Quem vai sair?
Na tarde da segunda-feira 24, ministros não escondiam o descontentamento com a forma com que a presidente Dilma Rousseff comunicou uma possível redução de dez ministérios. “É muita trapalhada. Conseguiram transformar o que poderia ser uma agenda positiva, com forte apelo popular, em mais munição para a oposição”, disse à ISTOÉ um dos ministros com gabinete bem próximo ao Palácio do Planalto. Do outro lado da Esplanada, outro ministro afirmou: “Quem quer realmente promover uma reforma administrativa não faz dessa maneira. É muita falta de habilidade”. Na reunião, o anúncio feito por Dilma surpreendeu a maior parte dos participantes. A presidente afirmou que iria eliminar dez pastas até o final de setembro. Diante do espanto geral, Dilma afirmou que todos seriam consultados e chamados para contribuir na elaboração dos cortes. Não houve nenhuma outra discussão sobre o tema, não foi falado absolutamente nada sobre a formação de um grupo para coordenar a reforma e sequer se esboçou um debate sobre as implicações políticas que a medida poderá trazer para o governo. Terminada reunião, a maior parte dos presentes ficou ainda mais estupefata quando encontrou o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, anunciando em entrevista coletiva a reforma administrativa que mal fora discutida. No próprio Ministério do Planejamento a notícia preocupou parte do corpo técnico. “Desse jeito será difícil fazer qualquer coisa. Depois desse anúncio atabalhoado, nossa principal tarefa para os próximos trinta dias será a de segurar todo o tipo de pressão dos partidos e dos líderes do governo e da base aliada”, disse um dos auxiliares de Barbosa. “Nessas horas, os interesses pessoais e corporativos acabam falando alto e muitas vezes se contrapõem a qualquer decisão técnica”, afirmou.
Também entre os líderes petistas o comportamento da presidente foi visto como desastroso. Foi o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva quem aconselhou Dilma a reduzir o número de ministérios. Em uma conversa que manteve com a presidente há cerca de 15 dias, Lula fez a sugestão, dizendo que tal medida seria uma sinalização ao PIB de que o governo está fazendo sua parte e não apenas aumentando impostos, encarecendo o crédito e reduzindo o investimento. Ao mesmo tempo, disse o ex-presidente, a medida tiraria força do discurso oposicionista, que diuturnamente aponta o dedo para o elevado número de ministérios e para o aparelhamento da máquina pública promovido pelo PT nos últimos 12 anos. “O conselho dado por Lula é correto. Mas da forma como a presidente conduziu isso, vamos conseguir quebrar todos os ovos e não fazer nenhuma omelete”, afirmou na noite da segunda-feira 24 um dos líderes do PT no Congresso, que pediu para não ser identificado. A promessa de redução dos ministérios veio acompanhada de outra, neste caso, risível: o corte de apenas mil cargos comissionados, de um total de 22 mil. Em 2007, eles somavam pouco mais de seis mil. Contraditoriamente, Dilma acertou no fim da semana passada a liberação de mais verbas para a base aliada.
A decisão de acabar com dez ministérios – mais um factóide marqueteiro do que qualquer outra coisa – aumenta o clima de fim de feira no governo. Ministros de pastas que podem desaparecer não sabem se devem ou não dar continuidade aos trabalhos e empenhar recursos orçamentários até a presidente decidir o que fazer de sua administração. Nas redes sociais, a decisão de reduzir dez ministérios foi recebida como mais uma incoerência da campanha da presidente. Durante as eleições, Dilma disse que eliminar ministérios era uma “cegueira tecnocrática” e considerou um “escândalo” a proposta aventada pelos adversários de acabar com as pastas da Igualdade Racial e das Mulheres, exatamente o que ela está fazendo agora. “Estão querendo tirar o ministério da Igualdade Racial e das Mulheres. Isso é um escândalo”, afirmou. “Será que ela pensou que o eleitor sofre de falta de memória?”, indaga o senador do PDT, Cristovam Buarque.
Entre os partidos aliados, as mais contundentes críticas a respeito da decisão de Dilma partem do PT. Os cortes ministeriais, principalmente nas secretarias com status de ministério, devem deixar o PT sem dezenas de cargos de relevo na estrutura do governo. Pastas como Igualdade Racial, Direitos Humanos e Secretaria das Mulheres tendem a ser absorvidas por um ministério da área social ou pela Secretaria-Geral da Presidência. O Ministério da Agricultura também pode absorver o Ministério da Pesca. Já os Transportes podem virar um superministério da Infra-Estrutura, que incorporaria a Aviação Civil e a Secretaria de Portos. “Não posso dizer quem está marcado para morrer porque eu não tenho certeza, primeiro, se vai morrer”, afirmou Dilma Rousseff em entrevista concedida no início da semana. O governo não sabe responder nem mesmo quanto conseguirá economizar com a medida. Nem um síndico de prédio seria capaz de fazer tanta lambança administrativa.
Fotos: Sergio Lima Folhapress; ROBERTO CASTRO/Agência ISTOÉ