São Paulo mostra a Brasília como fazer ajuste de gastos
EDITORIAL DE O GLOBO
O plano do governo de São Paulo ainda é incipiente, mas o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) já merece crédito pela determinação em buscar maior eficiência nos gastos e na gestão pública. O contraste com as ações do governo federal não poderia ser maior. Em Brasília, muito se fala sobre monitoramento e avaliação de políticas públicas. De concreto, porém, nada acontece. Em São Paulo, Tarcísio ordenou a revisão de incentivos fiscais, contratos, despesas correntes, políticas de pessoal e a reestruturação das agências reguladoras. Como o plano ainda está em estágio embrionário e depende do Legislativo, é impossível prever se terá sucesso. É inegável, de todo modo, que é uma decisão sensata.
A máquina estatal brasileira, nos três níveis de governo, é pródiga em ineficiência. Incentivos fiscais são concedidos sem nenhum acompanhamento dos resultados. Quando dão errado, o desperdício continua, com variações da justificativa “sempre fizemos assim”. Algumas áreas do governo têm mais funcionários que o necessário, enquanto outras sofrem com escassez crônica. Agências reguladoras são capturadas por interesses políticos ou pelas empresas que deveriam vigiar. O resultado é uma burocracia cara, que entrega pouco ao contribuinte.
Por ordem de Tarcísio, todos os órgãos da administração direta no Estado de São Paulo terão 90 dias para apresentar um plano de redução de despesas e revisão de contratos. Em 30 dias, a Casa Civil precisará elaborar um anteprojeto para reestruturar as agências reguladoras, reforçando sua autonomia. Até dezembro, serão avaliados perto de 250 benefícios, equivalentes a R$ 56 bilhões em incentivos fiscais de ICMS, resquícios da guerra fiscal. “Há benefícios dos anos 1990 que não fazem mais sentido, porque o mundo mudou, e a história industrial mudou”, diz o secretário da Fazenda e Planejamento, Samuel Kinoshita. “Há os que ficaram anacrônicos e há também os que não respondem ao melhor interesse de São Paulo.”
No início do ano, o governo estadual examinou 64 incentivos baseados em convênios do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), que somavam R$ 4 bilhões em renúncia fiscal. Desses, 23 foram cortados e seis renovados por poucos meses para que se tenha mais tempo de análise. Noutra frente, o decreto assinado por Tarcísio prevê a renegociação da dívida do estado com a União. A expectativa é uma redução de R$ 4 bilhões na despesa anual, com a mudança do indexador. Pela regra atual, o montante é corrigido pela inflação mais 4%. Tarcísio defende inflação mais 2%. Pelas estimativas iniciais, a troca do indexador e as revisões dos incentivos poderão liberar algo em torno de R$ 20 bilhões anuais para investimento.
Por certo, a máquina estatal paulista tem muita despesa inútil a cortar. O foco de quem busca a eficiência da gestão pública, porém, não deve ser meramente arrecadatório. É preciso avaliar, de modo objetivo, a eficácia de cada política. Por isso causa preocupação a proposta do governo paulista que permite corte no repasse anual à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), um dos pilares de programas de ciência e inovação no país. Sem dúvida o Brasil precisa de um Estado de São Paulo com uma máquina pública mais eficaz. Nesse ímpeto, Tarcísio só não pode jogar fora políticas públicas de resultado comprovado.