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UM PLANO TÍMIDO E FRÁGIL

Por Notas & Informações / O ESTADO DE SP

 

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, lançou nesta semana o primeiro pacote de medidas de ajuste fiscal do mandato de Luiz Inácio Lula da Silva. Para reduzir o rombo de R$ 231,55 bilhões projetado para este ano, ele aposta em um conjunto de ações que incluem a reversão de desonerações, medidas extraordinárias que podem impulsionar a arrecadação, reestimativa de receitas, renegociação de dívidas tributárias e revisão de gastos públicos. Se cada ação anunciada funcionar plenamente, o governo teria condições de encerrar 2023 com um superávit de R$ 11,13 bilhões, feito muito improvável, como reconhecido até mesmo por Haddad. “Sabemos que a meta de cada ação não será atingida”, disse o ministro, citando que seu objetivo é reduzir o déficit para até R$ 100 bilhões.

 

Ao admitir publicamente que não acredita no resultado prometido, Haddad contrasta com seu antecessor no cargo. A trajetória de Paulo Guedes foi a contínua reverberação de projeções macroeconômicas completamente descoladas da realidade. Realismo nunca é negativo. No entanto, ao reconhecer que seus números são muito otimistas, Haddad só destaca a ausência de medidas de impacto em seu primeiro pacote, notadamente a âncora fiscal que deverá substituir o teto de gastos.

 

Era nítida a intenção do ministro ao apresentar um plano antes mesmo de o governo completar duas semanas. Ele foi vencido no primeiro embate envolvendo responsabilidade fiscal, tendo de engolir a prorrogação da desoneração dos combustíveis. Ao fazer o anúncio ao lado das ministras do Planejamento, Simone Tebet, e da Gestão, Esther Dweck, Haddad tenta demonstrar força e coesão na ala econômica. A entrega formal do conjunto de medidas a Lula e ao ministro-chefe da Casa Civil, Rui Costa, não deixa de ser emblemática, sobretudo quando se considera que a Esplanada dos Ministérios e as sedes dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário foram atacadas por golpistas dias antes.

 

Mas é preciso ir além de gestos simbólicos e mostrar compromisso firme com a responsabilidade fiscal. E isso, lamentavelmente, não foi devidamente contemplado no plano de Haddad. No lado das receitas, há inúmeros obstáculos: questões burocráticas envolvendo anterioridade e noventena para alguns impostos; muito lobby contrário no Congresso, que precisa dar aval a algumas das medidas; e preocupações a respeito do impacto da reoneração da gasolina na popularidade do governo.

 

Sob Bolsonaro, especialmente nos últimos meses, o País abriu mão de receitas relevantes, que precisam ser resgatadas, e ampliou gastos eleitoreiros, que devem ser cortados, mas o buraco do Orçamento precede a campanha de 2022. A despeito de um superávit pontual no ano passado, proporcionado pelo calote nos precatórios, o Brasil registra déficits primários desde 2014, fruto do desequilíbrio estrutural entre receitas e despesas – daí a importância do teto de gastos, não como mecanismo de reversão imediata desse resultado, mas pelas expectativas que a âncora fiscal sinalizava sobre o futuro.

 

É evidente que o governo precisa recuperar receitas, mas o verdadeiro ajuste de que o País necessita está no lado das despesas. Nesse sentido, a projeção de corte de gastos do pacote de Haddad, de R$ 50 bilhões, consegue, ao mesmo tempo, ser tímida, para quem vê de fora e considera o tamanho do buraco, e fantasiosa, para quem vê de dentro e sabe que um corte tão significativo quanto este nas despesas discricionárias não é nem um pouco crível. Tal meta não será alcançada sem que haja aprovação de reformas e revisão de gastos obrigatórios.

 

Aproveitando a carta que o Banco Central (BC) enviou ao Ministério da Fazenda justificando o estouro da meta de inflação de 2022, Haddad disse que seu plano deveria ser encarado da mesma forma: como uma carta ao Banco Central mostrando a disposição do Executivo em alinhar política fiscal e monetária. Mas, se deseja conquistar a confiança dos investidores no governo e encorajar o BC a começar a cortar a taxa básica de juros, o ministro terá de se esforçar bem mais.

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