Polícia de SP usará câmera no uniforme para coibir violência
Para tentar reduzir casos de violência e aumentar a qualidade das provas judiciais, a Polícia Militar de São Paulo iniciou a implantação de um sistema de câmeras para registro, em áudio e vídeo, de intervenções no estado.
Pelo projeto, câmeras com alta definição serão acopladas ao uniforme dos policiais —na altura do ombro— para que todas ações de interesse policial sejam gravadas, armazenadas e posteriormente utilizadas, se necessário for.
“Ação de interesse policial é a ocorrência despachada pelo Copom [centro de operações da PM], aquela em que ele mesmo atua, por iniciativa própria, ou quando populares acionam”, diz o tenente-coronel Robson Cabanas Duque, 47, gerente do projeto.
Essa lista inclui, por exemplo, abordagens de suspeitos, transporte de pessoas nas viaturas e atendimentos que necessitam da elaboração de um boletim de ocorrência.
Inicialmente, a implantação se dará em seis unidades —quatro delas, na capital, as demais em Santos e Sorocaba— escolhidas em razão do alto índice de reclamações contra ações da tropa e, ainda, pela grande quantidade de casos de violência doméstica.
Nessa lista está o 18º batalhão, na Freguesia do Ó, zona norte, famoso pela suspeitas de violência envolvendo seus policiais, entre elas o assassinato do coronel José Hermínio Rodrigues, comandante da unidade, no início de 2008. As demais regiões são Mooca (zona leste), Capão Redondo e Heliópolis (ambas zona sul).
A expansão a outras unidades ocorrerá conforme a capacidade financeira da PM, mas a ideia é que no médio prazo todos os policiais de rua no estado usem o equipamento.
O investimento inicial para implantação do sistema, entre aluguel de cerca de mil câmeras e serviço para armazenar imagens, está estimado em R$ 5 milhões. A Polícia Militar de São Paulo tem um efetivo superior a 88 mil homens e mulheres (incluindo o Corpo de Bombeiros) e orçamento anual de R$ 16 bilhões.
A licitação para aquisição dos equipamentos deve ser aberta nos próximos dias, após a conclusão de estudo pelo tenente-coronel Cabanas, com base em experiências internacionais (como EUA e Reino Unido) e testes da corporação iniciados em 2013.
Foram esses testes, segundo o PM, que demonstraram a eficácia do equipamento nas ocorrências de violência doméstica, tanto para produção de provas como para inibir a continuação das agressões.
“A câmera tem a possibilidade de produzir a prova no local, uma prova muito difícil de se conseguir. O fato de você filmar uma casa com os móveis todos arrebentados, revirados, numa briga, na hora que o juiz vê isso, ele está vendo a prova do que aconteceu.”
Uma preocupação da PM foi criar medidas para impedir vazamento das imagens gravadas, o que comprometeria o projeto. Por isso, as câmeras não permitem edição, manipulação, compartilhamento nem exclusão de imagens. Elas só podem ser fornecidas pelo comandante da unidade, em casos específicos como ações judiciais. Todas as imagens serão classificadas como secretas e, assim, não são fornecidas nem por meio da Lei de Acesso à Informação, incluindo a envolvidos nas ocorrências.
“É uma ferramenta tremenda para a sociedade, e, para nós é importante, porque nos interessa a transparência. Ninguém está aqui para esconder vídeo de policial que abusa de sua autoridade, que bate nos outros”, afirma Cabanas.
Para o tenente-coronel, a iniciativa ajudará a melhorar a imagem da PM. “É o sonho de toda a Polícia. Que ela seja considerada pela população uma polícia transparente, legítima, tenha a ‘accountability’ [preste contas]. Nós, na PM hoje, temos dificuldade. Com as coisas que acontecem, temos a imagem péssima, e a gente quer mudar isso.
”Outra preocupação é permitir que a câmera fique desligada em alguns momentos.“
A gente só não deixa a câmera ligada 24 horas não por falta de tecnologia, mas você pode arruinar o relacionamento da polícia e da comunidade, e também, a privacidade do policial. A gente precisa garantir o mínimo de privacidade para o profissional.”
Para o deputado estadual coronel Paulo Adriano Telhada, ex-comandante da Rota, a implantação do sistema “vem em ótima hora” por oferecer maior respaldo jurídico ao policial honesto e por desestimular desvios de conduta.
“Toda mudança gera expectativa, geralmente negativa, mas vejo como algo positivo e que deveria ter sido implantado há mais tempo”, afirma.“
Diante de tudo que está acontecendo no Brasil, infelizmente, a palavra do policial está caindo em desuso. Hoje, na maioria das vezes, o juiz, as pessoas, acreditam mais na palavra do ladrão do que do policial. É a realidade.”
O ouvidor da Polícia, Benedito Mariano, considera a implantação do sistema importante para a sociedade. “É uma inovação que serve para diminuir os excessos, os abusos de autoridade e também serve de prova para o policial quando for uma ocorrência de legitimidade”, diz ele.
De acordo com pesquisa realizada pela Ouvidoria sobre 756 vítimas de ações letais da PM registradas em 2017, em apenas 26% dos casos havia claros indícios de necessidade do uso de força letal.“Nos 74% restantes a Ouvidoria indicou haver excesso. Desse total, em 48% é excesso na legítima defesa, e em 26% há indícios de ocorrência sem o confronto armado”, afirma.
O ouvidor diz que a PM não pode deixar de colocar câmeras nas unidades com maior letalidade. Segundo Cabanas, isso deve acontecer, mas o prazo não foi definido. “A Rota ficou fora porque é uma tropa especial, está no estado todo. Precisamos colocar na rádio patrulha, perto do cidadão, de quem atende ocorrência de briga, de desinteligência. Vai chegar o tempo do 1º batalhão de choque”.
6 batalhões começam a usar as câmeras operacionais portáteis (COP) neste ano —4 na capital, 1 em Santos e 1 em Sorocaba
1.000 equipamentos serão distribuídos inicialmente, até atingir no médio prazo todos os PMs de rua
R$ 5 milhões é o custo inicial previsto