Busque abaixo o que você precisa!

A Lei das Estatais empaca no STF

O ESTADÃO DE SP

 

O pedido de vista do ministro Kassio Nunes Marques interrompeu, mais uma vez, o julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a constitucionalidade das restrições impostas na Lei das Estatais a nomeações para a alta administração de empresas públicas. O colegiado começou a julgar a questão em março, duas semanas depois da liminar do então ministro Ricardo Lewandowski, hoje aposentado, que suspendeu temporariamente os efeitos da lei, em atendimento a uma ação movida pelo PCdoB.

 

Em primeiro lugar, a ação deveria ter sido rejeitada de pronto pelo STF, por ser inepta, claramente movida por inconformados derrotados em votação no Congresso. Isso não só não aconteceu, como o ministro Lewandowski decidiu suspender a lei numa canetada – abrindo uma janela preciosa para uma nova farra de nomeações políticas. Quando o Supremo afinal resolveu julgar o caso, o ministro André Mendonça fez um pedido de vista. Pelas normas do STF, o julgamento deveria ter sido reiniciado, no máximo, 90 dias depois, no fim de junho, mas foi retomado apenas agora, em dezembro, com o voto divergente de Mendonça.

 

Foi a vez, então, de Nunes Marques requerer o processo para exame. Tem até março para devolvê-lo.

 

De vista em vista, a medida “emergencial” – o que é, no fim das contas, o caráter básico de uma liminar – de Lewandowski caminha para completar um ano, permitindo ao governo descumprir um dos principais instrumentos de governança corporativa da Lei das Estatais. A liminar em si já é uma barbaridade; a demora do Supremo em analisá-la, ainda mais acintosa.

 

A Lei 13.303, conhecida como Lei das Estatais, foi promulgada em 2016 com o objetivo específico de moralizar a nomeação de dirigentes e membros do Conselho de Administração das empresas públicas. Àquela altura, diretamente atingidas por denúncias de corrupção e uso político, as estatais, tendo à frente Petrobras, Eletrobras e suas controladas, atravessavam uma série crise de depreciação.

 

As exigências impostas pela nova legislação aprovada pelo Congresso, de tão elementares, deveriam estar implícitas em qualquer critério de escolha desde sempre. Ficavam proibidas as nomeações de ministros, secretários estaduais e municipais, dirigentes de partidos políticos e sindicatos, parlamentares, diretores de órgãos reguladores ligados à empresa e funcionários de assessoramento superior da administração pública.

 

A profissionalização dos Conselhos de Administração – instância máxima das decisões estratégicas das empresas – é uma medida largamente adotada no mundo. Há cursos específicos de especialização em boa governança. Quanto mais independente o Conselho de Administração – obviamente composto por pessoas habilitadas e com profundo conhecimento do setor e da empresa que assessoram –, mais isentas se mostrarão as decisões tomadas. No Brasil, contudo, sucessivas gestões federais acostumaram-se a transformar esses conselhos e os cargos de diretoria em moeda de troca e exercício de ingerência política.

 

Em gestões petistas passadas, a prática foi levada a um notório aparelhamento. Foi exatamente esse fenômeno que suscitou a criação da lei para blindar as companhias, que são do Estado, e não do grupo político cujo presidente exerce por um determinado tempo sua gestão. Administradores investidos no cargo com o propósito principal, se não único, de seguir a orientação dos governantes causam graves e, às vezes, irreversíveis prejuízos às empresas que representam. Investimentos despropositados e financiamentos a projetos governamentais são os problemas mais comuns.

 

Como se não bastasse o interesse político e ideológico, indicações dessa natureza servem muitas vezes apenas para garantir ao apaniguado um mero complemento salarial, pois há casos de indicados que não têm a menor afinidade com esse ou com qualquer outro trabalho. Além de escancarar um profundo desprezo pelo cargo de conselheiro administrativo, essas indicações são também um grande risco para a empresa, ainda que o indicado seja bem-intencionado. É essa distorção grave que o governo quer perpetuar – e cujo impedimento o STF insiste em adiar.

Compartilhar Conteúdo

444