Só resta a Dilma “tocar um tango argentino”
Manuel Bandeira tem um poema amargamente engraçado chamado “Pneumotórax”, fazendo blague da tuberculose, que o atormentava. Depois de elencar substantivos para retratar os males da doença, há o diálogo nada otimista com o médico e a pergunta, se seria possível tentar o pneumotórax — no caso, tomado, ainda que impropriamente no texto, como uma drenagem do pulmão, uma terapia agressiva. Pessimista, responde o médico: “A única coisa a fazer é tocar um tango argentino”.
Leiam o poema por curiosidade.
Pneumotórax
Febre, hemoptise, dispneia e suores noturnos.
A vida inteira que podia ter sido e que não foi.
Tosse, tosse, tosse.
Mandou chamar o médico:
– Diga trinta e três.
– Trinta e três… trinta e três… trinta e três…
– Respire.
– O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o pulmão direito infiltrado.
– Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax?
– Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.
Volto
Dilma está sem saída, como o paciente do poema. Recessão, juros altos, inflação, desemprego, corrupção, impopularidade, PT infernizando a sua vida, o Brasil pedindo a sua renúncia…
Fazer o quê? Para ficar nos termos do poema de Bandeira, só lhe resta “tocar um tango argentino”. Vale dizer: nada mais pode ser feito. Bandeira, felizmente, teve uma vida relativamente longa, mas não será o caso do mandato de Dilma, que, felizmente, está chegando ao fim.
Neste domingo, a presidente fez uma reunião de emergência. Pra quê? Para citar outro poeta, Ascenso Ferreira, “pra nada”. O governo chegou à conclusão de que é preciso mexer na economia para estimular empresários e trabalhadores. Mas mexer exatamente no quê? Se a medida fosse, factível e estivesse à mão, razoável teria sido implementá-la antes que 3,5 milhões saíssem às ruas, não é mesmo?
Outra solução mágica, por mais que pareça piada e por mais grotesco que seja, seria nomear Lula para um superministério, hipótese em que aquela que foi eleita e já deslegitimada pelo povo poria em seu lugar alguém igualmente deslegitimado, que nem eleito foi.
Mas isso não é tudo.
Essas soluções mágicas não contam com uma componente nada irrelevante: o baú de novidades e de horrores da Operação Lava Jato, que chega cada vez mais perto de Dilma e de Lula.
Não tem jeito! Resta a Dilma tocar um tango argentino. E não se trata, infelizmente, de uma alusão a Maurício Macri, que, tudo indica, abriu o ciclo antipopulista na América Latina.
Nesse caso, o tango está mesmo na acepção de Bandeira. Acabou, Dilma. Vai pra casa. REINALDO AZEVEDO