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A reforma administrativa e o bolsa-popularidade

Jair Bolsonaro, aleluia, tirou a proposta de reforma administrativa do cofre onde a tinha escondido. Enviou-a hoje ao Congresso, onde ela deve encontrar um ambiente favorável de tramitação. Foi um passo importante para que o Estado brasileiro, daqui a alguns anos, tenha menor custo e seja mais eficiente. 

A reforma não mexe com quem já está no funcionalismo. Seria melhor se mexesse. Há muitos penduricalhos na remuneração dos servidores e a progressão de carreira que não leva em conta regras de desempenho, somente o tempo de serviço, é uma aberração. 

Mas fazer diferente ampliaria à enésima potência a resistência política à reforma e daria origem a um sem número de processos pelo reconhecimento de direitos adquiridos. Eles tenderiam a ser acolhidos, porque nada é mais corporativista no Brasil do que a cabeça de um magistrado. Assim, que as regras valham para quem ingressar no serviço público depois de sua aprovação. 

Pena que o responsável pela elaboração da proposta, o ex-secretário Paulo Uebel, tenha perdido a esperança de vê-la encaminhada semanas atrás, quando deixou o governo. Ele fez um bom trabalho. 

O projeto cria novas formas de contratação para o serviço público, pondo fim ao famigerado regime único da União. Ele cria requisitos de desempenho para que novos funcionários sejam efetivados em seus cargos e, depois, progridam na carreira. Ele também elimina alguns benesses com as quais empregados do setor privado não podem nem sonhar, como redução de jornada sem redução de salário e férias de mais de trinta dias por ano – privilégios injustificáveis pagos com dinheiro público. 

O Congresso pode aprofundar a reforma. Por exemplo: o teto para os salários do funcionalismo existe no papel, mas não na prática. Tornou-se história da carochinha, tantos foram os subterfúgios criados para furá-lo. Mas existem projetos com tramitação avançada para acabar com essa farra. Esperemos que seja aprovados. 

Esperemos também que a mudança de padrão para os servidores da União constranja os outros poderes a fazer suas próprias reformas. O Legislativo brasileiro é um dos mais caros do mundo e deve cortar na própria carne, em vez de apenas cobrar ajustes do Executivo. Idem, com muita ênfase, para o Judiciário. 

Quanto às circunstâncias políticas que fizeram Bolsonaro mudar de ideia, estou certo que elas têm a ver com a possível criação do Renda Brasil, programa que pretende substituir, com vantagens, o Bolsa Família. 

Ora, o Renda Brasil não foi incluído na proposta de orçamento que o governo concluiu na semana passada. Por mais que tentasse, a equipe econômica não conseguiu achar uma fonte de receita para essa nova despesa. E todo mundo sabe que o fim do auxílio emergencial, em dezembro, será péssimo para a popularidade do presidente, se nada houver em seu lugar. O cérebro humano está programado para responder com revolta quando lhe tiram um doce. 

Mas o jogo ainda não acabou. Venho dizendo há tempos que a ala reformista da Câmara dos deputados, capitaneada por Rodrigo Maia, não daria de mão beijada a Bolsonaro um programa de transferência de renda – que também pode ser chamado de bolsa-popularidade. Alguma troca teria de haver.  

Pois bem: na terça-feira, Maia disse que o envio da reforma administrativa traz “melhores condições para que os programas que o governo quer implementar possam ter um espaço no teto de gastos para os próximos dois ou três anos.”

Na verdade, por não atingir os atuais servidores, a reforma administrativa não cria espaço nenhum para gastos nos “próximos dois ou três anos”. Seus efeitos devem começar a ser sentidos em não menos que uma década.

Mas o gesto de enviar o projeto ampliou em muito o teto da boa vontade política, além de representar um sinal inequívoco de que existe compromisso com o controle dos gastos públicos. 

Aposto que ao votar o orçamento, o Congresso vai liberar algum dinheiro para que Bolsonaro possa investir e fazer gastos sociais em 2021. ISTOÉ

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