Nunes Marques tira prerrogativas da CPMI ao suspender quebra de sigilo de Silvinei Vasques
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Míriam Leitão / O GLOBO O ministro Kassio Nunes Marques, do STF, determinou a suspensão da quebra dos sigilos fiscal, bancário, telefônico e telemático do ex-chefe da Polícia Rodoviária Federal, Silvinei Vasques, requerida pela CPMI dos atos golpistas.O que o ministro fez foi cassar uma prerrogativa que qualquer CPMI possui. Entre os poderes de uma comissão parlamentar de inquérito está a investigação e, portanto, essa quebra de sigilo foi feita dentro da lei.
Entre os vários argumentos do ministro, destaco um, que é o seguinte: "Não há situação concreta relacionada ao impetrante que legitime suspeita de que teria cometido ilícitos ligados aos eventos de 8 de janeiro."
Mas Silvinei Vasques é investigado e foi preso sob a acusação de usar a Polícia Rodoviária Federal para tentar impedir o voto do eleitor do Nordeste. Portanto, há sim muitas suspeitas de ilícitos sobre o ex-diretor geral da PRF, e a CPMI tem direito de investigar.
Qualquer pessoa que entende do cenário brasileiro sabe que o 8 de janeiro não foi um raio em um céu azul. A relatora Eliziane Gama afirmou desde o começo que a comissão não analisaria os ataques à democracia da data como um único dia, independente de todos os outros, como se tivesse ocorrido por acaso. O 8 de janeiro teve ligação com toda a programação feita para um golpe de estado.
Em outra decisão bastante discutível, Nunes Marques permitiu no mês passado que Marília Ferreira Alencar, ex-subsecretária de Inteligência da Secretaria de Segurança Pública do DF, sequer comparecesse à CPMI. O direito de não formar provas contra si mesmo é constitucional, e daí vêm o fato de que parte dos convocados pela comissão, amparados por decisões do Supremo, não respondam a perguntas que considerem incriminatórias.
Mas permitir o não comparecimento é uma cassação dos direitos da CPMI. Agora, o ministro foi além e revogou a quebra de sigilo, em um desrespeito ao funcionamento da comissão parlamentar de inquérito. Isso entra em uma área de conflito entre poderes muito concreta, e o Senado vai recorrer.
Hoje, o empresário Argino Bedin, que emprestou carros para fazer bloqueio de vias, ficou em silêncio durante depoimento à comissão. Teve direito a isso porque obteve o reconhecimento desse direito constitucional no Supremo. É curioso como pessoas que atentaram diretamente contra a democracia, que queriam suprimir esses direitos buscam esses mesmos direitos constitucionais quando estão em apuros.
Ao pedir o AI-5, os golpistas queriam cassar instrumentos como o habeas corpus, que foram eliminados durante a ditadura. Agora, recorrem ao Supremo em busca da proteção dado pela Constituição que gostariam de ter rasgado.