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O problema da ‘meta de investimentos’

O Estado de S.Paulo

30 de abril de 2022 | 03h00

Sem apresentar nenhuma proposta clara sobre o que pretende fazer no governo caso seja eleito, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem se cercado de velhos aliados para dar alguma satisfação sobre seus projetos futuros. Um deles é o ex-governador do Piauí Wellington Dias, cotado a assumir um ministério em uma eventual administração petista e escalado para discutir as premissas econômicas do partido com empresários. Se as bases desse plano forem de fato as que foram explicitadas pelo ex-governador em entrevista ao Estadão, o País afundará ainda mais no atoleiro em que se encontra em caso de vitória de Lula.

Na entrevista, Dias defendeu o estabelecimento de uma “meta para investimentos públicos” no Orçamento. A ideia é que essa meta funcione como barreira ao aumento de despesas de custeio e com pessoal, praticamente uma homenagem ao finado teto de gastos destruído pelo governo Jair Bolsonaro, âncora fiscal que limitava o avanço das despesas à variação da inflação. No exemplo de Dias, os salários do funcionalismo não subiriam se o objetivo fixado não fosse alcançado. Como a maioria dos economistas do PT, ele acredita que os investimentos são fundamentais para impulsionar o crescimento. 

E são mesmo. O problema é outro e remete a um discurso populista que nem é novo no PT, segundo o qual investimentos não são gastos. Pode-se dourar a pílula o quanto quiser, mas o fato é que o dinheiro para gastos de custeio e investimentos sai precisamente do mesmo Orçamento, cujas despesas com servidores, aposentadorias, benefícios sociais e subsídios diversos atingiram a marca de 95% dos dispêndios. A fonte de financiamento da medida proposta pelo partido não foi revelada, mas, de forma realista, aumentar investimentos para além do atual patamar passa por reformas estruturantes, alta de impostos ou crescimento da dívida. Ademais, se metas como essa servissem para algo, o Brasil, que há mais de 30 anos obriga governadores e prefeitos a aplicarem 25% de suas receitas em educação, teria um ensino público de fazer inveja a países desenvolvidos. Isso só reforça a ideia de que investimento não deveria ser um fim em si mesmo, mas parte de um consistente plano de governo.

Uma vez que os recursos são escassos, eles precisam ser direcionados para o que realmente importa. No Orçamento atual, porém, as emendas parlamentares, por exemplo, representaram 24% das despesas não obrigatórias dos ministérios, compostas basicamente por, ora vejam, investimentos. Inúmeros casos revelados pela imprensa ligam as emendas de relator a indícios de superfaturamento nas licitações e baixa qualidade de obras. Estudo do economista Marcos Mendes revelou que o grau da captura do dinheiro público por emendas parlamentares no País é 20 vezes maior que a média dos países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Para este ano, o Congresso aprovou 3.563 emendas na peça orçamentária, mais da metade para localidades específicas, em detrimento de ações de abrangência nacional. Juntas, elas atingiram quase R$ 36 bilhões.

Fica evidente que aumentar o investimento público de qualidade não passa por fixar uma meta, mas por restabelecer o equilíbrio fiscal, a começar pelo fim da aberração em que se transformaram as emendas parlamentares nos últimos anos. A retomada do controle da peça orçamentária pelo Executivo, no entanto, não parece fazer parte das prioridades do PT. “Vai ter emenda parlamentar? Vai ter. Fui vereador, deputado estadual, federal, senador, além de quatro mandatos de governador, e em todos eles, tinha emendas. Só que é o Executivo quem deve estabelecer para onde vão os recursos das emendas. É ele que faz o plano”, disse o ex-governador. 

O ex-governador admitiu que tal plano ainda não existe, mas deveria, e não apenas no PT. Sem uma estratégia prévia, independentemente do presidente que vier a ser eleito, o Orçamento continuará refém dos interesses paroquiais do Centrão, que vem se aproveitando das fragilidades políticas do Executivo desde 2015 para aprovar regras que resultaram no sequestro do dinheiro público para fins escusos ou alheios ao interesse público sem qualquer responsabilização.

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