Uma boa hora para ignorar Lula
Fez bem aos ouvidos de todo brasileiro pensante um pequeno trecho de um discurso da presidente Dilma Rousseff na quinta-feira, dia 21. A presidente inaugurava um trecho de uma via no Recife, quando apresentou as metas mais amplas de seu governo. “Nosso objetivo, neste momento, é reequilibrar o orçamento do país, reduzir a inflação e reconstruir a capacidade de investimento público e privado”, afirmou. Dilma foi não apenas correta ao listar as prioridades, como extremamente precisa na ordem em que as enunciou. Ela e seu antecessor, Luiz Inácio Lula da Silva, deveriam ter percebido que essas três frentes de trabalho não são encrencas a resolver durante crises. São basilares para qualquer economia funcional. Exigem dedicação contínua da administração pública. A dupla de presidentes ignorou isso até que o país afundasse na crise atual.
A combinação de orçamento desequilibrado e investimento deficiente impede que o país tenha, por enquanto, qualquer perspectiva de crescimento. Os analistas mais otimistas acreditam apenas que o fundo do poço já esteja à vista. Os mais pessimistas duvidam até disso e alertam que ainda afundaremos muito até 2017. O cidadão comum sente o impacto da crise, principalmente, por dois números: a inflação, que chegou a 10,7% em 2015 (muito acima dos 6,4% do ano anterior), e o desemprego, que chegou a 9% no trimestre encerrado em outubro. No ano passado, o país fechou 1,5 milhão de vagas, o pior resultado em 24 anos.
Ao menos no discurso, Dilma indicou o roteiro exato para sair da crise. Contas públicas em ordem são fundamentais para que a inflação caia, e esses dois fatores juntos são indispensáveis para que o investimento retorne. Só esse encadeamento virtuoso resultará em crescimento e mais e melhores empregos no futuro.
A presidente fará bem em ignorar o diagnóstico antediluviano apresentado por seu antecessor, Lula, na mesma quinta-feira. Lula acertou ao apontar que Dilma fez promessas de campanha enganosas. Mas, a partir dessa premissa correta, concluiu que a presidente errou ao tentar agradar ao “mercado”, em vez de atender às demandas do que chamou de “nossa gente”, com um receituário familiar – mais crédito para o consumo e mais linhas de financiamento especiais, a despeito do pouco avanço no ajuste das contas públicas. O ex-presidente parece acreditar que seja possível melhorar a vida do brasileiro mais pobre sem atentar para os fundamentos de uma economia saudável. Que Dilma resista e não retorne ao que nos colocou na crise. ÉPOCA