Bolsonaro tem ainda muita tinta na sua caneta para gastar a seu favor nas eleições
Adriana Fernandes*, O Estado de S.Paulo
O presidente Jair Bolsonaro tem ainda muita tinta na sua caneta para gastar a seu favor nas eleições deste ano.
Como assim?
Essa foi a pergunta que muitos leitores fizeram à coluna diante da reportagem do Estadão que mostrou que o governo Bolsonaro tinha uma “folga” de R$ 45 bilhões para aumentar a aposta em corte de impostos e até lançar mão de subsídios sem furar a meta fiscal.
Até agora, todos os olhos estavam voltados para buscar (com dribles) espaço no teto, regra que impõe um limite anual para as despesas com base na variação da inflação.
A confusão é natural porque o Brasil tem muitas regras fiscais, e a meta fiscal, que trata do resultado primário (calculado pelo valor das receitas menos despesas sem contar o pagamento dos juros da dívida), acabou ficando em segundo plano após a criação do teto em 2016.
Ocorre que em 2022 o limite para ampliação de despesas ficou tomado. Também ficou mais difícil politicamente fazer novos furos no teto depois da festa do ano passado. A consequência é que o espaço para medidas fiscais que possam garantir benefícios eleitorais passou a ser do lado das receitas.
É por isso que só este ano o governo já abriu mão de R$ 49,8 bilhões em redução de receitas e mesmo assim a arrecadação ficará R$ 87 bilhões maior do que a prevista quando o Orçamento foi aprovado.
O presidente pega carona nesse cenário e usa a sua caneta para reduzir os tributos e atender a todo tipo de demandas (até mesmo para cortar imposto de carro importado, jet ski e motocicletas) que só olham o curto prazo.
O movimento está longe de acabar porque as receitas têm sido favorecidas pela inflação alta e pela elevação do preço do petróleo, que vai engordar em mais R$ 37,2 bilhões o caixa do governo. Estão bombando.
A meta folgada de déficit de R$ 170,4 bilhões abriu a porteira para essa onda de desonerações embalada no cenário eleitoral.
O governo pode optar em adotar um novo subsídio aos combustíveis, como quer Bolsonaro, abrindo crédito extraordinário sem afetar o teto nem decretar estado de calamidade para suspender as regras fiscais. Basta ter espaço na meta fiscal e uma justificativa “perfeita” para editar o crédito. Esse tipo de crédito não entra no limite do teto, mas o mesmo não acontece com a meta fiscal. Ao contrário do teto, as despesas com esse crédito entram no cálculo da meta. Daí que olhar para a folga fiscal que a meta permite passou a ser importante. É claro que ela pode ser mudada pelo Congresso. Já vimos esse filme tantas vezes.
*REPÓRTER ESPECIAL DE ECONOMIA EM BRASÍLIA