PEC dos Precatórios: governo aceita tornar Auxílio Brasil permanente e avalia fatiar proposta para facilitar aprovação no Senado
Geralda Doca e Manoel Ventura / O GLOBO
BRASÍLIA — Para tentar driblar a resistência dos senadores à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos Precatórios, o governo está acenando com uma série de alterações no texto já aprovado na Câmara. Para evitar uma nova votação de deputados após a aprovação no Senado, a proposta seria fatiada. As mudanças seriam incorporadas por outra PEC.
A PEC dos Precatórios altera o teto dos gastos e a regra de pagamento de dívidas judiciais do governo para abrir espaço fiscal de R$ 91,2 bilhões em 2022.
Um acordo que está sendo costurado com o Senado, o governo e a Câmara pode abranger desde o fatiamento da proposta até compromissos fora do tema principal da PEC. Tudo parar tentar viabilizar os 49 votos necessários entre os 81 senadores.
O governo está discutindo colocar na PEC uma vinculação para que todo o espaço no Orçamento a ser aberto pela proposta seja destinado ao Auxílio Brasil, a programas de assistência social e ao reajuste pela inflação de despesas obrigatórias (Previdência Social, abono salarial e seguro-desemprego).
Sem reajuste para servidores
Na prática isso impede que o valor obtido na PEC seja destinado a reajuste de servidores públicos, como prometeu o presidente Jair Bolsonaro, e também para emendas parlamentares. O reajuste foi rejeitado nesta quinta-feira pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que disse não ver espaço para a medida a partir da aprovação da PEC.
A vinculação é uma demanda de senadores, especialmente das bancadas do MDB e do PSD, que não querem ver o dinheiro da PEC ser canalizado para esses gastos.
Auxilio Brasil seria formalizado como permanente
O governo aceitou ainda transformar o Auxílio Brasil num programa permanente de renda mínima. Até agora, a previsão do governo era pagar um benefício mínimo de R$ 400 até dezembro de 2022, pouco depois das eleições nas quais Bolsonaro pretende concorrer à reeleição.
Para que a solução ocorra rapidamente, a intenção é fatiar a PEC. Tudo o que for consensual e com texto idêntico ao aprovado pela Câmara seria apreciado pelos senadores até o dia 30.
Nessa parte, estaria os limites para o pagamento de precatórios e também a mudança no teto de gastos.
PEC paralela para começar Auxílio Brasil de R$ 400
Eventuais mudanças, como a vinculação do espaço orçamentário com o social, seria levado a uma outra PEC “paralela”. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), acenou com a possibilidade de votar essas mudanças até o dia 16 de dezembro.
Esse fatiamento faria com que o governo conseguisse colocar para funcionar, ainda em dezembro, o Auxílio Brasil de no mínimo R$ 400 mensais, uma obsessão do presidente Jair Bolsonaro. Em busca de elevar seus índices de popularidade, ele espera um efeito parecido ao que teve com o auxílio emergencial de R4 600 em 2020.
Se a PEC demorar mais, o governo pode não conseguir reajustar o novo programa social e, com as limitações do ano eleitoral, isso pode ficar travado em 2022. Neste mês, o Auxílio Brasil começou a ser pago com base em um pequeno reajuste sobre o benefício do Bolsa Família.
Comissão para fiscalizar precatórios e pagamento aos estados
Na negociação política também estaria o apoio a um projeto, que ainda está em gestação, que cria novas regras para as emendas de relator, forma de destinação orçamentária que gerou o chamado "orçamento secreto”, considerado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Além disso, os senadores negociam, para aprovar a PEC, criar uma comissão de fiscalização dos precatórios.
Por último, o Tesouro Nacional deve editar uma portaria garantindo que os precatórios do Fundef (fundo da educação básica que antecedeu o atual Fundeb) serão pagos até o meio do ano que vem, um pedido dos governadores.
Os precatórios do Fundef são uma das principais dores de cabeça do governo federal e foram expedidos após decisões do STF.
Lira quer evitar nova votação na Câmara
As negociações estão sendo conduzidas pelo relator da PEC no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), em conversas com a equipe econômica e os presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que falou nesta quinta-feira sobre as conversas.
— Tivemos uma reunião com Rodrigo Pacheco, também com o relator Fernando Bezerra. Muito positiva. Há muitas sugestões, algumas propostas, como é normal, mas eu penso que alguns ajustes possam aprimorar a PEC. (Agora é) esperar o resultado. Deve ser (votado) na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça do Senado) na semana que vem e no plenário dia 30. Até lá, é trabalhar para que seja uma votação tranquila e que possam ser preservados pontos importantes — disse Lira, após a reunião.
Diante das dificuldades nas negociações entre senadores, Lira disse ainda que espera que a proposta não retorne inteiramente para nova análise pela Câmara.
Grupo pressiona por pagamento integral de precatórios
Um grupo de senadores é contrário à espinha dorsal da PEC, que busca fixar um limite para o pagamento de precatórios em 2022, jogando a sobra para anos seguintes.
Eles querem o pagamento integral dessas despesas reconh
ecidas pela Justiça e sem possibilidade de recurso, que somam quase R$ 90 bilhões. Para compensar, sugerem que precatórios referentes à educação fiquem fora do teto de gastos, entre outras providências.
A equipe econômica é contra deixar os precatórios fora do teto de gastos.