Bolsonaro pensa que é preciso colocar 'dinheiro na veia do povo' para ganhar a eleição
23 de outubro de 2021 | 04h00
Podem dizer o que quiserem. O teto de gastos morreu. Só não foi enterrado porque no momento não há outra âncora fiscal para ficar no lugar, e o governo (Centrão) precisa sustentar a narrativa enganosa de que o teto está vivo para não piorar a crise econômica.
É falsa a versão do presidente Jair Bolsonaro de que não houve furo no teto e que o aumento de gastos será feito dentro das regras orçamentárias.
Não foi uma revisão do teto com discussão ampla sobre a eficácia ou não dessa regra, criada há apenas cinco anos.
O que ocorreu foi uma manobra casuística para conseguir quase R$ 90 bilhões de espaço para gastar mais nas eleições. Querem furar, mas querem dizer que gostam do teto… E buscam ainda mais licença para gastar no programa eleitoral do presidente.
O teto vem segurando muitas tentativas de ampliação de gastos. Os técnicos que lidam no dia a dia da gestão do Orçamento têm absoluta convicção de que, se tirassem o teto, as despesas explodiriam.
Quem participa das reuniões da Junta de Execução Orçamentária (JEO), colegiado em que a equipe econômica e a Casa Civil decidem as prioridades do Orçamento, fica horrorizado com as manobras e dribles que vem se tentando emplacar por ali nos últimos tempos.
Apesar de ter essa barreira, a mudança na regra incluída na PEC dos precatórios representou um turning point de ruptura do teto e da política econômica, virada que só era esperada para o início de 2023, já no próximo governo. Não tem mais nenhuma credibilidade.
O teto se mostrou incapaz de entregar o que prometeu: as escolhas das melhores prioridades de políticas públicas. Há apagão em muitas áreas e abundância em outras, como nos gastos dos militares. Na escassez do limite de despesas imposto pelo teto, instalou-se o feudalismo fiscal, termo tão bem cunhado pela procuradora de Contas de São Paulo Élida Pinto.
O ponto central de toda essa crise em torno do Auxílio Brasil, da ruptura do teto e da debandada da equipe de Paulo Guedes é que o presidente e as lideranças do Centrão tiraram a máscara e estão ignorando a reação nervosa do mercado.
A avaliação no Palácio do Planalto é de que é preciso ganhar a eleição de 2022 e, para isso, será necessário colocar “dinheiro na veia do povo”.
Apesar de toda a boataria de nomes do Centrão para suceder o ministro, Bolsonaro deu apoio a Guedes porque ele está jogando o mesmo jogo. O ministro ficou para ajudar a remar até a reeleição. Ao lado do presidente, que foi até o Ministério da Economia, Guedes não só negou que tenha pedido demissão como deu seu recado: “Peço compreensão. Vamos trabalhar até o fim do governo”.
*É REPÓRTER ESPECIAL DE ECONOMIA EM BRASÍLIA