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Moradia social sob suspeita

Por Notas & Informações / O ESTADÃO DE SP

 

 

Bastaram poucos dias para que o número de construtoras notificadas pela Prefeitura de São Paulo sob suspeita de desvirtuar um incentivo fiscal criado para beneficiar a moradia de baixa renda começasse a crescer. Já são ao menos 11 empreendimentos erguidos em regiões valorizadas da cidade que teriam recebido isenções de impostos para a habitação social e que acabaram sendo vendidos a quem poderia pagar bem mais por eles.

 

As punições, no entanto, só começaram a ser aplicadas após o Ministério Público do Estado de São Paulo (MP-SP) entrar no caso por meio de uma ação civil pública alegando irregularidades. Desde então, a Prefeitura já aplicou mais de R$ 30 milhões em multas, e as construtoras passaram a receber avisos de novas sanções.

 

De acordo com a Promotoria da Habitação, empreendimentos em bairros como Pinheiros, Lapa e Itaim Bibi, entre outros, receberam incentivos construtivos e fiscais para a chamada habitação de interesse social (HIS). Criada para beneficiar famílias com renda de até seis salários mínimos, a política pública tem proporcionado a aquisição das unidades por compradores de renda elevada – e, em alguns casos, com mais de R$ 1 milhão em bens.

 

São em sua maioria apartamentos de 20 ou 30 metros quadrados em bairros onde, não raro, o metro quadrado chega a R$ 20 mil. Como percebeu o MP-SP, mas não a Prefeitura, é de se perguntar que família de baixa renda pode viver bem em um espaço tão pequeno e tão caro.

 

Para a Promotoria da Habitação, trata-se de “fake HIS” – em que empresas aderem ao programa de moradia social apenas para melhorar sua imagem pública. Após solicitar a notificação de cartórios, o MP-SP recebeu mais de 560 casos suspeitos – e os dados se referem a um período de apenas dois meses do ano passado.

 

A promotoria pediu à Justiça a suspensão da concessão dos benefícios sob o argumento de que há “negligência” da Prefeitura na fiscalização. E parece haver mesmo. De agosto de 2019 a outubro de 2024, 446,5 mil unidades foram beneficiadas, mas a Prefeitura não sabe o número total de imóveis contemplados por incentivos nos cinco anos anteriores. Ora, não se faz política pública sem dados, mensuração dos resultados e avaliações recorrentes.

 

As empresas, por óbvio, negam quaisquer irregularidades. Argumentam, ainda, que os proprietários se comprometeram a alugar as unidades a inquilinos de baixa renda, como se promessas como essa bastassem.

 

É do interesse de todos que iniciativas para estimular a ocupação de toda a cidade por todas as classes sociais prosperem para reduzir disparidades por meio de políticas habitacionais. Com isso, a população de baixa renda ajuda a adensar a metrópole e consegue acessar a infraestrutura urbana, como corredores de ônibus e metrô.

 

Já faz uma década que São Paulo concede esse benefício a fim de ajudar a reduzir o déficit habitacional. E o cenário tão turvo mostra como uma política pública com muito potencial pode ser facilmente desvirtuada. Esse desleixo mostra que o MP-SP tem razão ao pedir a suspensão do incentivo. Talvez assim a gestão Ricardo Nunes coloque a casa em ordem.

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