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"O presidencialismo é antidemocrático", diz autor de guia sobre presidentes do Brasil

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O escritor Paulo Schmidt está lançando o Guia politicamente incorreto dos presidentes da República (Editora Leya), em que resgata a humanidade — "ou a falta dela", como ele frisa —dos homens —  e da mulher — que, empossados no mais alto cargo da República, têm se revelado, segundo ele, “um completo desastre administrativo, político e pessoal”. Com anedotas picantes e algumas acusações bem sérias, ele pretende jogar os holofotes sobre as idiossincrasias do Executivo nacional. "É importante conhecermos nossos presidentes, pessoas que, embora se comportem como monarcas, são funcionários públicos com poder tão grande a ponto de determinar a vida de todos nós".



Polêmico, ele diz não acreditar que a presidente Dilma Rousseff tenha tido torturada durante o período em que ficou presa pela ditadura. É importante ressaltar que o Estado brasileiro reconheceu que Dilma foi torturada, indenizando-a em 2002 pelas atrocidades sofridas na cadeia. Em 2001, Dilma relatou, com detalhes, ao Conselho Estadual de Direitos Humanos de Minas Gerais, criado para indenizar presos políticos torturados no estado, os socos e choques que sofreu por seus torturadores. Foi também dela a iniciativa de instaurar a Comissão da Verdade, que apurou violações aos direitos humanos cometidas entre 1946 e 1988, período que inclui a ditadura militar.

O que chamou sua atenção nas vidas dos presidentes?

Alguns são completamente loucos, como o Arthur Bernardes, que presidiu o país entre 1922 e 1926. Pouca gente sabe, mas ele criou um verdadeiro campo de concentração no Amapá, para onde mandava os oposicionistas. Muitas pessoas morreram lá e o lugar foi apelidado de inferno verde. Jânio Quadros, aluno mediano, dotado de gênio tempestuoso, arremessou um tinteiro à cabeça de um professor que o admoestou com rispidez. Quando era comandante, Floriano Peixoto obrigou os praças a ficarem horas em posição de sentido sobre um formigueiro, recebendo, imóveis, mordidas furiosas.

E Lula e Dilma?

Lula teve destemperos, muitos provocados por bebida, como o discurso que fez para poucos na embaixada do Brasil em Tóquio, em maio de 2005, em que, depois de algumas doses de uísque, xingou com palavras impublicáveis Nestor Kirchner e Jorge Battle, então presidentes da Argentina e Uruguai. Pesquisei muito e não acredito que a Dilma tenha sido tão torturada como se diz. Ela coloca isso como uma bandeira, mas não encontrei nenhuma prova concreta, a não ser a palavra dela, de que tenha sido torturada. É evidente que ela foi presa, que teve tortura no Brasil, mas não creio que ela tenha passado por isso.

Qualquer tortura, no entanto, não é exatamente um espetáculo com muitas testemunhas. Não acha leviano ou uma postura negacionista fazer uma acusação dessas?

Eu acho que pode ser polêmica a minha opinião, mas não existe prova concreta. Existe a palavra dela. E a palavra dela não tem credibilidade, na minha opinião. Tempo depois, é que começaram outras pessoas a concordar com ela, nos anos 2000. Da década de 1970 até os anos 2000, ninguém sabia quem era ela. Ela não era ninguém. Quando ela passa a ser uma autoridade, é fácil encontrar quem corrobore com a história dela. Os militares não tinham registros de torturas, porque, oficialmente, era para não haver.

O que conta no livro sobre o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso?

Procurei ser irreverente com todos os presidentes. Fernando Henrique foi o que eu menos achincalhei. Ele mudou muito. Era um professorzinho marxista da USP. Tinha ideias ultrapassadas. Escreveu livros que hoje são obsoletos e primitivos.Os horizontes dele foram se ampliando com o tempo. As viagens dele, durante o exílio, ajudaram muito nisso. Ele foi festejado quando era muito novo, jovem. Era um professor muito ideológico. Sempre foi culto. E, por isso, era meio arrogante também. Ele entrou tarde na política, foi eleito senador, concorreu à prefeitura de São Paulo. Fernando Henrique tinha certeza de que ia ganhar aquela eleição. Lembro que posou para uma revista já sentado na cadeira de prefeito. E perdeu. Foi uma lição de humildade. Quando ele se tornou presidente, teve que aprender a fazer acordos, alianças. Ficou mais conciliador. Não é um grande escritor. Mas fala muito bem, é fluente.

Na sua opinião, quem melhor ocupou a presidência?

O melhor presidente na redemocratização é o Fernando Henrique. A equipe dele estabilizou a moeda com o Plano Real. Ele investiu em infraestrutura, enxugou a máquina. A gente acha que ela ainda é enorme, mas era pior naquela época. O segundo mandato teve problemas econômicos por causa dos Tigres Asiáticos. Houve polêmica com a privatização, mas eu sou a favor. Acho que foi bom para o Brasil, ainda mais porque algumas empresas eram cheias de cabides de emprego. Se ele tivesse privatizado a Petrobras, não teríamos o petrolão. Antigamente, era difícil conseguir uma linha de telefone. Ele foi o melhor dessa fase.

Mas o menos ruim de todos os presidentes foi um ditador. O Getúlio Vargas tinha uma visão ampla, era um estadista. Em termos de industrialização, ele foi visionário. Você pode não gostar dele, mas Getúlio incorporou o proletariado à vida nacional. Não havia respeito aos direitos do trabalhador. Era um homem inteligentíssimo, mas autoritário e patronal. Os benefícios que trouxe ao Brasil foram equivalentes aos malefícios em termos democráticos. O primeiro mandato dele durou 15 anos.

Como vê a crise política atual?

É um desprezo total pela democracia, pela opinião do povo. Mas não acredito que seja só pela deformidade de caráter da maioria dos nossos presidentes, estamos no caos também porque o sistema presidencialista, que concentra todo o poder executivo na mão de uma única pessoa, é essencialmente antidemocrático. Com a deposição de Dom Pedro II e a Proclamação da República, um republicano coroado acabou sendo substituído por uma sucessão de monarcas sem coroa. ÉPOCA

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