Em São Paulo, modelo se mostra eficiente
São Paulo - O modelo de organizações sociais na gestão da saúde está presente em todas as regiões do país, embora não tenha chegado à maioria dos estados. Criadas em 1998 pelo governo Fernando Henrique Cardoso, as OSs entraram em prática pela primeira vez no estado de São Paulo, naquele mesmo ano. De lá para cá, outros 12 estados adotaram esse tipo de administração para tentar diminuir a burocracia do setor público. Mas a participação dessas entidades na rede de saúde varia de um estado para outro.
Este tipo de gestão consiste na contratação de entidades privadas sem fins lucrativos com reconhecimento de prestação de serviços na saúde. Elas têm atuado preferencialmente em hospitais, prontos-atendimentos, prontos-socorros, maternidades e centros de especialidades. Cabe às organizações contratar funcionários, comprar insumos e equipamentos e gerenciar a rotina de atendimento.
No Rio, unidades de referência
Goiás tem a maior participação de OSs. Todas as unidades de saúde foram entregues para organizações sociais no estado do Centro-Oeste. Desde 2002, elas administram hospitais, maternidades, prontos-socorros e clínicas de especialidades médicas que, antes, estavam sob a gestão direta do governo estadual. Com esses contratos, o estado gastou, em 2015, 42% do orçamento da Saúde (R$ 785 milhões).
No Rio, as OSs são responsáveis pelo atendimento em UPAs, hospitais de emergência e unidades de referência no estado como o Instituto do Cérebro e o Hospital da Criança. Já Santa Catarina aparece como um dos estados com menor presença de OSs (21%). Entre os serviços repassados, está o Serviço Móvel de Urgência (SAMU).
Pioneiro na adoção do modelo, São Paulo começou com cinco hospitais repassados a OSs em 1998. Hoje, são um total de 107 unidades. Além de 40 hospitais, as entidades também cuidam de ambulatórios de especialidades, centros de reabilitação e centros de análises clínicas e de diagnóstico por imagem.
Um estudo do Banco Mundial de 2005, que mediu a eficiência das OSs em comparação com o sistema exclusivamente público, apontou resultados favoráveis ao novo modelo. Segundo a pesquisa, nas unidades comandadas por OSs o número de altas médicas foi maior, e o de óbitos, menor. A quantidade de altas apenas em cirurgias foi 61% mais alto.
Gestão é do poder público
Em nota, o ministério assinalou que a contratação de organizações sociais de saúde é uma prerrogativa que o gestor local possui, como ente autônomo e com respaldo em legislações.
“A Constituição brasileira, quando criou o SUS, e a Lei 8080, quando regulamentou sua gestão, definiu que o SUS é constituído por uma rede hierarquizada e regionalizada de saúde, mas que é permitido à iniciativa privada ter serviços de saúde. Assim, uma organização social é uma entidade que presta serviço público não estatal. É importante destacar que os gestores podem terceirizar a contratação de pessoas, mas não a gestão do sistema, regulação e fiscalização, que são responsabilidades indelegáveis", afirmou o texto.
O Ministério da Saúde informou também que hospitais administrados por OSs recebem repasses da pasta, mas disse não possuir dados em relação aos valores. Isso porque o dinheiro é enviado aos estados e municípios, e são esses que realizam os repasses. Além disso, o ministério informou que não usa as OSs para gerir unidades de saúde próprias.
Custos iguais, resultados melhores
Na avaliação do governo paulista, as OSs são responsáveis por cerca de metade da rede estadual. Para o coordenador de gestão de contratos da Secretaria Estadual de Saúde, Eduardo Ribeiro Adriano, o custo das organizações sociais é parecido com o da administração direta, embora os resultados sejam melhores. Para ele, não é uma terceirização.
— O modelo é excelente. Ele traz mais flexibilidade para contratações e compras de insumos. São Paulo já tem uma maturidade. São 18 anos de organizações sociais. Talvez essa falta de maturidade possa trazer dificuldades para outros estados que estão implementando o sistema agora — afirma Adriano.
Por esse modelo, os estados continuam responsáveis por traçar a política pública de Saúde e fiscalizar o cumprimento das metas pelas OSs. É nessa função que muitas administrações ainda pecam, ao fazer um controle frouxo. Uma precária fiscalização permite a ocorrência de fraudes, como superfaturamento e desvio de recursos.
Entidades civis estão em alta
Levantamento feito em 2014 pelo Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), e divulgado no ano seguinte, mostra que as secretarias estaduais ainda tinham sistema centralizado para gerir as unidades de saúde. Entre as que descentralizaram os serviços, o modelo mais utilizado é o autárquico, com a criação de entidades ligadas às secretarias. Mas parcerias com entidades civis, como é o caso das organizações sociais (OSs), também já estavam em alta.
O levantamento mostrou que, em outubro de 2014, foram utilizados cinco modelos diferentes. Havia 96 parcerias com organizações sociais, cinco com organizações da sociedade civil de interesse público (Oscips) e uma com serviços sociais autônomos (SSA). Há ainda duas parcerias público-privadas (PPPs) e 35 convênios ou contratos.
“É notório que a qualificação de organizações sociais tem sido a mais utilizada pelas secretarias estaduais de saúde, com destaque para os estados de Rio Grande do Sul, São Paulo, Rio de Janeiro e Bahia, que apresentam o maior número de parcerias celebradas. Destaque-se, ainda, que algumas dessas entidades parceiras têm mais de um contrato de gestão celebrado com a Secretaria estadual de Saúde", diz trecho do relatório do Conass.
Propostas de mudanças
O Conselho defende que há necessidade urgente de garantir a segurança jurídica desse modelo de gerência dos serviços de saúde. Aponta também que, apesar dessas parcerias, a centralização ainda era a marca da maioria das secretarias. Nove delas, inclusive, concentravam todas os serviços de saúde na administração direta, sem sequer usar autarquias e fundações vinculadas.
O levantamento abrange as 27 secretarias, mas é parcial. Apenas 17 responderam as perguntas enviadas pelo Conass para o levantamento. Os dados das outras dez secretarias — entre elas algumas de estados importantes, como São Paulo, Rio de Janeiro e Paraná — foram obtidas de seus sites na internet e podem estar incompletas. Já o Conselho Nacional das Secretarias Municipais de Saúde (Conasems) informou não ter levantamento sobre contratos com organizações sociais firmados pelas prefeituras.
O marco legal que rege o trabalho das organizações sociais é a Lei 9.637, de 1998. Há pelo menos três projetos de lei tramitando na Câmara dos Deputados e um no Senado para tentar alterar a norma. Outros três projetos na Câmara não mexem na lei, mas trazem mudanças para as regras que as organizações sociais devem seguir.
Procurado pelo GLOBO, o Ministério da Saúde não fez avaliação positiva ou negativa do modelo. Acrescentou apenas que a lei garante aos gestores locais a contratação de organizações sociais.