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Obras paradas, tarifas defasadas e falta de dinheiro: o cenário das concessões de rodovias no Brasil

Por Luiz Araújo / O ESTADÃO DE SP

 

BRASÍLIA - O Ministério dos Transportes está administrando um quadro conflitante sobre parte das atuais concessões rodoviárias do País. Ao mesmo tempo em que precisa se programar para a possibilidade de relicitar seis concessões — que totalizam oito leilões —, a pasta aguarda o resultado da tentativa de repactuação de contratos com as mesmas administradoras.

 

Para analistas, as incertezas dificultam o planejamento de interessados nos ativos, aumentando riscos de leilões desertos. O ministro dos Transportes, Renan Filho, avalia que o cenário é favorável, mas diz que, em último caso, as rodovias podem ficar sob gestão temporária do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit).

 

Atualmente, o País tem 23 concessionárias com contratos vigentes e, conforme o Ministério dos Transportes, há identificação de queixas de desequilíbrios contratuais em 16. Os problemas incluem atraso em obras, defasagem das tarifas e a falta de recursos para o cumprimento de obrigações previstas nas licitações.

 

Cinco contratos referentes a sete trechos de rodoviais podem ser relicitados a pedido das próprias administradoras, sendo elas: Autopista Fluminense (BR-101/RJ), Concebra (BR-060, BR-153 e BR-262 DF/GO/ MG), Concer (BR-040/MG/RJ), ECO101 (BR-101/ES/BA), MS VIA (BR-163/MS). A Concebra, que teve o projeto reformulado, terá um único contrato dividido em três se for para relicitação, com diferentes leilões.

 

No ano passado, o governo solicitou ao Tribunal de Contas da União (TCU) a autorização para firmar acordos com as concessionárias para evitar as relicitações. Na avaliação do Executivo, esse caminho acelera investimentos na malha rodoviária.

 

Ao todo, 14 concessionárias solicitaram repactuações, incluindo cinco das seis que já haviam pedido para deixar a gestão dos ativos, com exceção da Via 040, que agora tem relicitação certa. Para as demais, o mercado terá de se programar duplamente, conciliando a possibilidade de os ativos irem ou não a leilão, o que será definido após avaliação do Ministério dos Transportes e depois do TCU.

 

Em processo mais avançado, as propostas de repactuação da Autopista Fluminense, ECO101, MS Via e Via Bahia já estão sendo analisadas pelo TCU. Isso significa que o governo e essas concessionárias já alinharam propostas para otimizar os contratos, o que pode incluir retirada de obrigações, aumento de tarifas de pedágio e maior tempo de exploração dos ativos.

 

Agora, o tribunal avaliará os acordos a partir de critérios que incluem o benefício de repactuar em vez de relicitar e aspectos técnicos da concessionária, incluindo condição financeira de honrar com novas obrigações.

 

Para o advogado Aurélio Marchini, sócio do Marchini Botelho Caselta Advogados, a demora na opção entre renovação e nova licitação é prejudicial em razão da complexidade do planejamento dos potenciais interessados em participar das licitações, tendo em vista que requerem volumes vultosos de recursos para pagamento do valor de outorga e realização de investimentos.

 

“Quanto menor esse prazo para mobilização e organização, diminui-se o número potencial de participantes em prejuízo da possibilidade de competição na licitação, o que interfere no valor de outorga e no propósito declarado pelo governo de alcançar menores valores de tarifas de pedágios”, avalia.

 

A leitura está em linha com o que diz o advogado Caio de Souza Loureiro, sócio da área de Direito Administrativo e Projetos Governamentais de TozziniFreire Advogados. “Empresas podem abdicar de um determinado ativo, pelo receio de investir no planejamento sem certeza de que haverá leilão efetivamente”, afirma.

 

Ele pondera que o setor de rodovia é maduro e as empresas, sobretudo as que já operam nesse mercado, têm conhecimento e capacidade de planejamento que permitem a tomada de decisões com mais celeridade e precisão. “No limite, havendo leilões, elas podem participar normalmente”, diz.

 

Prazos

Pelos prazos estabelecidos em portaria, as concessionárias interessadas nas repactuações tiveram de protocolar as propostas de acordos até 31 de dezembro do ano passado. A partir do momento da entrega, o governo tem 90 dias para analisar o pedido. Se aprovado pelo Executivo, é encaminhado para o TCU, que tem mais 90 dias para analisar por meio da Secretaria de Controle Externo de Solução Consensual e Prevenção de Conflitos (SecexConsenso).

 

Por esses prazos, um exemplo ilustrativo sobre a nebulosidade do cenário é a concessão gerida pela Concebra (BR-060, BR-153 e BR-262 DF/GO/MG). A empresa pediu para entregar o ativo em 2021 e teve o processo de relicitação iniciado. O projeto foi reformulado e dividido em três trechos.

 

Agora, o cronograma da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) prevê os leilões de dois desses trechos em 27 de junho deste ano. No entanto, a empresa pediu repactuação e quer seguir gerindo a malha. Pelos prazos definidos, o limite para a avaliação da possível repactuação é 29 de junho.

 

Em ótica positiva, o advogado Ricardo Barretto, especialista em Direito Público do Fenelon Barretto Rost Advogados, diz que a condução dos procedimentos de forma paralela representa uma estratégia inteligente do governo federal, permitindo maior celeridade aos novos leilões, na hipótese de as repactuações não chegarem a bom termo.

“É fundamental, contudo, que todos os atores dos processos de repactuação cumpram prazos e observem procedimentos de modo estrito, para se obter o rápido desfecho do processo. Também é fundamental que se estabeleça, para cada caso concreto, uma data limite para que as partes obtenham uma solução via repactuação”, diz.

 

Durante entrevista à imprensa na quarta-feira, 10, o ministro dos Transportes, Renan Filho, minimizou a possibilidade de que a concomitância desses caminhos resultem em prejuízos. O ministro defende que o mercado tem capacidade de investimentos que será alocada de qualquer maneira, seja por meio das otimizações ou com as relicitações.

 

“A vantagem é que, com as otimizações, os investimentos são feitos no curto prazo. Mas não posso desconsiderar hipótese de não conseguir otimizar, por isso estamos caminhando paralelamente”, disse.

 

Sobre o cenário de que leilões não tenham propostas, ficando desertos, o ministro voltou a defender o que já havia declarado ao Estadão/Broadcast no último mês. “Se, eventualmente, o mercado disser que já está com muitos projetos, vamos ter de buscar alternativas para investimentos porque o mercado privado não consegue fazer investimentos”, disse.

 

Em último caso, disse que o Estado tem capacidade de fazer as gestões até um novo certame. “Se um ficar deserto, o Dnit continua administrando a rodovia. Não ganhamos nem perdemos nada”, afirmou.

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