 18 de março. A defesa do político havia apresentado relatório médico nos autos indicando ser necessário tratamento médico.
Entenda o processo
O juiz Magno Oliveira pontuou que, mesmo sendo impossível quantificar o número de eleitores expulsos de Santa Quitéria antes do dia do pleito, "é necessário reconhecer que a obstrução criminosa de um único eleitor já seria apta a viciar o resultado das urnas". Para ele, "o direito ao exercício do livre sufrágio em Santa Quitéria restou sepultado a partir de incontáveis condutas de ameaças, coações e expulsões de eleitores, notadamente aqueles residentes em bairros como a Piracicaba e Pereiros".
A ação julgada foi ajuizada pelo Ministério Público Eleitoral (MPE) em dezembro do ano passado. Entre outras informações, a procuradoria citou depoimento de Tomás Figueiredo (MDB), adversário de Braguinha, relatando a dificuldade, desde a primeira semana da campanha, de realizar seus eventos e de visitar eleitores, além das ameaças feitas por membros do CV a auxiliares da sua campanha.
"O prejuízo à normalidade das eleições municipais em 2024 foi de tamanha gravidade que até a Justiça Eleitoral foi atacada, tanto que em meados de setembro, o Cartório Eleitoral recebeu ligação de um integrante do Comando Vermelho, que se dirigiu a um dos servidores ameaçando atacar a unidade do órgão e matar todos, caso a Justiça não 'parasse' com as decisões contra os 'manos' do CV, conforme Termo de Oitiva do servidor e Chefe do Cartório Eleitoral desta 54ª Zona Eleitoral", lembrou na sentença.
Além da investigação no âmbito do MPE, há inquérito instaurado na Polícia Federal (PF) para apurar as denúncias. Assim, a PF chegou a Daniel Claudino Sousa, o "DA30", enviado pelo alto comando do CV do Rio de Janeiro a Santa Quitéria para ameaçar candidatos e eleitores.
"A organização criminosa adotou a estratégia de demonstrar claramente ser contra o TOMÁS e prejudicar a candidatura deste, mas não deixar transparecer o apoio ao candidato JOSÉ BRAGA BARROZO, a fim de, obviamente, não levantar suspeitas, nem prejudicar o candidato que eles pretendiam beneficiar, sendo certo que em várias conversas do grupo, os integrantes do CV mencionavam o candidato a prefeito com a sigla 'BG'", apontou ainda.