RIO - Alvo de investigações da Polícia Federal e do Tribunal de Contas da União, o BNDES apresenta nesta terça-feira seu “Livro verde: nossa história como ela é”, uma compilação de dados e explicações sobre a atuação do banco, com foco no período de 2001 a 2016. A
versão preliminar do livro mostra que a JBS, dos irmãos Wesley Joesley Batista, abocanhou a maior fatia do apoio financeiro do banco ao setor de carnes. Dos R$ 31,2 bilhões desembolsados pelo BNDES para os frigoríficos entre os anos 2005 e 2016, a empresa ficou com 38% do total, considerando também o Bertin, que se fundiu à JBS. O grupo BRF ficou com 16%, seguido pela Marfrig/Seara, com 14%. A Seara foi comprada pela JBS do Marfrig em 2013.
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Os R$ 31,2 bilhões consideram duas modalidades de apoio do banco. Via financiamentos foram R$ 18,8 bilhões. Os R$ 12,4 bilhões restantes são de operações de mercados de capitais, por meio da BNDESPar, braço de participações da instituição. Somados, JBS e Bertim receberam R$ 8,1 bilhões da BNDESPar ou 65% do apoio da subsidiária do banco ao setor de carnes naquele período. Como resultado, as receitas da JBS saltaram de R$ 4 bilhões em 2005, início do processo de internacionalização da companhia, para R$ 170 bilhões em 2016.
Apoio do BNDES ao setor de carnes
Maiores clientes de 2001 a 2016
Hoje, a empresa busca se desfazer de ativos para reduzir seu endividamento. Paralelamente, outras empresas do grupo, chamado J&F, estão à venda com destaque para a Alpargatas, vendida esta semana para a dona do Itaú. O intuito é levantar recursos para pagar a multa bilionária acertada com a Procuradoria na delação premiada de executivos da J&F, na qual os irmãos Batista admitem pagamento de propina a políticos para obter favorecimento.
No livro, o BNDES justifica o apoio à JBS com a estratégia do governo passado de incentivar o setor de Proteína Animal, "com objetivo de consolidar o Brasil como o maior exportador mundial de proteína animal e fazer do complexo carnes o principal setor exportador do agronegócio brasileiro". O banco ressalta ainda que entre 2005 e 2016 foram apoiadas mais de 17 mil unidades produtoras do setor no Brasil e que as operações de mercado de capitais envolvendo a JBS renderam ganhos de R$ 5 bilhões ao BNDES, considerando dividendos, prêmios e outros.
Considerando apenas financiamentos, o grupo J&F aparece na 19ª posição no ranking dos 50 maiores clientes do BNDES entre 2001 e 2006. O grupo contratou R$ 14,9 bilhões em empréstimos no período. O primeiro lugar é ocupado pela Petrobras, com R$ 128,5 bilhões, seguida pela Embraer (R$ 85,9 bilhçoes) e a Odebrecht (R$ 51,7 bilhões), investigada pela Lava-Jato.
O livro foi uma promessa do novo presidente do BNDES, Paulo Rabello de Castro, quando tomou posse em 1 de junho. O documento, com 212 páginas, é uma verdadeira defesa da atuação do banco no fomento ao desenvolvimento do país, a começar pelo título da apresentação escrita pelo próprio Rabello de Castro: "65 anos de integridade e aplicação". O BNDES fez 65 anos este ano.
O banco nega que tenha promovido a formação de campeões nacionais, uma das críticas à gestão de Luciano Coutinho (2007-2016). Diz que "o apoio ao fortalecimento e internacionalização de grupos empresariais não implicou a escolha discricionária de alguns poucos e privilegiados campeões, menos ainda de campeões nacionais. E ressalta que "o número de empresas apoiadas que apresentam boa situação patrimonial e reputação é muito superior ao número de grupos nacionais com problemas econômico-financeiros ou denúncias relacionadas a atos de corrupção".
Numa clara referência à operadora de telefonia Oi, considerada por muitos um exemplo de campeão nacional, o BNDES diz que "não toma decisões de forma isolada do sistema financeiro". Ele cita a recuperação judicial de um grupo do setor de telecomunicações, com dívidas de R$ 64 bilhões - montante devido pela Oi - , e frisa que a dívida está dividida entre instituições internacionais como o Bank of New York Mellon (R$ 18 bilhões) e instituições bancárias brasileiras, que representam 22% da dívida da empresa. O BNDES é credor da OI, com R$ 33,3 bilhões a receber. O GLOBO