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Dá para olhar para a frente? - O ESTADO DE SP

O impeachment de Dilma Rousseff, mais do que encerrar um período sombrio da história política do País, deveria marcar o início de um tempo de esperança na definição e construção dos caminhos que poderiam levar o Brasil à pacificação política necessária à construção de seu futuro. Essas esperanças, no entanto, podem ter sido frustradas pela maracutaia que senadores, presididos pelo presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Ricardo Lewandowski, engendraram para livrar levas de políticos objetos de investigações policiais e processos criminais da perda de direitos políticos que acompanha a condenação, seja ela por algum juízo, seja pelo Congresso Nacional.

Na hora da união, criou-se a cizânia. O presidente Michel Temer, agora efetivado no Palácio do Planalto, poderá não ter condições, diante do quadro de descalabro político e moral criado na quarta-feira – mas certamente concebido e amadurecido há tempos –, de inspirar uma aliança de partidos comprometidos com o interesse público, e não com a indecente maracutaia que impuseram às pessoas de bem deste país. E, sem essa aliança, não se vencerá sequer a primeira etapa do esforço de recuperação nacional. Ou seja, a discussão e adoção de medidas, muitas delas duras e impopulares, mas todas absolutamente indispensáveis ao saneamento das finanças públicas e que são pré-requisito para a retomada do crescimento.

Pode-se estar perdendo o momento de deixar para trás um passado ignóbil e de projetar para o Brasil um futuro generoso e próspero pelo qual anseiam os brasileiros submetidos a tantos anos de incompetência e corrupção. Certos políticos não podem trair a responsabilidade que assumiram quando buscaram seus mandatos representativos, de repartir com a sociedade, em posição de liderança, a condução dos negócios nacionais.

O presidente Michel Temer cumpriu parte do que lhe competia, até o momento. Deu as garantias possíveis de que não cultiva pretensões eleitorais, o que deveria acalmar aliados. Demonstra agora a coragem política necessária para enfrentar questões delicadas, complexas e, sobretudo, impopulares, como a reforma da Previdência. Essa, como outras reformas de caráter reestruturante, tende a exigir a revisão de direitos sociais, para adequá-los à realidade fiscal. Nesse processo, são poucos os interesses políticos consagrados que escapam ilesos.

Essa questão influi, necessariamente, no comportamento da base parlamentar do governo e na aprovação pelo Congresso das medidas econômicas que a gravidade da crise impõe. Depois de uma malograda experiência populista, será necessário que Michel Temer tenha efetivamente a coragem de usar o poder de que agora dispõe por inteiro para convencer o Parlamento a aprovar projetos de reconhecido interesse nacional.

Também indissociável desse quadro é a necessidade de manter o combate à corrupção simbolizado pela Operação Lava Jato. No círculo governamental mais próximo de Temer se encontram políticos que são objeto de investigação e o presidente já foi obrigado a afastar alguns deles, por compreensível precaução política e respeito à imagem pública de sua equipe. A maracutaia da manutenção dos direitos políticos de Dilma Rousseff abre precedentes perigosos. A partir de agora, mais do que nunca, Temer terá de ser extremamente rigoroso no sentido de garantir à Lava Jato a liberdade e o apoio que, de resto, ela própria já conquistou junto à opinião pública.

Terá, também, de rever parte de sua equipe de governo, sobretudo para que ela tenha a indispensável união de propósitos e de ação e para que a participação na administração federal de certas figuras não pareça à opinião pública como um aval a hábitos que a população abomina.

Michel Temer tem legitimidade constitucional para liderar o esforço de recuperação nacional. Seu grande desafio será mostrar-se à altura dessa responsabilidade e assim conquistar o apoio popular que ainda não tem. O Brasil precisa muito disso.

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