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Fórmulas diferentes para resultados diferentes

Marcos Ricardo dos Santos, O Estado de S.Paulo

30 de julho de 2022 | 03h00

Comecemos pelo que é consenso: todos queremos uma educação de qualidade, plural e emancipadora, acessível a todos os brasileiros. Não há como argumentar contra isso. O debate paira sobre qual seria o melhor caminho para atingir esse objetivo. Alguns defendem insistir numa educação pública universal, outros buscam soluções inovadoras. Uma coisa é certa: se continuarmos na mesma fórmula de sempre, dificilmente observaremos resultados distintos do que se tem hoje.

Há décadas, o Brasil segue uma mesma estratégia: investir na educação pública. O País conseguiu, com a ampliação da oferta estatal, passar de atender 21% da população em idade escolar, em 1940, para 94,5%, no ano 2000, índice próximo à universalização. Entretanto, os indicadores de qualidade do ensino permanecem quase inalterados, considerando os resultados dos estudantes brasileiros em exames internacionais padronizados.

Nas últimas décadas, o Brasil passou por governos de diversos matizes ideológicos, mas nenhum deles conseguiu traçar uma política efetiva para a melhoria da qualidade do ensino básico. Mesmo com a ampliação expressiva de recursos públicos destinados à educação em anos recentes – entre 2003 e 2013, por exemplo, o País triplicou, em termos reais, os recursos federais no setor –, os ganhos de qualidade no período foram apenas marginais.

Para obter resultados diferentes, é preciso pensar em fórmulas diferentes. Uma delas poderia ser reforçar o papel da iniciativa privada na educação, com o uso de vouchers educacionais. Funciona assim: em vez de o governo ofertar diretamente vagas em escolas públicas, passaria a oferecer vales, entregues a famílias mais pobres, que seriam usados como pagamento em instituições privadas de ensino. Assim, famílias mais pobres, que, por falta de condições financeiras, são obrigadas a aceitar um modelo único de escola que o Estado lhes oferece, passariam a ter um leque maior de escolha. Com o apoio financeiro, poderiam optar entre diversas escolas privadas que, em regra, costumam obter resultados melhores. Em suma, a mesma liberdade de escolha que os mais ricos hoje têm sobre a educação de seus filhos estaria disponível, também, para famílias mais pobres. É uma ideia que combina liberdade e equidade, dois conceitos por vezes tidos como antagônicos, mas que podem tranquilamente coexistir.

Ao competir entre si para conquistar (e para manter) alunos, as escolas privadas têm incentivos para estar em processo permanente de melhoria: ofertando estrutura adequada, contratando bons professores, buscando atualizar conteúdos e metodologias, enfim, buscando oferecer a melhor educação possível. É justamente a competição entre os ofertantes para satisfazer os seus clientes – no caso, os estudantes e suas famílias – que servirá como motor para a melhoria contínua da qualidade no ensino.

Um caminho para a implantação de um programa como esse no Brasil, sem aumentar o já comprometido orçamento público, seria a utilização de recursos obtidos por meio da cobrança de uma mensalidade parcial nas instituições públicas de ensino superior, a fim de compor um fundo de financiamento para a educação básica. Hoje, as vagas em cursos universitários públicos são custeadas por impostos pagos por toda a sociedade, mas ocupadas majoritariamente por estudantes de maior renda. Com isso, há uma transferência indireta de recursos dos mais pobres, que pagam a conta, para os mais ricos, que aproveitam o curso superior “gratuito”. Essa lógica poderia ser invertida com a cobrança de mensalidade nas universidades, com descontos parciais para alunos das classes intermediárias e integrais para alunos de menor renda. Ou seja, quem não pode pagar continuaria frequentando o curso superior gratuitamente.

Pesquisadores demonstram, a partir de cálculos reais, que a cobrança de mensalidades variando entre R$ 195 a R$ 780 nas instituições públicas de ensino superior – ou seja, menos do que a média das mensalidades no setor privado e muito menos do que a média mensal de R$ 2.171 por aluno gasta pelo Estado – poderia financiar os estudos de 2,3 milhões de crianças, por meio de um sistema de vouchers, em escolas particulares na educação básica, sem custos adicionais para o orçamento público.

Diversos países que se tornaram referência mundial em educação, tais como Finlândia, Estônia ou Holanda, já perceberam que o importante não é financiar o sistema, mas, sim, financiar os estudantes. A Holanda, por exemplo, usa um sistema de vouchers para 70% dos estudantes no ensino fundamental e para a quase totalidade dos estudantes do ensino médio. Afinal, quem tem direito a acessar o recurso do Estado para custear sua educação é o aluno, e não a escola.

O desenho técnico da política não é difícil. O maior desafio é o convencimento político: seria preciso desviar das pressões corporativas dos sindicatos e se desapegar das velhas fórmulas, que vêm se mostrando pouco eficientes há tempo, mas continuam dominando a mente de quem pensa a educação no País.

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ESPECIALISTA EM POLÍTICA PÚBLICAS E GESTÃO GOVERNAMENTAL

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