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Prefeitura de SP dá R$ 200 mil a peça de famosos da Globo e caso vira disputa eleitoral

Eduardo Moura / folha de sp
SÃO PAULO

A prefeitura paulistana autorizou o pagamento de R$ 200 mil para sete exibições de uma peça online, segundo publicado no Diário Oficial do município, sem licitação.

"Festa, a Comédia", encenada no palco do Teatro J. Safra, foi exibida ao vivo na página de Facebook da produtora Manhas & Manias, entre os dias 1º e 9 de setembro.

O monólogo de humor é de autoria Walcyr Carrasco, Heloísa Périssé, além de outros nomes que têm a TV Globo no currículo, como os autores Alessandro Marson, Vincent Villari e Daniele Valente, segundo material de divulgação. Ela já esteve em cartaz antes da pandemia, em formato presencial.

De acordo com a produção, as exibições contaram com equipe numerosa. Os vídeos de cada encenação armazenados no Facebook da produtora têm, cada um, 5.000 visualizações, pelo menos —somada à audiência do YouTube e da página do Teatro J. Safra, onde também houve transmissão da peça, o alcance foi de 85 mil usuários.O espetáculo virou alvo de disputa em meio à corrida eleitoral para o Legislativo municipal.

A contratação aconteceu depois de uma emenda do vereador Zé Turin, do Republicanos, que tentará reeleição ao cargo. Em cartazes da peça divulgados no ano passado, a marca do vereador aparace no rodapé, como "apoio cultural".

Também candidato à Câmara de São Paulo, Gabriel Cassiano, do PDT, entrou na Justiça com pedido de suspensão do pagamento de R$ 200 mil para a exibição da peça online, destacando que o valor seria muito alto comparado com o que tem sido pago em editais da prefeitura em meio à crise do coronavírus.

O momento, de fato, é de crise no setor cultural, agravada pela pandemia. Nesse contexto, Executivo e Legislativo têm articulado mecanismos de socorro, como a Lei Aldir Blanc e o recente edital Palco Presente —este último ofereceu repasses de R$ 6.000 a R$ 12 mil. Há ainda outros mecanismos, como o Prêmio Funarte Festival de Teatro Virtual 2020, que oferece R$ 33,6 mil.

Peças virtuais tendem a custar, em média, R$ 20 mil. Já as presenciais têm orçamentos que ficam entre R$ 80 mil, caso de um monólogo, por exemplo, e R$ 300 mil, uma montagem simples com quatro ou cinco atores.

O pagamento não chegou a ser efetuado, segundo a prefeitura. O repasse dos recursos foi suspenso por liminar da juíza Cynthia Thome, do Tribunal de Justiça de São Paulo, que afirmou que a contratação se deu por valor muito superior ao de mercado, sem a realização de licitação e sem justificativa plausível para a contratação excepcional.

Cada vereador da capital paulista tem direito de adicionar até R$ 4 milhões ao orçamento municipal por ano através de emendas.

Nesta legislatura, a Secretaria de Cultura foi a que mais recebeu verba por meio das emendas de parlamentares, totalizando R$ 94 milhões, seguida pela Secretaria de Esportes e Lazer, com R$ 61 milhões.

A pessoa jurídica contratada pela prefeitura é a associação MDLD - Amigos Unidos Venceremos, que tem como atividade econômica principal educação infantil e creche, segundo seu CNPJ.

A lei de licitações e contratos, citada na contratação publicada no Diário Oficial, tira a obrigatoriedade de licitação "para contratação de profissional de qualquer setor artístico, diretamente ou através de empresário exclusivo, desde que consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública".

A prefeitura diz que que as apresentações de "Festa, a Comédia" estão entre os 56 eventos em formato de live aprovados por meio de emendas de vereadores realizados pela Secretaria Municipal de Cultura, a SMC, até o momento. "Ressaltamos que a SMC não é responsável pela curadoria dos artistas e do evento, mas, sim, por analisar a documentação dos artistas e empresa, bem como verificar a justificativa do cachê proposto", afirma, em nota.

Entre os eventos em formato de live listados pela prefeitura, estão um show do grupo Revelação que custou R$ 45 mil e um show de Rappin'Hood, que custou R$ 8.000.

As contratações são feitas pela prefeitura, com uma comissão específica que avaliou os cachês propostos, "utilizando comprovação de três notas fiscais de eventos anteriores do artista".

O vereador Zé Turin diz, em nota, que a emenda destinada para a associação MDLD - Amigos Unidos Venceremos seguiu todos os critérios legais e estabelecidos pela Secretaria Municipal de Cultura. Ele também diz respeitar a decisão judicial e deixa seu mandato à disposição para possíveis esclarecimentos à Justiça.

A MDLD - Amigos Unidos Venceremos afirma que o ator Maurício Machado, que protagoniza a peça, não é agenciado pela associação e que esta foi a primeira vez que contratou os serviços do artista.

A associação diz que "todo espetáculo realizado com dinheiro público deve ser fiscalizado de forma exemplar". "Certos de termos seguido todas as orientações e normas da Secretaria Municipal de Cultura, temos certeza da liberação do recurso citado nos próximos dias", acrescenta a MDLD, em nota.

A produtora Manhas & Manias diz que o projeto "foi aprovado e atende todos os protocolos e
tramites legais previstos conforme normas e orientações da Secretaria Municipal de Cultura de uma emenda parlamentar". A produtora diz que irá recorrer da decisão. "Não compreendemos a decisão de suspender o pagamento, uma vez que todo o processo foi aprovado pela Secretaria Municipal da Cultura e todo o serviço já foi realizado", diz, em nota. "Assim que recebermos oficialmente a citação do processo nosso departamento jurídico tomará as providencias para apresentar nossa defesa."

Ainda segundo a produtora do espetáculo, a associação MDLD - Amigos Unidos Venceremos tem comprovadamente histórico de projetos culturais.

Para explicar sua parceria com a associação de educação infantil, a produtora ​Manhas & Manias diz que a colaboração teria surgido a partir de um intuito da MDLD de "realizar um projeto cultural de qualidade que pudesse atingir o maior número de pessoas possível".

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