Crise de estados permite avanço no saneamento
Caso exemplar de como uma crise pode impulsionar soluções é a decisão de governos estaduais de privatizar empresas de saneamento básico, uma forma de melhorar o caixa neste momento de aperto fiscal. E tudo ficou mais fácil porque, no governo Temer, o BNDES, de longa quilometragem de atuação em programas de privatização, abriu as portas para governadores.
Até a semana passada, 18 estados haviam procurado a presidente do banco, Maria Sílvia Bastos Marques, e seis editais estão adiantados — Pernambuco, Pará, Maranhão, Amapá, Sergipe e Alagoas. A maior das empresas a serem licitadas, a Cedae, do Rio de Janeiro, num primeiro momento não foi incluída nesta rodada — supõe-se que por pressões políticas e corporativistas. Mas o agravamento da situação financeira do estado forçará o Palácio Guanabara a ceder a empresa para a privatização, uma das contrapartidas exigidas pelo governo federal para resgatar o Tesouro fluminense. Tudo para o bem da população do Estado do Rio de Janeiro.
Não há argumentos consistentes contra a entrada de grupos privados na atividade. Ao contrário. Niterói, por exemplo, onde há tempos opera uma concessão privada, está em 12º lugar no ranking do Instituto Trata Brasil sobre qualidade de saneamento, numa relação de cem cidades. O Rio, em que atua a Cedae, com exceção da Zona Oeste, fica em 50º.
Cidades do Grande Rio dependentes da Cedae estão mal colocadas: São Gonçalo (89º), Caxias (91º), Nova Iguaçu (92º) e São João Meriti (93º). Este quadro tem relação direta com as péssimas condições da Baía de Guanabara. A empresa pública fluminense atende a 64 municípios no estado. Da população total, apenas 38,8% estavam, em 2015, ligados à rede de esgoto, e 86,9% eram abastecidos de água, de acordo com informações da própria empresa.
O fato é que a Cedae cumpre programas infindáveis de investimentos sem resultados visíveis no prazo que a população precisa. Resulta que, no Brasil como um todo, e não apenas no Rio, os índices de abastecimento de água e de coleta e tratamento de esgoto são indigentes, se considerarmos que se trata de uma das dez economias do mundo. Revelam estatísticas do Ministério das Cidades que, em 2015, mais da metade das residências abastecidas de água (50,3%) passaram, enfim, a estar conectadas a redes de coleta de esgoto. Mas ainda é uma cobertura acanhada.
Já no quesito esgoto tratado, o índice subiu, de 2014 para 2015, de 40,8% para 42,7%. Desanimador e preocupante, levando-se em conta o que isso significa para a saúde de grande parte da população, a de renda e extratos sociais mais baixos.
O objetivo do Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab) é universalizar os serviços de água e esgoto até 2033. Seria necessário um investimento anual, médio, de R$ 19,8 bilhões. Algo inalcançável, devido à crise. Sem considerar os problemas de gestão das estatais. O GLOBO