A reunião que não discutiu o Brasil
Por Notas & Informações / o estadão de sp
Aos olhos do governo, o maior problema do País hoje não é a política fiscal, que realimenta a inflação, exige taxas de juros elevadas e contém o crescimento da economia. Não é a prevalência da fome, que nem mesmo um orçamento de mais de R$ 170 bilhões para o Bolsa Família foi capaz de resolver. Não é uma educação de baixa qualidade, incapaz de oferecer a qualificação necessária para os trabalhadores conquistarem bons empregos. Não é a enorme sensação de insegurança que a população das regiões metropolitanas vivencia em seu dia a dia. Não é a miséria da população de rua desabrigada nos centros das capitais.
O maior problema do País, para Lula da Silva, são as eleições municipais. O tema, aparentemente, dominou os debates durante a reunião ministerial da última quinta-feira, que durou mais de sete horas. É o que se depreende das declarações dadas pelo ministro da Casa Civil, Rui Costa, após o evento.
O presidente, segundo o ministro, proibiu seus auxiliares de subir em palanques de candidatos que critiquem o Executivo, e cobrou deles que não deixem qualquer ataque sem resposta. Recomendou que – ora vejam – cumpram a lei e não participem de comícios realizados em horário de trabalho. Pediu que não agridam adversários, em especial aqueles que fazem parte de partidos da base aliada. Bater, segundo relatos, “só da cintura para cima”.
O balanço das ações do governo, supostamente o motivo que ensejou a realização da reunião da equipe ministerial, ficou em segundo plano perante outros assuntos muito mais importantes. Do contrário, cada ministro não teria tido apenas 5 minutos para falar sobre as questões de sua pasta, com tolerância de até 15 segundos, sinalizada por meio de um sutil apito.
Conceder mais tempo a cada um deles não seria de grande valia. Nada que os ministros pudessem falar seria capaz de alterar a percepção distorcida do presidente sobre o triunfo de seu governo. Para Lula da Silva, tudo vai muito bem, obrigado, tanto que ele descartou a possibilidade de realizar uma reforma ministerial nos próximos meses para substituir quem não tenha feito um bom trabalho ou traga mais ônus que bônus ao governo. “Em time que está ganhando a gente não mexe”, disse.
Prioritário mesmo, para Lula da Silva, era relatar à equipe que vai devolver o relógio de ouro da marca Cartier que ganhou durante seu primeiro mandato. Tal decisão não expressa convicção sobre o que é certo ou errado, mas visa apenas a diferenciá-lo de Jair Bolsonaro – que, a exemplo de Lula da Silva, só pensa em eleger aliados para o comando dos municípios, mas não tem pudor de se apropriar de patrimônio que deveria ser público para seu proveito pessoal.
Não foi uma reunião para rever escolhas ou realinhar estratégias que favoreçam o País. A essa altura, já se sabe que não há, nunca houve nem haverá um projeto de Brasil no governo petista. Em 2022, o único objetivo era vencer Bolsonaro. Agora, o que importa é obter o melhor resultado possível nas disputas municipais em outubro, com o cuidado de não causar constrangimentos que possam reverberar nas eleições para o comando da Câmara e do Senado, no início do ano que vem, e, assim, pavimentar o caminho para a reeleição de Lula da Silva em 2026.
Aliados certamente vão comparar a reunião ministerial desta semana com aquelas que Bolsonaro liderava, que mais se assemelhavam a um show de horrores. Manter o decoro, no entanto, é pouco para um país que precisa adotar medidas duras para que possa oferecer alguma perspectiva para seus cidadãos.
Impressiona, embora não surpreenda, que as eleições sejam o único horizonte a guiar as ações do presidente. Há muito a ser feito, mas Lula da Silva não parece preocupado com o País. Seu plano é manter tudo como está, pois “o time está ganhando”. Quando tem “ideias”, servem somente para reeditar os erros que já foram cometidos pelos governos petistas no passado e apostar todas as suas fichas em manter a polarização que marcou a campanha de 2022 na tentativa de se perpetuar no poder.
Lamentavelmente, o futuro do País não estava na pauta da reunião ministerial, embora esse fosse o único tema que deveria estar.