Lula recebe partidos e tenta ampliar apoio em meio a desconfiança e pressão por cargos
Na primeira reunião com partidos aliados desde a retomada dos trabalhos da Câmara dos Deputados e do Senado, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) prometeu nesta quarta-feira (8) uma gestão de portas abertas ao Congresso Nacional.
O discurso feito no Palácio do Planalto a líderes e presidentes de partidos que formam sua coalizão segue a estratégia de Lula de tentar ampliar ao máximo sua base de apoio não só para a aprovação de projetos, mas para fugir do cenário de isolamento e confronto com o Legislativo que, em 2016, culminou no impeachment da petista Dilma Rousseff.
Essa tentativa também ocorre em meio a uma disputa de bastidores entre os partidos por ocupação de cargos nos segundos e terceiros escalões dos ministérios, em Brasília e nos estados, e em clima de desconfiança mútua.
Segundo relatos feitos à Folha, os discursos dos dirigentes partidários e parlamentares aliados na reunião ocorreram em tom ameno e de apoio, típico de um início de governo.
Nos bastidores, entretanto, há muita insatisfação em relação a pleitos ainda não atendidos e à recente cruzada do chefe do Executivo contra a política monetária do Banco Central.
Estiveram presentes na reunião vários ministros de Lula, como Fernando Haddad (Fazenda), Rui Costa (Casa Civil), Alexandre Padilha (Relações Institucionais) e Geraldo Alckmin (Indústria e Comércio), além de dirigentes e líderes de bancadas da esquerda e do PSD, MDB, União Brasil, entre outras sigla menores.
Foi sugerida e aceita por Lula, por exemplo, a proposta de que ele receba separadamente os partidos de sua coalizão.
A maior crítica de aliados neste momento se dá porque o governo segura a liberação de cargos para medir o grau de fidelidade dos partidos nas primeiras votações de projetos importantes no Congresso, o que ainda não ocorreu.
Parlamentares dizem que pode haver rebeliões nessas votações caso as promessas de loteamento não sejam destravadas.
Tem sido comum, dizem, uma promessa de cargo ser aprovada pelo Planalto, mas acabar barrada quando a negociação desce para o ministério. Outra situação comum, de acordo com relatos, é a entrega da chefia do ministério a determinado partido, mas sem que a legenda possa indicar postos de relevância dentro da estrutura interna da pasta.
Lula tem uma base de apoio original frágil —a esquerda ocupa apenas cerca de um quarto da Câmara e do Senado— e, desde antes da eleição, procurou firmar acordos ao centro e à direita. Até agora, conseguiu apoio no PSD, MDB e União Brasil, a quem distribuiu nove ministérios.
Mesmo assim, Lula e seus ministros também buscam no centrão (PP, Republicanos e PL, que formaram a base de apoio a Jair Bolsonaro) aliados no varejo, já que há nesses partidos vários parlamentares dispostos a aderir ao governo caso tenham ou mantenham seus espaços na máquina federal.
Há negociações também com partidos menores, como o Podemos.
No último dia 1º, Lula obteve uma vitória com a reeleição de Rodrigo Pacheco (PSD-MG) no Senado, por 49 votos a 32, o que afastou a possibilidade de a Casa ficar sob controle bolsonarista.
Na Câmara, também viu com bons olhos a fácil reeleição de Arthur Lira (PP-AL), já que desde a transição havia aberto mão de confrontar o líder do centrão —o que selou a aproximação dos dois.
Lula tem como prioridade no Congresso, neste começo de governo, a aprovação do arcabouço fiscal que irá substituir o teto de gastos, a reforma tributária, além das medidas provisórias que reestruturaram a Esplanada —que cresceu de 23 para 37 pastas. Também estão na lista de prioridades projetos em resposta aos ataques golpistas de 8 de janeiro.
Interlocutores de Lula afirmam que a intensificação do diálogo com o Congresso tem sido uma das orientações mais frequentes do presidente a seus ministros.
O estreitamento da relação com o Legislativo é crucial para que o Executivo implemente medidas vistas como essenciais para o sucesso da gestão petista e que têm alto nível de dificuldade para serem aprovadas.
Esse é o caso da reforma tributária. Eleita pela equipe econômica como prioridade para mudança do cenário fiscal do país, as alterações no sistema de impostos estão em discussão no Parlamento há mais de três décadas e nunca avançaram.
O impeachment de Dilma é sempre um caso lembrado, assim como o de Fernando Collor de Mello em 1992. Em ambos os casos, a relação do presidente com o Congresso era considerada distante e conflituosa.
O principal esforço do Executivo é para criar uma base sólida na Câmara. O Senado teve uma influência mais forte na composição dos ministérios e é visto como uma Casa que dará menos dificuldades para o petista.
Ainda na transição, interlocutores do presidente disseram a aliados que a ideia era nomear os ministros em um primeiro momento e, da segunda semana de janeiro em diante, iniciar as indicações para cargos de chefia em cada órgão.
Os ataques de 8 de janeiro, no entanto, mudaram a pauta política e as nomeações não se concretizaram. Integrantes do Planalto passaram a falar que as nomeações sairiam após 24 de janeiro, data da publicação do decreto que formalizou a estrutura da gestão petista.
Em nova modulação de discurso, a previsão repassada a aliados era a de que indicações ficariam para depois da eleição dos presidentes da Câmara e do Senado, mas ainda não foram destravadas.
Interlocutores de Lula afirmam que a ideia é fazer fluir a negociação para ocupação dos cargos importantes da máquina pública, mas que haverá uma reserva que só será distribuída em votações mas difíceis na Câmara, como forma de conquistar votos.
Apesar disso, na maioria dos discursos, inclusive públicos, Lula tem insistido na orientação para que seus ministros e secretários aceitem de prontidão reuniões solicitadas por deputados e senadores a fim de receber demandas e solucionar problemas.
Além de cargos na administração federal em Brasília e nos estados, parlamentares também pautam sua relação com o Executivo por meio da distribuição de emendas ao Orçamento, entre outras demandas.