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Cidade paga a servidor, mas fornecedor deixa de receber, aponta pesquisa

Flavia Lima /FOLHA DE SP
SÃO PAULO

Em meio à dificuldade para colocar as contas em ordem, a maioria das prefeituras brasileiras vem deixando de pagar a seus fornecedores para não atrasar os salários dos servidores.

Dos 4.559 municípios ouvidos pela Confederação Nacional de Municípios (82% do total), mais de 90% responderam que as remunerações do funcionalismo estão sendo pagas em dia e quase 77% disseram que a folha de dezembro vai ser honrada sem atrasos. 

Mais da metade (50,2%) admitiu, no entanto, que está com o pagamento de fornecedores em atraso.

A solução encontrada pelos prefeitos contorna o problema da falta de recursos no curto prazo, mas pode render dor de cabeça mais à frente —além de encobrir desequilíbrios ainda maiores. 

Por enquanto, os atrasos em relação aos fornecedores são inscritos nos restos a pagar do ano seguinte —68% dos municípios admitem que vão deixar pendências para 2019.

Daqui a dois anos, porém, se os prefeitos entregarem seus postos aos sucessores com dívidas pendentes, serão responsabilizados pela lei, correndo o risco até mesmo de prisão. 

 

“Os prefeitos privilegiam salários e o 13º porque são cruciais para as economias locais, mas a crise é mais grave do que parece”, diz Glademir Aroldi, presidente da CNM.

O 13º dos mais de 6 milhões de funcionários municipais adiciona à economia R$ 22,8 bilhões neste fim de ano. 

A questão, diz Aroldi, é que os salários estão em dia, mas muitas cidades estão deixando de recolher encargos sobre a folha, estão reduzindo carga horária ou até mesmo o efetivo de servidores. 

Mesmo num cenário em que as prefeituras que reconhecem atrasos na quitação da segunda parcela do 13º salário correspondem a uma minoria (9%), o percentual está no maior nível desde 2015.

Para o especialista em contas públicas Raul Velloso, as prefeituras fazem o “ajuste fiscal” sobre fornecedores porque eles representam a parte mais fraca politicamente.

“O prefeito pode pedir paciência ao fornecedor em nome de manter o contrato. Já o servidor está nas barbas do prefeito e, se for aposentado, tem confusão nas farmácias”, diz. 

Os municípios passam por um quadro de penúria fiscal em razão da forte queda de arrecadação dos seus principais tributos (ISS e ICMS). 

Houve também queda das transferências que muitos recebem da União, cujas contas também não vão bem, e muitos foram imprevidentes nos tempos das vacas gordas.

Os municípios, porém, não estão sozinhos. Dados do Tesouro indicam que, entre 2011 e 2017, as despesas com pessoal nos estados subiram 32% na média, descontada a inflação.

De 27 unidades da Federação, 14 comprometem suas receitas correntes líquidas com despesas com pessoal acima do limite permitido, de 60%. 

No caso dos municípios, diz Aroldi, a saída seria pactuar novamente o bolo tributário com os estados, já que hoje as cidades estão sobrecarregadas pela prestação de serviços cuja responsabilidade era dos estados. 

Como exemplo, Aroldi diz que as cidades têm repasses mensais de, em média, R$ 10 mil por equipe de saúde familiar, enquanto o custo médio do serviço chega a R$ 45 mil. 

Para Velloso, a lei que pune os municípios que deixam dívidas para o mandato seguinte não cogitou situações atípicas como de grandes recessões e precisa ser repensada

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