A guinada social do BNDES - O ESTADO DE SP
15 de janeiro de 2020 | 03h00
Segundo dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), vinculado ao Ministério do Desenvolvimento Regional, cerca de 100 milhões de brasileiros não têm acesso à água tratada e à coleta e tratamento de esgoto. É uma indignidade que tanta gente ainda viva submetida a condições tão insalubres no Brasil. Por essa razão, foi um alento ouvir do ministro da Economia, Paulo Guedes, e do presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Gustavo Montezano, que o saneamento básico passará a ser a “viga mestra” do banco de fomento.
Durante o evento “BNDES com ‘S’ de Social e Saneamento”, realizado recentemente na sede do banco, no Rio de Janeiro, Gustavo Montezano afirmou que “tanto o BNDES como o Brasil” cometeram “equívocos” com relação ao saneamento. “Não faltam recursos para investir na área, o que falta é vontade, organização política para fazer isso acontecer. O BNDES tem posição fundamental e toda a vontade de ajudar nesse processo”, disse o presidente do banco, enfatizando que será papel da instituição atuar como “principal articuladora nacional da agenda do saneamento”.
A bem da verdade, mais do que “equívocos”, o que tem havido no País em relação ao saneamento básico é a absoluta negligência. “Equívocos” não explicam por que cerca de metade da população, em pleno século 21, ainda não seja atendida por rede de água e esgoto. De qualquer forma, é bom saber que o BNDES retomará o papel social de sua vocação e atuará como articulador de uma das agendas mais vitais para o País.
As palavras de Montezano soam como música para os ouvidos dos que se estarreceram com a farra realizada pelo BNDES com dinheiro público durante as gestões petistas. O País paga até hoje a alta conta da política de financiamento dos famigerados “campeões nacionais”. Mas, de palavra em palavra, milhões de brasileiros vêm padecendo de doenças decorrentes da falta de saneamento há décadas, milhares morrem por ano e centenas de municípios ainda têm de lidar com problemas que há muito deveriam estar resolvidos.
Como bem disse Gustavo Montezano, não é por falta de recursos financeiros que a questão do saneamento básico é uma calamidade pública no País. A principal causa do problema é a falta de projetos. Dinheiro nunca faltou, mas iniciativa política e bons projetos para a área são escassos por razões que vão desde a incompetência de governadores e prefeitos até o mais rasteiro cálculo político. “Cano embaixo da terra não dá voto”, costumam dizer os gestores do atraso. Deveria ser desnecessário dizer que a missão precípua de uma verdadeira liderança pública é tornar melhor a vida dos que por ela são liderados.
Projetos da área de saneamento básico não costumam dar retorno imediato, mas são vitais para a vida urbana. Das lideranças políticas, espera-se que o espírito público norteie suas decisões. Já dos bancos privados não é esperado que desconsiderem, por razões óbvias, o retorno imediato dos investimentos que fazem. Por isso é fundamental o papel de um banco como o BNDES no financiamento de projetos de alta relevância social, como são os projetos de saneamento básico, mas que não tragam um rápido retorno financeiro.
“O papel do BNDES é muito mais qualitativo, de escolher os melhores projetos sociais, ajudando prefeitos e governadores, não ficar emprestando dinheiro para ‘campeão nacional’ ou (países com) ideologia amiga”, disse o ministro Paulo Guedes. Muita acrobacia retórica foi feita no passado recente para justificar os supostos ganhos sociais com a política dos “campeões nacionais” levada a cabo pelo BNDES sob gestão do PT. Ninguém de boa-fé haverá de negar esses ganhos com a retomada do viés social do BNDES, por meio do fomento de projetos de saneamento.
Agora cabe à sociedade e aos órgãos de controle das esferas competentes acompanhar a execução de tais projetos. Há muitos desafios novos a serem enfrentados. Que superemos os velhos.