Enfim, controle dos incentivos
O Estado de S.Paulo
29 Novembro 2018 | 03h00
O Brasil queimou centenas de bilhões de reais desde a crise de 2008-2009 em inúteis benefícios fiscais e financeiros concedidos a grupos e setores selecionados pelo governo. Apesar desse volume gigantesco de incentivos, o País cresceu bem menos que vários vizinhos sul-americanos, entrou numa funda recessão e acumulou graves problemas nas finanças públicas. O resultado poderia ter sido bem melhor, ou, na pior hipótese, bem menos desastroso, se o governo tivesse monitorado a política de subsídios, avaliado custos e benefícios e cobrado resultados em troca das vantagens concedidas. O presidente Michel Temer acaba de instituir formalmente esse controle, por meio de um decreto publicado nesta quarta-feira, 28.
O enorme custo e o escasso retorno dos vários programas de incentivos já haviam sido apontados por autoridades e técnicos do Ministério da Fazenda e do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). O desperdício, tão danoso ao País quanto lucrativo para os setores e grupos favorecidos, já era bem visível no período petista. Mas só se tornou tema de exame crítico no governo depois da troca de guarda na Presidência da República, há pouco mais de dois anos.
A partir daí, os ministros da Fazenda e do Planejamento se empenharam em conter a sangria, tentando, por exemplo, reverter a desoneração da folha de pagamentos de dezenas de setores. Mas sempre encontrando forte resistência no Congresso. A eliminação ainda parcial desse benefício só ocorreu como parte da negociação da tabela do frete rodoviário, há poucos meses.
Os gastos com subsídios passaram de 3% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2003 para 6,7% em 2015, de acordo com dados do Ministério da Fazenda. Em 2016 a soma chegou a R$ 379 bilhões, valor correspondente a 6,4% do PIB. O total destinado a esses benefícios diminuiu no ano passado para R$ 354,7 bilhões, passando a 5,4% do PIB. Técnicos da Fazenda explicam esse recuo chamando a atenção para algumas mudanças políticas, como a reformulação do Fies, o Fundo de Financiamento Estudantil, e para a redução da taxa básica de juros. Com a baixa dos juros, diminuiu o custo do dinheiro levantado pelo Tesouro para custear os subsídios.
O desperdício multibilionário dos incentivos é facilmente visível quando se compara o desempenho econômico brasileiro com o dos países vizinhos. Em dez anos até 2017 o PIB do Brasil cresceu cerca de 13,4%. Além dos números negativos de 2009, 2015 e 2016, houve resultados muito modestos em 2012, 2014 e 2017. Nos mesmos dez anos o PIB da Colômbia aumentou pouco mais de 28% - mais que o dobro, portanto, do avanço conseguido na maior economia da região. Chile, Peru, Paraguai e Bolívia também exibiram maior dinamismo e fecharam o período com desajustes bem menores que os da economia brasileira.
Apesar do esforço dos ministros da Fazenda e do Planejamento, a política de incentivos mal planejados continua prejudicando as finanças da União, dificultando a arrumação das contas públicas e entravando - por sua custosa inutilidade - o crescimento econômico do País. Neste ano, até outubro, as desonerações tributárias custaram R$ 69,26 bilhões. No ano passado, no mesmo período, o custo foi pouco menor e chegou a R$ 67,98 bilhões.
Em 2018, só a desoneração da folha de pagamentos consumiu R$ 9,22 bilhões. Pode-se falar em perda, sem risco, porque esse tipo de benefício nunca elevou o emprego nem preveniu a enorme desocupação.
Tampouco se refletiu em maior poder de competição, como indica o desempenho geralmente modesto da indústria nos mercados globais. No caso do setor automobilístico, longamente beneficiado por incentivo à inovação, o desperdício é bem visível. As exportações do setor continuam concentradas na vizinhança, especialmente no Mercosul, com escassa disputa de espaço em outras áreas. Apesar disso, um novo programa, o Rota 2030, foi aprovado, contra a opinião da Fazenda. Resta muito trabalho, mas a criação do Comitê de Monitoramento e Avaliação dos Subsídios da União pode ser um bom ponto de partida para o novo governo.