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Toffoli fugiu de sessão que podia manter prisões

Josias de Souza

04/04/2019 12h03

ToffoliBrunoSantosFolha

Dias Toffoli, o presidente do Supremo, adiou por prazo indeterminado o julgamento das ações contra a jurisprudência que autorizou a prisão de larápios condenados em duas instâncias do Judiciário. A decisão tem a aparência de uma fuga, pois as chances de Toffoli amargar uma derrota eram reais. Farejava-se uma vitória da tranca. Em vigor desde 2016, a regra que permitiu o encarceramento de Lula deveria prevalecer no plenário da Suprema Corte pelo placar de 6 a 5.

O voto decisivo seria o da ministra Rosa Weber. Criminalistas que estudaram seus votos ruminavam o receio de que ela atuasse contra uma reviravolta, votando a favor da preservação de uma regra que já foi objeto de quatro deliberações do Supremo. Em todas elas a Suprema Corte decidiu, por maioria de votos, que a prisão em segunda instância não afronta o princípio constitucional da presunção de inocência.

Rosa Weber foi voto vencido. Integrou a minoria favorável à tese de que os condenados têm o direito de recorrer em liberdade até o trânsito em julgado dos processos, quando se esgotam as possibilidades de recurso. A despeito disso, a ministra vem respeitando a decisão da maioria ao julgar pedidos de habeas corpus.

Rosa Weber manteve a coerência também quando votou, no ano passado, contra o pedido de Lula para não ser preso. Foi graças ao seu voto que Sergio Moro, então juiz da Lava Jato, conseguiu expedir o mandado de prisão do líder máximo do PT. Moro, aliás, havia atuado no Supremo como juiz auxiliar de Rosa na época do julgamento do mensalão.

Na votação do habeas corpus de Lula, a prisão em segunda instância prevaleceu por 6 votos a 5. Ao votar contra o pedido do ex-presidente petista, Rosa Weber frustrou os partidários da política de celas abertas. Deixou várias indicações de que não considera adequado modificar uma jurisprudência recente do Supremo, fixada de forma tão reiterada. Ela realçou a necessidade de oferecer segurança jurídica.

Num trecho do seu voto, Rosa declarou: "A imprevisibilidade por si só qualifica-se como elemento capaz de degenerar o Direito em arbítrio. Por isso aqui já afirmei, mais de uma vez, que compreendido o tribunal, no caso o Supremo Tribunal Federal, como instituição, a simples mudança de composição não constitui fator suficiente para legitimar a alteração da jurisprudência."

Na contramão do posicionamento de Rosa, o ministro Gilmar Mendes, que votara a favor da prisão em segundo grau, voltou atrás. Sem mencionar o nome do colega, a magistrada acrescentou em seu voto que a mudança conjuntural da opinião de ministros também não é suficiente para mudar a jurisprudência.

Rosa citou o filósofo do Direito Frederick Schauer, professor da Universidade de Virgínia, nos Estados Unidos: "Espera-se que um tribunal resolva as questões da mesma maneira que ele decidiu no passado, ainda que os membros do tribunal tenham sido alterados ou se os membros dos tribunais tenham mudado de opinião'."

A ministra evocou também Neil Markovitz, professor da universidade escocesa de Edimburgo, "para quem fidelidade ao Estado de Direito requer que se evite qualquer variação frívola no padrão decisória de um juiz ou tribunal para outro." Acrescentou que o vaivém em curto período de tempo produz indesejável incerteza: "A consistência e a coerência no desenvolvimento judicial do Direito são virtudes do sistema normativo enquanto virtude do próprio Estado de Direito."

Rosa Weber prosseguiu: "As instituições do Estado devem proteger os cidadãos de incertezas desnecessárias referentes aos seus direitos. Embora a jurisprudência comporte obviamente evolução, porque, insisto, a vida é dinâmica, a sociedade avança, o patamar civilizatório se eleva, é o que pelo menos se deseja, e o Direito segue, a atualização do Direito operada pela via judicial, pela atividade hermenêutica dos juízes e tribunais, há de evitar rupturas bruscas e ser justificada adequadamente."

Ou seja, era grande, muito grande, gigantesca a chance de Rosa Weber votar contra a posição de Dias Toffoli, que advoga a necessidade de protelar a prisão dos condenados pelo menos até o julgamento dos recursos no Superior Tribunal de Justiça (STJ), a terceira instância do Judiciário.

Assim, a pretexto de atender a um inusitado pedido de adiamento formulado pela OAB, autora de um dos três recursos contra as prisões antecipadas, Dias Toffoli, ex-advogado-geral da União no governo Lula, protagoniza um movimento muito parecido com uma fuga. Sob a presidência de Toffoli, o Supremo atravessa uma quadra fúnebre.

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