Previdência já consome sete vezes mais que a Saúde. Em 2025, pode chegar a dez vezes
BRASÍLIA, RIO e SÃO PAULO - Em trajetória crescente, as despesas previdenciárias abocanham, hoje, 56,8% do Orçamento da União e vão atingir R$ 735,5 bilhões este ano. Para se ter uma ideia do espaço que é tomado por esses desembolsos, o número é sete vezes maior do que o governo gasta com saúde (excluindo folha de pagamento), R$ 103,8 bilhões. Ele também é 23 vezes maior do que as despesas com benefícios assistenciais, incluindo o programa Bolsa Família, de R$ 30,8 bilhões. Os números foram apresentados ontem pelo ministro do Planejamento, Dyogo Oliveira, em encontro com investidores chineses no qual ele fez uma defesa da reforma da Previdência.
— Basicamente, estamos gastando 57% do Orçamento federal com Previdência. Apenas os gastos com o regime geral (R$ 560 bilhões) subiram cerca de R$ 50 bilhões este ano e representam duas vezes o investimento público. Tem algo muito errado nas nossas contas, que é o fato de que estamos colocando o dinheiro para pagar aposentado e não para investir. Disso decorre grande parte dos problemas de infraestrutura que nós temos — disse o ministro.
O economista Leonardo Rolim, consultor do Orçamento da Câmara dos Deputados na área de Previdência, estima que aposentadorias e pensões devem consumir dez vezes mais que a Saúde em 2025, se nenhuma reforma for feita:
— Os gastos com saúde não vão cair. Pela lei do teto de gastos, vai se manter nesse piso e ser reajustado pela inflação. Mas essas despesas precisavam aumentar, porque a população está envelhecendo e demandando mais assistência.
Benefícios desiguais
Rolim estima que as despesas com Previdência devem crescer perto de 3% ao ano, descontada a inflação. Considerando o projeto original de reforma do governo, a despesa subiria pouco. Com as mudanças já feitas no substitutivo na Câmara, as despesas devem crescer cerca de 1% ao ano: — Atualmente, destinamos para a saúde metade do que a Europa gasta e quase a mesma coisa no caso da Previdência.
Oliveira lembrou que, no caso da Previdência, o governo quer resolver algumas assimetrias. Como exemplo citou que o déficit na previdência dos trabalhadores do setor privado é de R$ 185 bilhões e contempla 70 milhões de beneficiários. Já a dos servidores públicos tem déficit de R$ 30 bilhões, mas para um milhão de servidores aposentados.
O ministro também fez um paralelo entre quanto a equipe econômica tem nas mãos para fazer investimentos no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) — R$ 26,7 bilhões ou 2,1% das despesas primárias da União — e quanto tem de pagar em benefícios.
Enquanto os investimentos do PAC despencaram de 2016 para 2017 de R$ 42 bilhões para R$ 26,7 bilhões, as despesas previdenciárias totais subiram R$ 67,8 bilhões. O segundo maior gasto do Orçamento é com folha de pagamento, que chegará a R$ 162,4 bilhões e também teve aumento de 2016 para este ano: R$ 15,3 bilhões.
Segundo Oliveira, o governo precisa fazer um ajuste fiscal de 5% do Produto Interno Bruto (PIB) nos próximos dez anos. Isso significa sair de um déficit primário de 2,5% do PIB para um superávit de 2,5%:
— Este é o tamanho do trabalho que o Brasil precisa fazer nos próximos dez anos.
O economista Raul Velloso, especialista em contas públicas, calculou o peso da Previdência na economia em 50 anos:
— Atualmente, os benefícios consomem perto de 11% do PIB e devem chegar a 22% em 50 anos. Essa diferença de gastos em relação à Saúde só vai aumentar.
Rolim calcula que a Previdência deve representar 82% da despesa primária em 2025. Atualmente, equivale a 56,8%:
— Estão contra a reforma para defender privilegiados como eu, funcionário público. Não faz sentido.
Maia defende manutenção do texto
O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, também defendeu a reforma da Previdência, que está na lista de prioridades do governo para a agenda do Congresso após a votação da denúncia contra o presidente Michel Temer. Meirelles disse esperar que o conjunto de reformas seja votado este ano. Perguntado se vai aceitar mudar ainda mais o projeto da Previdência, que já foi aprovado em comissão especial da Câmara, Meirelles afirmou defender a manutenção do texto. No entanto, admitiu que o governo pode ter de fazer concessões e lutar para aprovar o que for possível:
— Defendemos a manutenção do projeto como está hoje no relatório aprovado na comissão especial, mas, como já mencionou o presidente (Temer), vamos estar discutindo democraticamente e fazendo aquilo que é possível. Mas sempre alertando a todos para uma realidade que é factual, objetiva. Quanto mais perto do projeto como está hoje for aprovada a reforma da Previdência, mais tempo vamos passar no Brasil sem discutir a Previdência.
Em entrevista à CBN, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, também defendeu a votação do texto aprovado na comissão:
— O Brasil chegou a uma situação, com a questão fiscal e o déficit previdenciário, que, se tivermos um pouco de bom senso e maturidade, vamos votar no mínimo o texto que foi aprovado na comissão, porque não adianta fazer uma reforma da Previdência menor do que isso. Não vai resolver o problema dos brasileiros, pois o déficit continuará aumentando.
O secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Eduardo Guardia, disse que o governo quer ainda avançar na reforma tributária, mas que antes é necessário tratar da Previdência. Segundo ele, sem isso, o governo ficaria sob a pressão constante para o aumento do gasto público, impulsionado pelas despesas previdenciárias. O GLOBO