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A vez da economia liberal

Rudolfo Lago, Ary Filgueira e Wilson Lima / ISTOÉ

 

No Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) circula com sucesso uma piada entre os integrantes da equipe de transição do novo governo. Ela diz que um grupo de cientistas americanos desembarcou na Amazônia para investigar um curioso caso de suicídio coletivo em certa espécie de formigas de rabo vermelho, desenvolvido por elas para se destacarem em meio à densa mata. De tempos em tempos, uma delas saía a explorar a região em busca de alimentos. Quando encontrava comida, ela guiava as outras até o local da fartura. Iam em fila indiana, com o nariz de uma colado ao rabo vermelho da outra. Mas certo dia, a da frente foi para a direita e a de trás para a esquerda. Assim, elas ficaram andando em círculos, sem chegar a lugar algum. Com o tempo, morreram de exaustão na caminhada. A conclusão da piada é que foi isso o que fizeram os técnicos que estiveram à frente da economia nos governos do PSDB e PT. Para evitar picos de inflação, os economistas sempre recorriam ao mesmo remédio de intervir na economia, subindo os juros de forma estratosférica.

 

Os juros altos seguravam a inflação, mas inibiam o crescimento, provocando estagflação. Geravam dívidas imensas para o setor produtivo e para a própria União, Estados e municípios. Para cobrir a dívida, investia-se menos. Para evitar a paralisia, o governo intervinha de novo criando incentivos e subsídios. O crescimento elevava a inflação e, de novo, recorria-se aos juros. Uma caminhada em círculos que levou o país à exaustão.

 

Para o futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, a única forma de tirar o Brasil dessa jornada suicida é um choque de liberalismo — que diminua a intervenção do Estado na condução da economia, privilegie os instrumentos de regulação do próprio mercado na velha lei da oferta e da procura e torne, assim, o Estado menos pesado e oneroso. Um Estado mais leve, com menos juros, com menor dívida, que custe menos ao contribuinte, especialmente aos empreendedores. Essa é a formula que o novo ministro propõe para romper o circulo vicioso da economia brasileira e que levou o País a enfrentar uma das maiores recessões da história em 2015 e 2016. A crise aconteceu porque os governos petistas, segundo ele, seguiram mantendo as ferramentas de intervenção na economia. “É preciso fazer de fato a transição de um regime totalmente fechado para um regime realmente aberto”, prega Guedes.

O ideário de Guedes alinha-se aos ensinamentos da Universidade de Chicago, nos EUA, onde estudou. Berço de economistas como George Stigler e Milton Friedman, eles se opõem à linha desenvolvimentista proposta por John Maynard Keynes. Pregam o liberalismo econômico, com menor intervenção do estado, com o mercado mais livre para se regular. Lá, estudaram também vários dos auxiliares que ele convocou para assessorá-lo, chamados de Chicago Boys (“Garotos de Chicago”). Guedes diz que eles são na verdade seus Chicago Oldies (“Velhos de Chicago”), ou seja, economistas liberais experientes.

Mesmo com esse respaldo acadêmico, a tarefa de Paulo Guedes não será nada fácil. O diagnóstico do novo ministro é que não há outro caminho para reduzir a dívida e o peso da máquina pública que não seja diminuindo o Estado. Para isso, há, na sua avaliação, três caminhos. O primeiro é aprovar reformas estruturantes que diminuam o tamanho do déficit da Previdência, reduzam a carga absurda de impostos e tornem menos burocrático e cheio de direitos que hoje os empresários consideram inviáveis para a contratação de trabalhadores. No diagnóstico geral, poucos discordam dele. O problema é quando tais reformas começam a ser detalhadas. Aí, falta consenso.

Guedes defende para a Previdência uma fórmula que associe o atual modelo pelo qual os trabalhadores ativos contribuem para a pensão dos aposentados com um modelo de capitalização semelhante ao que foi instituído no Chile. O problema maior está em fazer com que valha para todos. Nessa hora, diversas corporações buscam exceções. “Eu até poderia trabalhar pela aprovação da reforma se eu já fosse capaz de saber que reforma o governo defende”, disse o senador eleito Major Olímpio (PSL-SP), um dos principais líderes do novo governo. Ele deixa claro que pretende trabalhar para manter salvaguardas específicas para a sua categoria, a Polícia Militar. De qualquer forma, há entre os empresários uma expectativa otimista de que Guedes, enfim, consiga imprimir ventos liberais à economia. Os desafios, porém, não são pequenos. Não são poucas as formigas que ainda insistem em virar para o lado oposto.

OS DESAFIOS DO CHOQUE LIBERAL

1 – A fórmula pretendida por Paulo Guedes centra-se em um tripé para reduzir déficit, dívida e evitar a fórmula tradicional que aumenta os juros para conter a inflação

2 – O primeiro ponto da mudança é fazer as reformas. A reforma da Previdência é considerada essencial para evitar o aumento do déficit público. E a reforma tributária objetiva estimular novos investimentos

3 – O segundo ponto é reduzir a máquina pública, realizando privatizações e reduzindo o tamanho do Estado. Guedes estima que todas as estatais renderiam até R$ 1 trilhão

4 – Outro ponto importante é o enxugamento da máquina, diminuindo o número de servidores comissionados

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